Na presente fase de pessimismo e de visão catastrófica do futuro, é interessante ler livros como “Sociedade com Custo Marginal Zero”, de Jeremy Rifkin, publicado pela editora M.Books. Ele é um professor da Universidade da Pensilvânia, onde ensina executivos a tornarem suas empresas sustentáveis, projeto da Escola de Negócios Wharton. Observa que o dinamismo e a eficiência produtiva, alvo de todos os empresários, tangidos pela onda empreendedorista, além da rápida mutação tecnológica, farão com que o capitalismo perca sua dominância e ceda espaço para uma economia solidária, colaborativa e compartilhada.
O avanço da ciência e da tecnologia acelera o ritmo de produção e faz com que o custo marginal, o preço para produzir uma unidade a mais de um determinado produto, chegue bem próximo a zero. Amplia-se o acesso a todos os bens de consumo. Por consequência, os lucros das corporações se reduzem, a ideia de propriedade abandona o seu caráter absoluto – o que já ocorre com a implementação da ideia de “função social” – e a economia da escassez é substituída pela abundância.
Na visão idílica de Jeremy Rifkin, o ser humano passará, naturalmente, a compartilhar seus bens, a desfrutar de produtos e de serviços independentemente da necessidade de comprá-los.
Hoje a concepção capitalista prestigia o interesse próprio, é motivada pelo ganho material, pelo egoísmo e pelo exacerbado individualismo narcisista. Passar-se-á a vivenciar uma era de fruição de bens comuns sociais, motivados por interesses colaborativos e impulsionados por um profundo desejo de se conectar com os outros, de dialogar e de compartilhar.
Para o autor, sinais dessa mutação tornam-se perceptíveis quando a volúpia do automóvel, ícone do consumismo e símbolo da propriedade privada, perde força perante uma geração que já não se entusiasma com a posse exclusiva do automotor. Além do compartilhamento, animam-se os jovens com a ideia de fruir de carros autônomos, aqueles que não precisam de condutor. Eles atendem a uma outra tendência contemporânea, ao menos perante os mais sensíveis: a tutela responsável do ambiente.
Assim também, casas, roupas, objetos, poderão ser compartilhados, na visão consciente de que “do mundo nada se leva’ e que a sabença popular eternizou no dístico “caixão de defunto não tem gaveta”.
A facilidade de acesso a bens da vida que serão cada vez mais baratos e mais disponíveis tornará os jovens libertos das amarras materiais. Em lugar da acumulação de bens, do enriquecimento pessoal, o mais cobiçado será o prazer de cultivar interesses colaborativos. Em lugar de “ter”, tornar concreto o sonho de uma qualidade de vida sustentável.
Tudo isso afetará, é natural, o mercado de trabalho. O mundo já está diferente e ficará ainda melhor. Os desafios são imensos. Basta dizer que mais da metade das profissões ainda indicadas como o futuro das crianças de hoje deixará de existir dentro de duas décadas. A educação tem o compromisso aparentemente utópico de formar profissionais para misteres que sequer têm denominação.
Mas a internet das coisas, que propicia a conectividade entre objetos e pessoas, facilitando as tarefas e rotinas, o big data e o infinito acervo de dados e suas potencialidades, os algoritmos, a inteligência artificial, cada vez mais surpreendente, a robótica, a cibernética, vão eliminar postos de trabalho, mas vão permitir o desenvolvimento da sensibilidade. Tempo e espaço para as artes, para a poesia, para o cultivo da natureza, para oferecer talento para a beleza.
A impressora 3 D converterá o hoje consumidor em “prosumidor”. Ou seja, será ao mesmo tempo um produtor e um consumidor. Fará aquilo que desejar, desde uma caneta a um móvel, uma obra de arte e um chocolate, uma prótese e uma colher.
Há, portanto, quem acredite que Rousseau tinha razão e que a índole humana é direcionada à bondade. Que estejam certos e que Hobbes tenha se equivocado ao edificar o seu “Leviatã”.
Fonte: "Correio Popular de Campinas", Data: 24/03/2017
JOSÉ RENATO NALINI é secretário da Educação do Estado de São Paulo. E-mail: imprensanalini@gmail.com.
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