Clarice Lispector escreveu: “As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas. Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos”.
Enquanto aguardava a vez para me confessar, observava uma moça que caminhava, dentro da Igreja, com o filho de quatro anos ou um pouco menos. Passava pelos vitrais azuis da Igreja São João Batista e deixava, juntamente, com o pequeno, invadir-se pela luminosidade. Para alguns, apenas a luz do sol que atravessava os vidros com símbolos. Pela expressão dela, o reconhecimento de que a claridade sempre dá sentido novo ao coração e poderá, desde a tenra idade, orientar os passos da criança.
Meus olhos se voltavam para ela e para minha consciência. Não diminuir nada que possa subtrair a graça de Deus. Ser fiel nas surpresas que a vida reserva. Não bendizer ao Altíssimo, pelos dons que Ele me deu, é vanglória. O amor é que distingue os filhos de Deus dos filhos do mal. Discípulos de Cristo não poupam a própria vida. A justiça de Deus começa no coração de quem não cultiva rancor. Em relação aos que Lhe prepararam a cruz, Jesus exclamou: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem que fazem” e derramou sobre eles graça e salvação. Prudência sobrenatural é discernir a vontade de Deus e renunciar a qualquer tipo de prazer em que Deus não esteja presente. A cruz, em que Jesus Cristo venceu a morte, é o patíbulo e o troféu de Deus. Se permitir que Deus frutifique os dons de Sua graça em mim, o Espírito soprará como o vento que faz navegar o barco à vela que busca mares fecundos.
A moça apontava para o filho cada um dos vitrais azuis da Igreja. Oferecia-lhe o azul do céu. Defronte ao altar mor, elevou-o no colo, sussurrou algo e o menino, com inclinação serena, beijou o Sacrário.
A mãe o conduziu até o Cálice da Vida, o Cálice com Vida, de onde transborda o Alimento da Eternidade. Preocupação com o essencial para o menino.
Era eu a próxima a confessar. Na contemplação do momento, veio-me o capítulo 37 do Livro de Ezequiel, a respeito dos ossos ressequidos: “A mão do Senhor estava sobre mim, e o Senhor me levou em espírito para fora e me deixou no meio de uma planície repleta de ossos. (...) E Ele me disse: ‘Profetiza sobre estes ossos e dize-lhes: Ossos ressequidos, ouvi a palavra do Senhor! Assim diz o Senhor Deus a estes ossos: Vou infundir-vos, eu mesmo, um espírito para que revivais. (...) Então sabereis que eu sou o Senhor’. (...) Farei com eles uma aliança de paz; será uma aliança eterna com eles. Eu os estabelecerei e multiplicarei, e no meio deles porei meu santuário para sempre. Minha morada estará junto deles. Eu serei o seu Deus e eles serão o Meu povo. Assim as nações saberão que Eu, o Senhor, santifico Israel, por estar Meu santuário no meio deles para sempre”. Dobrei os meus ossos para o Sacramento da Penitência e o Senhor, o Bom Pastor, na claridade azulada, que continha também o menino com sua mãe a lhe apontar sinais maiores, ofereceu-me a santidade de Seu Espírito e me pôs nos ombros.
Maria Cristina Castilho de Andrade
Educadora, coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher e cronista
OS MEUS LINKS