PAZ - Blogue luso-brasileiro
Segunda-feira, 27 de Setembro de 2010
RENATA IACOVINO - OUTROS TEMPOS

                       

 

 

            “Estou vendendo um realejo/Quem vai levar/Quem vai levar/Quem comprar leva consigo/Todo encanto que ele traz/Leva o mar, a amada, o amigo/O ouro, a prata, a praça, a paz/E de quebra leva o harpejo/De sua valsa se agradar/Estou vendendo um realejo/Quem vai levar/Quem vai levar...”.

            A singeleza destes versos retrata um tempo – não muito distante – que não volta mais. Há tempo que volte? Vejo-o passar, seguindo seu rumo. Como dizia um outro poeta, “o tempo não para”.

            Os versos de “Realejo”, canção de 1967, de Chico Buarque, nos retratam com simplicidade a perda de valores, que vão se tornando quanto mais dispensáveis, mais necessários. A ingenuidade não é motivo para vergonha, mas para se obter mais afetividade e sentimento humano. Dito assim, parece pleonasmo. Seria... no entanto, o que vemos hoje é uma humanidade que caminha para a ausência de sentimentos, então, para a ausência de si mesma, de sua essência precípua.

            O humanismo foi um movimento intelectual que fomentou, no Renascimento, a valorização do saber crítico, saber este do qual estamos nos distanciando.

            Quem vai querer comprar um realejo em tempos de aquisições fúteis, de felicidades fabricadas, de desejos autômatos e de ausência de palavras?

            O encantamento é substituído pela fugacidade, a partilha pelo individualismo, e seguimos como quem obedece a uma cartilha que prega a inversão de valores.

            Há outros versos de resistência compostos por Chico na mesma fase, que já mostrava uma recusa ao mundo industrializado, contaminado pelo consumismo e pela massificação.

            “O homem da rua/Fica só por teimosia/Não encontra companhia/Mas pra casa não vai não/Em casa a roda/Já mudou, que a moda muda/A roda é triste, a roda é muda/Em volta lá da televisão/No céu a lua/Surge grande e muito prosa/Dá uma volta graciosa/Pra chamar as atenções/O homem da rua/Que da lua está distante/Por ser nego bem falante/Fala só com seus botões”.

            Mesmo que o tempo não regresse, a poesia de Caetano sopra: “Ainda assim acredito/Ser possível reunirmo-nos/Tempo, Tempo, Tempo, Tempo/Num outro nível de vínculo/Tempo, Tempo, Tempo, Tempo”. 

 

Renata Iacovino, escritora e cantora / reiacovino.blog.uol.com.br /
reval.nafoto.net / reiacovino@uol.com.br



publicado por Luso-brasileiro às 19:21
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