Então que havia chegado a sexta à noite e eu estava feliz da vida. Cheia de trabalhos para colocar em ordem, algumas coisinhas legais em mente e uma pizza entre amigos marcada para o sábado à noite. Eu havia lecionado praticamente o dia todo e estava um prego, como se diz por aí. Sentindo um ligeiro desconforto, julguei se tratar do rotineiro "problema mensal" feminino. Tomei um analgésico e me deitei, certa de que tudo era passageiro. Pelo visto, era o motorista ou o cobrador!
O sábado veio e eu ainda estava com gosto de sexta-feira misturada com corrimão, na boca. Sequer tive forças para tomar café da manhã, coisa que não dispenso nem mesmo quando estou "mega" atrasada. Resolvi continuar jogada na cama, sem qualquer idéia melhor. A dor, que de início confundi com cólicas, ia do abdômen para as costas como se brincasse de pião. Eu mal conseguia me levantar. Alguma coisa estava errada, pensei.
A hora do almoço chegou e se foi sem que eu desse conta dela. Em se tratando de mim, devo dizer que isso foi um fator extremamente preocupante. Nunca dispenso refeições, não por vontade própria. Uma sensação de embrulho me circundava. Era como se eu estivesse com uma ressaca louca, mas tudo o que eu bebera no dia anterior fora um suco de laranja e uma cerveja preta. Foi aí que me lembrei de que comera uma porção de lula ao vinagrete. Será? Não podia ser, eu sempre comia no mesmo lugar, isso já há anos...
Como eu já tinha marcado uma pizza com alguns amigos, achei que iria melhorar e que não seria necessário desmarcar. Quando as pessoas chegaram, eu estava desconfortável em mim mesma, mas não estava tão mal. A pizza chegou e nos sentamos à mesa. Dos meus três habituais pedaços, só fui capaz de um e, ainda assim, meio forçada a tanto. Eu me sentia comendo era um prato de jibóias vivas. Ainda na mesa, comecei a sentir frio, muito frio, sendo incapaz até de prestar atenção na conversa que ia animada. Quando minhas pernas começaram a tremer e eu coloquei uma blusa de lã, entendi que a coisa estava feia.
Fui até o banheiro, até para lavar um pouco o rosto, quando uma onda medonha me atravessou a garganta e eu só fiz foi "chamar o Juca". Jesus, de onde vinha tudo aquilo? Em pânico, sem conseguir chamar por socorro, discretamente, fiquei ali até a coisa toda passar. Eu achei melhor não invadir a sala interpretando uma cena trash do filme "O Exorcista"... Contudo, mesmo com todo meu cuidado, meus convidados acabaram se mandando. Em poucos minutos já não tinha mais ninguém. Nem eu, quase.
Mas o pior ainda estava por vir. Eu já me convencera de que estava com uma virose e somente aguardava que meu intestino fizesse a parte dele. O problema todo é que isso não acontecia e eu passei uns três dias com minha barriga quase aprendendo a falar, de tanto barulho que fazia. Parecendo um balão, eu tive que andar por aí, ir trabalhar, vestindo somente roupas soltas, até porque quase nem era capaz de abotoar a calça. Eu não sabia o que era pior, a barriga inchada ou a certeza de que, a qualquer hora, eu perderia o controle da "situação"...
Quando o inevitável, por fim aconteceu, aconteceu por toda uma longa e dolorosa noite. Tudo o que sei é que, após tantas saídas, o que sobrou foi um par de pernas bambas e uma fraqueza sem fim. Quase uma semana depois, eu ainda não estou lá muito inteira e, com certeza, nem de longe pronta para outra. Perdi todos meus treinos da semana, atrasei um pouco mais o meu trabalho e quase que minha dignidade. Por certo, parte dela, desceu água abaixo...
Para sorte de vocês, isso não se transmite pela internet..
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA- Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo