Acho que já escrevi sobre quase tudo nesses dez anos de crônicas semanais. Escrevi sobre a chuva, sobre o sol, sobre meus cachorros, meus peixes, meus pássaros, sobre minha sobrinha, meus avós, meus pais, sobre flores, sobre amores, sobre dores, sobre medos, compulsões, sobre política, sobre enganos, sobre internet, sobre carros, sobre cidades, sobre meus professores, meus alunos, sobre ambulantes, políticos, taxistas e sobre qualquer coisa que conseguisse preencher minhas linhas...
Muitas vezes me questiono, preocupada por escrever constantemente sobre coisas que tangenciam minha vida, que fazem parte do meu cotidiano. Um dia, por certo, imagino, as pessoas irão me perguntar por que razão minhas colunas, meus espaços em blogs, sites ou jornais não se chamam “Meu Diário”. Ainda assim, uma vez terei que escrever sobre um acontecimento familiar, sobre um momento que tocou demais as minhas emoções. Prometo, solenemente, que vou buscar escrever mais sobre os outros e menos sobre mim, mas hoje, seja como for, eu seria incapaz de buscar inspiração em qualquer outra coisa.
Nesse último fim de semana, assim, minha irmã caçula, Tricya, casou-se. Nem sei descrever a emoção que me invadiu quando, lá do altar, na condição de madrinha, eu a vi entrar, de braços dados, com meu pai e minha mãe. Imediatamente, eu fiz uma viagem ao passado. De uma noiva linda, resplandecendo em um vestido branco, eu a vi transformada na menininha de um ano e meio que não saía do meu colo enquanto nossa mãe não chegasse do trabalho, para minutos depois ser a criança que, querendo participar das brincadeiras das irmãs mais velhas, ficava muito brava ao ser chamada de “café com leite”.
Quando ela tinha oito anos, era comum meu pai olhar para ela e dizer: “_Ah, meus oito aninhos!” Naquela frase, todos sabíamos que o desejo era de que ela nunca crescesse, que fosse eternamente a criança da casa. Confesso que tinha dificuldade de entender aquilo, pois crescíamos, independentemente de nossa vontade e parecia crueldade desejar que não acontecesse. Hoje compreendo que não se trata disso, mas do desejo que se tem de que o ser amado continue pequenino, protegido das dores e tristezas que a vida adulta contempla.
Assistimos os oito aninhos dela irem embora na mesma velocidade que os anos de todos nós foram se acrescendo. Com o tempo veio a adolescência, a juventude e a maturidade. Vi minha irmã chorar, rir, desejar, sofrer, sonhar e, muitas vezes, desacreditar. Particularmente, sempre a admirei pela inteligência, pela perspicácia, pela seriedade profissional, pela mulher elegante que se tornou, mas durante um bom tempo, ficou difícil fazê-la acreditar nessas mesmas coisas.
Pisquei os olhos e novamente estava no altar. Ela vinha, braços dados com meus pais. Radiantes, eles eram só sorrisos e orgulho. Na igreja delicada e discretamente decorada, o som de um teclado sutil dava a trilha sonora. Aguçando os ouvidos, porém, o que mais se ouvia era o som das lágrimas daqueles que amam o casal de noivos. Olho ao redor e vejo amigas de infância dela, mulheres que conheci meninas, com os olhos turvos d’água. Sinto a umidade que me invade os olhos e engulo firme: não vou chorar. Tantas vezes quis que as lágrimas dela secassem e hoje não quero emoções assim. Deixo-me escutar a música e contemplar as pessoas. É uma noite de alegrias, de festa.
CASÓRIOO padre, depois de um sermão inspiradíssimo, próximo ao coração, faz com que eu tenha saudades da igreja que acolhe, que ampara os corações. Sinto-me leve, como quem assiste, enfim, a um final feliz. Só que não é um final. É um começo...
Algo me diz que, algumas vezes, os sonhos se realizam. Tri, irmã amada, ainda bem que você cresceu...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA- Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo
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