Como nos anteriores, o nosso blogue, não será atualizado durante o mês de Agosto.
Reiniciará na primeira semana de Setembro.
Concedida a independência política ao Brasil, em 7 de setembro de 1822, urgia que se conquistasse também a independência intelectual. E assim, em 11 de agosto de 1827, foi assinada por Dom Pedro I e referendado pelo Visconde de São Leopoldo, a lei que instituiu os cursos jurídicos no Brasil, implantados, respectivamente, em São Paulo, num convento (o de São Francisco) e o de Olinda, no Mosteiro de São Bento, transferindo-se depois para Recife. E, hoje, esses dois cursos que foram, sem dúvida, o nascimento dos núcleos universitários brasileiros, completam cento e setenta e cinco anos de funcionamento, legando à Nação, durante todo esse tempo, homens de têmpera que participaram e fizeram a história da Pátria.
São muitos e importantes, os fatos que a aconteceram durante esse período. Segundo a historiadora e jornalista Thais de Carvalho, a implantação se deu depois de muitas discussões na Assembléia Constituinte, principalmente sobre aa localização, tendo o dispositivo legal colocado fim as controvérsias escolhendo São Paulo e Olinda para sedes das Academias de Direito.
Ressalte-se que a idéia da criação de um curso de ciência jurídica surgiu logo após a Proclamação da Independência do Brasil, quando José Feliciano Fernandes Pinheiro, o Visconde de São Leopoldo, propôs a criação de uma escola de Direito no país. O projeto ficou pendente até que o deputado Lúcio Soares Teixeira de Gouveia, de Minas Gerais, voltou a tocar no assunto em 1826. A proposta foi aceita, e na Assembléia, cada deputado queria trazer a escola para o seu Estado.
Essa Escola fora sugerida por Fernandes Pinheiro para ter sede em São Paulo, mas recorda o sociólogo Gilberto Leite de Barros, em sua obra "A Cidade e o Planalto", que deputados não paulistas contra-indicaram a escolha da cidade, alegando que a Capital paulista "não passava de mero entreposto comercial do Planalto, e se achava contaminada pelas características da vida roceira. Diziam que os paulistas falavam mal nossa língua e não se preocupavam com os assuntos culturais, dedicando-se ao plantio de cana ou café ou aos negócios, animais e fazendas".
Almeida e Albuquerque reivindicava a instalação da Faculdade de Direito no Rio de Janeiro, dizendo que a "A Ciência do Direito em nenhuma parte pode, já com mais facilidade do que aqui na corte, onde a concorrência de jurisconsultos habilita a abertura do curso desde já".
Assim foi que com cariocas, baianos e outros disputando a escola, só em 1827, quando era ministro do Império, o mesmo Fernandes Pinheiro é que se concretizou o idealismo desse paulista, que vencendo todos os obstáculos e a falta de visão do mundo, logrou a aprovação do projeto do dia 11 de agosto de 1927.
ARCADAS
No Largo de São Francisco, continuam as velhas arcadas da Faculdade de Direito. Nem mesmo o grande incêndio de 1880, que lhe destruiu parte do acervo histórico, fez com que o prédio agora pertencente à Universidade de São Paulo - perdesse sua primitiva fisionomia.
Surgida em época oportuna - o momento da urbanização de São Paulo e Rio - a fundação da escola ajudou a politização e a formação da burguesia com professores e alunos passando a conhecer obras importantes como "Os Elementos de Direito Natural" de Zeiler; "Lições de Direito Constitucional" de Ramon Salles; "Curso de Direito Natural", de um grande jurista da época, Henry Aherns.
De certa forma, pode se condensar o pensamento jurídica das primeiras gerações formadas na faculdade, como influenciadas pela filosofia de Kant, que o professor Miguel Reale, resume nos seguintes pontos:- 1. "A idéia da liberdade como um direito inato"; 2, "O entendimento da convivência social como uma limitação recíproca de liberdade". 3 - "O respeito à pessoa humana como base da Justiça e fim da ordem social" e 4 - "O direito como condição dos árbitros suscetível de legitimar o emprego da coação".
GRANDES NOMES
Ao todo, foram dez os presidentes do Brasil que passaram pelos bancos dessa faculdade, como Prudente de Moraes, Campos Sales, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Wenceslau Brás, Delfim Moreira, Artur Bernardes, Washington Luís, José Linhares e Jânio Quadros, além de Júlio Prestes, eleito e não empossado.
Foi pelas Arcadas que passaram também alguns nomes de expressão política, literária, romancista e poetas. São nomes de grandes juristas e parlamentares: Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, Francisco Belisário, Ferreira Viana, João Mendes (pai), João Mendes Jr., Couto Ferraz Gabriel dos Santos, Carneiro de Campos, Pimenta Bueno, Teixeira de Freitas, Carlos de Carvalho, Lafaiete Pereira e Pedro Lessa. Ou também grandes oradores, como José Bonifácio, César Bierembach e Ibraim Nobre. Grandes jornalistas como Ferreira de Menezes, Justiciano da Rocha, Pedro Taques de Almeida Alvim, Júlio de Mesquita, Rangel Pestana, Salvador de Mendonça e Quintino Bocaiuva.
Desde o início, a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco teve as atividades literárias associadas as do estudo e do trabalho. E, no século XIX, o romantismo teve nas Arcadas alguns de seus maiores expoentes como José de Alencar , Álvares de Azevedo, Bernardo Guimarães, Paulo Eiró, Fagundes Varela e Castro Alves. Ultrapassada a fase romântica, estudaram também na faculdade grandes escritores, romancistas do realismo e do naturalismo, como Raul Pompéia, Júlio Ribeiro. Inglês de Souza; poetas parnasianos, como Olavo Bilac e Raimundo Correia; simbolistas como Alphonsyus de Guimarães: pré-modernistas e modernistas como Monteiro Lobato, Antonio de Alcântara Machado e Oswald de Andrade.
A Faculdade de Direito do Largo de São Francisco sempre teve como característica, a luta pela liberdade e pela justiça social, apoiando todos os movimentos neste sentido, sendo que muitos saídos dela mesmo ou se não, levados a frente com a coragem e o ideal de seus alunos como o da abolição da escravatura e o do monopólio do petróleo.
No século XIX, as campanhas liberais em que se encontravam as lutas abolicionistas, lideradas por José Bonifácio, lente (professor) da Academia, ou por Joaquim Nabuco, eram enfatizados pelas peças teatrais de Paulo Eiró, escritas em 1853. Foram abolicionistas, também Raul Pompéia, Olavo Bilac e outros.
Em 1932, é do Largo de São Francisco que saem os estudantes em direção à Praça da República, para uma manifestação pública contra o regime, na qual caem mortos quatro paulistas, dando início ao Movimento Constitucionalista - MMDC. A faculdade se transformou num verdadeiro quartel, de onde saiam inflamados, oradores e soldados constitucionalistas, cuja memória é reverenciada até hoje.
Os anos 60 foram marcados por greves e passeatas que novamente agitaram o Largo de São Francisco. E aconteceu, em 1966, outro lance marcante, quando os estudantes roubam a estátua "O Idílio", esculpida em 1920 em homenagem a Olavo Bilac, representando o invasor holandês beijando uma índia, completamente nua. Parte da opinião pública considerava imoral e por isso era difícil encontrar um local para ela. Até que o prefeito Faria Lima a colocou na entrada do túnel Nove de Julho.
Em 1973, novamente, os estudantes repetem ousada ação. Autoridades colocam na USP, a pedra fundamental para a construção do novo prédio da Faculdade de Direito. Inconformados, pois não pretendem deixar as Arcadas históricas, os acadêmicos executam empreitada roubando a pedra e deixando em, seu lugar, um cartaz com os dizeres. "Quantas pedras forem lançados, tantas roubaremos".
Continua influindo nas grandes decisões de São Paulo, tomando sempre a vanguarda para a defesa da constitucionalização - o facho da liberdade dos direitos humanos. No ano de 1977, durante as comemorações do Sesquicentenário da Instituição dos Cursos Jurídicos no Brasil, foi lido um manifesto solicitando o retorno do Brasil ao pleno estado de Direito. A respeito na ocasião, falou o saudoso professor Goffredo da Silva Telles: - "Curioso é que na Faculdade, o ideal do Direito e Justiça sempre preponderou sobre o direito existente. Houve sempre o respeito pela pessoa humana como sempre foi mais importantes e legitimidade do que a legalidade. O inconformismo com as situações existentes permanece".
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário. É presidente da Academia Jundiaiense de Letras (martinelliadv@hotmail.com)
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