Hoje, exatamente hoje, 26 de novembro de 2015, meu pai – Baptista Nalini – completaria seu centenário. Faltou muito para chegar a essa idade. Morreu aos 76 anos, pouco tempo depois de enterrar seu caçula, meu irmão João René. Discreto, contido, tímido até, guardou a dor para ele. Todas as tardes ia ao cemitério e permanecia longos minutos a conversar com o filho mais expansivo, mais alegre, mais generoso.
Ainda me lembro, com exatidão, do dia em que morreu. Falei com ele pela manhã. Eu em São Paulo, ele em Jundiaí. Eu estava pronto para ir à fazenda, em Lagoinha, no Vale do Paraíba. Convidei-o. Ele me disse que no outro fim de semana iria. Parti com as crianças e, inexplicavelmente, fiz uma viagem atípica. Parei para almoçar. Depois permaneci horas no Viveiro de Taubaté, comprando mudas.
Ao chegar à fazenda, notei o clima soturno. O caseiro me disse que minha mãe estava telefonando sem parar. Ainda não havia celular. Liguei imediatamente e ela me disse: – Filho! Só agora? Seu pai morreu! Meus filhos e eu nos abraçamos, começamos a chorar e rezamos um Pai Nosso. Voltamos imediatamente. Mesmo assim, só cheguei ao velório à noite. Quase 12 horas depois do falecimento.
Após o sepultamento, fui para a casa de minha mãe. Choramos juntos. Dormi no seu colo. E comecei a administrar a dor da perda. A sentir a falta de um pai que só descobri muito tarde. Tarde demais para retribuir tudo aquilo que ele me legou. Continuo em falta para com ele. Era minha intenção escrever uma biografia, mais uma iconografia dele. Adorava fotos. Moço, viajou muito, namorou mais ainda. Jogou futebol. Fez amizades. Fez teatro. Levou a sério a religião.
Depois, trabalhou incessantemente. Não foi feliz em seus empreendimentos, mas não desistiu. Conseguiu criar os quatro filhos, deu a eles educação superior. E conservou-se generoso, solidário, modesto, aliado, sempre discreto. Minhas atribulações este ano me impediram desse projeto do qual ainda não desisti.
Tenho a obrigação de legar aos descendentes um retrato, incompleto que seja, de um homem simples e bom. Exatamente aquilo de que hoje necessitamos, nesta República a naufragar por falta de algo que nele sobrava: vergonha na cara.
JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br.
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