O anúncio feito pelas autoridades competentes de que a ferrovia ligando a zona produtora do Oeste da Bahia com o porto de Ilhéus está saindo do papel encheu de euforia, tanto o setor do agronegócio como a comunidade como um todo. E, embora permaneçam algumas dúvidas quanto ao prazo para sua conclusão, existem grandes razões para isso. Mas tudo bem. Antes tarde do que nunca.
De uns tempos para cá parece que as autoridades brasileiras, em termos de logística de transportes, estão a despertar de uma letargia secular. Aconteceu que, enquanto todos os países continentais, como o nosso, a primeira coisa que os governantes ao colonizá-los fizeram foi investir
A história registra vários exemplos de países nas Américas que fizeram a coisa certa. Estados Unidos, logo após a independência – ainda no Século XIX – rasgava seu território de Leste a Oeste com uma ferrovia, unindo o Atlântico ao Pacífico, guerreando com os Índios, atravessando milhares de quilômetros de trilhos em territórios ainda completamente despovoados de homem branco.
No Canadá, ainda sob o domínio do Império Britânico, se construiu a CPR – Canadian Pacific Railway - com mais de cinco mil quilômetros, atravessando Tundras estéreis e as Montanhas Rochosas para unir seu vasto território com uma espinha dorsal de aço.
Tivesse o Brasil feito em 1890 o que está a fazer hoje, ligando o porto de Ilhéus, no Leste, com um ponto qualquer no Oeste, por certo teríamos sido desde aquele então uma potência mundial em termos de produção agrícola. No mínimo.
Tivesse o Brasil, ainda no Século XX, deixado de dar tanta ênfase ao transporte rodoviário em detrimento do ferroviário, como o fez, a produção agrícola não teria que conviver com o os pesados ônus do custo Brasil, representado principalmente pelos altos preços dos transportes dentro de seu próprio território. Nem teria de conviver, nas poucas rodovias que existiriam, com um trânsito caótico e assassino provocados pela profusão desenfreada de caminhões, ônibus, carretas – e agora os bitrens – poluindo o ar e gastando milhões em pneus pelo país afora.
Por isso, nós que convivemos, e produzimos, neste Território do Além São Francisco e futuro Estado do Rio São Francisco, nos regozijamos com o anúncio da Ferrovia 334. Principalmente por que nossa região serve de exemplo de como este Brasil se desenvolveu e chegou ao estagio atual de grande produtor de alimentos: a garra, o denodo e a determinação da iniciativa privada. E só agora o oficialismo desperta da letargia e aparece. Antes tarde do que nunca.
O Sonho, sendo aquela melodia,
pode ser tão antiga e não cansa.
Chega, estimula e finaliza o dia,
completa-o de Paz, Amor e Esperança.
Ao Sonho, avesso a tanto progresso,
peço para entrar com o meu verso.
Inadmissível é nele não ingressar...
Lá vai o Sonho, além deste mundo!
O sonho, murmurando ao tempo,
aos lábios sela um beijo ao vento!
Quedo-me ao compasso neste espaço!
Melancólico é saber que os sonhos
acabam de passar, lembrando-nos
que não mais vão voltar... Oh! sonhos!...
Balneário Camboriú
Janeiro, 21, 2008
EFIGÊNIA COUTINHO - Presidente- Fundadora da AVSPE
Naquele ano de 1676 residia no Mosteiro de Santo Agostinho da Serra, em Vila Nova de Gaia, frade crúzio, que todo o santo dia permanecia em contemplação.
Bem lhe recomendava o bom Prior, Dom Jerónimo, que fosse até à cerca, recrear-se, pois sua saúde dava-lhe extremoso cuidado, mas era o mesmo que nada.
O devoto monge fazia forte esquivança, e só a peso de rogos, anuía privar com os da Religião; de tal jeito, que mais parecia emparedada de S. Nicolau, do que bom cónego regrante do Bispo Hiponense.
Acertou de vir o célebre imaginário vimaranense, Domingos da Costa, armar o retábulo da igreja, que fora traça de Filipe Tércio, e por bem, coube ao nosso piedoso frade o honroso oficio de levar o mantimento quotidiano ao obreiro. Viu-se então, por obediência, constrangido a cumprir outra tarefa das que, por ordinário, lhe serviam de regalo, que eram: jejuns, orações e pesadas doses de disciplina.
.
Estava o fiel cenobita no acostumado passeio matinal, a que se tinha obrigado por respeito, quando topa, em festiva e alegre chilreada, amorosos pardalitos, que folgando, fabricavam aconchegante ninho. Enxergou com mágoa, o humílimo discípulo de Santo Agostinho, que por candura, os passarinhos, com incansável lavor, construíam seu agasalho, em desguardado sítio, à mercê de arremetidos felinos.
Condoído da ingenuidade, o monge avizinhou-se, e com suaviloquência, endereçou brandas e sentidas palavras, a jeito do que fizera na Península Adriática, o venerável Francisco, às rolas da Porciúncula.
Os pardalitos fizeram rija pertinácia, cegos de bondade e angélica inocência, e o bom crúzio, movido de afectuosa e pungente piedade, não buscou outro remédio, senão arrasar, por próprias mãos, aquilo que tanta canseira custara às humildes criaturas de Deus.
Na manhã seguinte, indo examinar os preparos do altar, lobriga novo ninho, no mesmíssimo local, mas mais sólido, mais firme e de rija construção, urdido de amor e perseverança.
Moveram-se de novo as lágrimas de ingente pesar, e muito agastado, o santo monge não encontrou coragem para derrubar o obra que os descuidados passaritos fabricaram com engenho e carinho, e cravando os olhos no amplo e sereno lago azul do céu, deprecou, ao divino Pai, pelo bom fado das pobres avezinhas.
Sobretarde ainda os foi visitar; encontrou-os aconchegados na quietude, na doce paz de quem se recolhera na graça do Senhor.
Antemanhã, quando o bom frade transportava o sustento ao imaginário, deparou com ingente angústia, o desolador espectáculo de dois mártires passarinhos, traçados e decepados por finas navalhas felinas.
Havia acontecido, no remanso da noite, a funesta tragédia que tanto receara.
Posto em oração, Deus revelou-lhe o sentido da repugnante cena:
Por vezes Ele parece açoitar os de bom coração, destruindo-lhes as iniciativas. Mas, é mal que não passa de bem: se o frade não tivesse piedade e fosse “cruel”, como muitas vezes parece ser o Senhor, os pardalinhos teriam sido salvos e viveriam dias felizes.
É notório o espanto que certos termos do recente Programa Nacional dos Direitos Humanos publicado pelo Governo Lula tem causado à população brasileira. Com certos aspectos positivos, vários pontos são mesmo assustadores e inesperados.
Como compreender que uma pretensa intenção de defender direitos humanos inclua a aprovação de leis abortistas? Onde está defendido o direito da criança que ainda se encontra no seio materno, de nascer, de viver e ter seus demais direitos reconhecidos? Como pode alguém condenar métodos agressivos do tempo do Governo militar e propor a prática de tortura ao agredir os corpos das criancinhas no ato abortivo, em determinados métodos, quando são literalmente dilaceradas até sem anestesia, ou simplesmente eliminadas com outros métodos como se o ser humano pudesse ser descartado como lixo?
Como podem os autores deste problemático Programa semear novamente o clima de terror no País, depois de, anteriormente, ter sido feita lei de anistia? E porque esquecer as atrocidades também praticadas por pessoas da esquerda, com seqüestros, assaltos, mortes em vista de um sistema político que julgavam melhor e desejavam impor ao País? Os fins não podem justificar os meios. Quanto a sistemas políticos alternativos, é bom que se reveja o efeito ineficaz na Rússia, na Polônia, na Albânia, na Alemanha Oriental e em outros países onde o comunismo esteve presente por décadas e os resultados não foram os prometidos e onde direitos humanos também não foram respeitados.
Como pode alguém afirmar a defesa da família e provocar situações que ferem ao real conceito familiar, criando casamentos de pessoas do mesmo sexo, como se tudo fosse igual?
Como pode alguém tentar controlar exageradamente a imprensa, retirando do cidadão o direito de protestar contra medidas que agridam aos seus direitos?
Como pode este Programa, em nome de uma pseudo laicidade, proibir símbolos religiosos em repartições públicas uma vez que elas existem para servir não propriamente ao Governo, mas ao povo e este, em sua grande maioria, é constituído de pessoas que creem? Incomodar-se com símbolos religiosos é próprio de quem não crê e deseja gerir um povo que crê como se fosse obrigado a ser ateu ou a agir como ateu. O Governo laico é justo quando ele defende o direito dos cidadãos de expressar livremente sua fé, mas é totalmente injusto quando agride a consciência religiosa do seu povo e desconhece a realidade histórica de sua gente, permeada de profundo senso religioso. A seguir da forma que o Programa propõe, daqui a pouco será proibido erguer em praças públicas uma cruz, uma estátua de algum líder religioso, ou construir monumentos à Bíblia, ou edificar templos com características arquitetônicas próprias. Isto são sinais da ideologia ateísta e preconceituosa contrária ao direito dos cidadãos de crer em Deus e de expressar livremente sua religião.
É cruel ver que tudo isto vem embutido em pacote sobre o qual se escreve “Direitos Humanos” quando é justamente o seu contrário.
As medidas publicadas nas vésperas do Natal, dia sagrado para a grande maioria do povo brasileiro, não deixam de assustar a nós Bispos que ouvimos o Presidente da República afirmar de público, na Assembléia da CNBB de 2002, que jamais admitiria em seu governo qualquer medida que agredisse a fé cristã do povo brasileiro e ainda que, se o governo não conseguir salvar os valores da família, nada adiantariam outras reformas sociais e citou, emocionado, o exemplo e a religiosidade genuína de sua digna e saudosa mãe. Como entender isto?
Internamente na Igreja, a ocasião nos oferece oportunidade para refletir sobre a nosso agir eclesial, dentro do regime democrático. É preciso não permitir que nos enganemos com certas interpretações já ultrapassadas, como, por exemplo, tentar comparar marxismo com cristianismo. Entre as duas teorias que parecem sugerir semelhanças, há uma diferença determinante: enquanto Marx diz o que é teu é meu, Cristo prega: O que é meu é teu. Quanto a isto, é salutar conferir as sábias palavras do Santo Padre Bento XVI aos Bispos do Rio Grande do Sul, na recente Visita ad Limina, quando esclareceu mais uma vez os perigos de certas eclesiologias: Neste sentido, amados Irmãos, vale a pena lembrar que, em agosto passado, completou 25 anos a Instrução Libertatis Nuntius da Congregação da Doutrina da fé, sobre alguns aspectos da teologia da libertação, nela sublinhando o perigo que comportava a assunção acrítica, feita por alguns teólogos de teses e metodologias provenientes do marxismo. As suas seqüelas mais ou menos visíveis feitas de rebelião, divisão, dissenso, ofensa, anarquia fazem-se sentir ainda, criando nas vossas comunidades diocesanas grande sofrimento e grave perda de forças vivas....
Que o Governo Lula acorde a tempo e não permita que este chamado Programa Nacional de Direitos Humanos venha impor ao povo brasileiro a ditadura de ideologias preconceituosas, ateias, contrárias ao direito à vida, aos valores da família, ferindo gravemente a democracia e a ética.
O Brasil não precisa copiar modelos políticos totalitaristas e nem formas de capitalismo selvagem, mas poderá ensinar ao mundo que uma nova forma democrática é possível, onde prevaleça o respeito, a ética e o diálogo social.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo de Juiz de Fora
A última mensagem de aniversário que recebi por e-mail veio da Eliza do César, que dizia assim:
“A Vida não é para ser passada, mas para ser celebrada. Cada fato, cada momento, cada segundo é uma vitória, é uma etapa. O importante não é chegar, mas é ir. Começar, persistir, cair, levantar, amar, perdoar, sentir, sofrer, viver é celebrar. Celebre este dia como se fosse o último de sua vida e como se fosse o primeiro do resto de sua vida! Celebre não porque os outros o reconhecem, porque você se sente importante ou porque gostaria de ser amado. Celebre porque você é único! Obra rara. Especial porque existe. Você é uma vitória da vida, da sua vida, importante para os que o cercam. Você nasceu para ser feliz, para brilhar, para se gastar como uma vela, iluminando a todos com sua luz. Feliz viver!”
Fico contente quando penso que há pessoas que torcem e rezam por mim. O amor que Jesus pregou e que deveríamos praticar como irmãos poderia ser rotina em nossas vidas, mas quase sempre fica em segundo plano. Contudo, a solidariedade em larga escala ainda existe. Leia isto:
Eliane Brum, repórter da ‘Revista Época’, escreveu que seis dias depois do terremoto no Haiti, Roger continuava diante das ruínas do prédio onde estava sua mulher Jeanette. Para todos, morta; para ele, viva. De repente, alguém ouviu um barulho. ‘Ela está viva!’, gritou Roger. Enterrada há quase uma semana, Jeanette respirava com dificuldade na escuridão. E ela mandou um recado para Roger: ‘Eu te amo muito. Nunca se esqueça disso’. Imediatamente o marido pegou um pedaço de ferro e começou a cavar.
Este pequeno drama entre dezenas de milhares explica que, diante do momento-limite, somos levados não aos grandes bens ou aos grandes planos, mas aos detalhes cotidianos que em geral passam despercebidos. O que nos falta é aquilo que nos preenche a cada dia sem darmos conta. Aquilo para o qual, em geral, não temos tempo.
Será que é preciso quase morrer para lembrar-se de viver? Até quando haverá uma segunda chance?
Depois de três horas, Jeanette foi arrancada dos escombros. Saiu de lá cantando uma música cuja letra dizia: ‘não tenha medo da morte’. De novo teve algo para nos ensinar. Ela sacudiu a poeira e partiu rumo ao cotidiano porque a vida tem de continuar por amor àquilo que mais importa. No caso de Jeanette, o seu amor por Roger. A haitiana provou que mais triste que a morte é uma vida desperdiçada com coisas fúteis, que não tem importância.
Mas, infelizmente, nem todos celebram a vida com espírito cristão. O escritor baiano João Ubaldo Ribeiro escreveu um texto intitulado: ‘Precisa-se de matéria prima para construir um país’. Alguns trechos descrevo abaixo:
“A crença geral anterior era que Collor não servia, bem como Itamar e Fernando Henrique. Agora dizemos que Lula não serve. E o que vier depois de Lula também não servirá para nada. Por isso estou começando a suspeitar que o problema está em nós, porque pertenço a um país onde a esperteza é a moeda que sempre é valorizada, tanto ou mais do que o dólar. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família, baseada em valores e respeito aos demais.
Pertenço a um país onde os diretores das empresas não valorizam o capital humano, onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos. Nossos congressistas trabalham dois dias por semana para aprovar projetos e leis que só servem para afundar o que não tem, encher o saco do que tem pouco e beneficiar só a alguns.
Pertenço a um país onde as carteiras de motorista e os certificados médicos podem ser comprados sem fazer nenhum exame. Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no ônibus enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar o lugar.
Esses defeitos, essa esperteza brasileira congênita, essa desonestidade em pequena escala, essa falta de qualidade humana, mais do que Collor, Itamar, Fernando Henrique ou Lula, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são brasileiros como nós, eleitos por nós!
Entristeço-me. Ainda que Lula renunciasse hoje mesmo, o próximo presidente terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que somos nós mesmos. E enquanto essa ‘outra coisa’ não comece a surgir, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados, igualmente sacaneados!
Nós temos que mudar. Um novo governante com os mesmos brasileiros não poderá fazer nada!
Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe que melhore seu comportamento e não se faça de surdo, de desentendido. Sim, decidi procurar o responsável e estou seguro que o encontrarei quando me olhar no espelho.
É o que sempre digo: o governo somos nós; os políticos, nem tanto assim.”
PAULO ROBERTO LABEGALINI- Escritor católico, Professor Doutor da Universidade Federal de Itajubá-MG. Pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária da UNIFEI
Ser veterinária era minha primeira opção de profissão para o futuro, desde que eu me recordo de me preocupar com isso. Entre ser cientista, astronauta e estudar as pirâmides, eu achei que ser “médica de bichos” era uma opção viável. Não que eu tivesse a menor idéia, aos cinco anos, do que precisava fazer para ser qualquer coisa diferente de ser eu mesma. Tudo o que me ocorria é que eu teria que crescer, mas nem isso eu tinha lá muita certeza de como seria.
O tempo passou e, como sói acontecer com grande parte das pessoas, as coisas mudaram de rumo e virei advogada, professora e aspirante à escritora. Gostar dos animais e da companhia deles, por outro lado, nunca foi algo que tivesse se afastado de mim. Como já escrevi várias vezes, inclusive nessa coluna, eu vivo cercada deles e, se não os possuo em maior número, isso se deve única e estritamente porque não tenho espaço para tal.
De um casal que ganhei, três filhotes de periquito deixaram o ninho. O primeiro deles, nascido no dia do Natal, nasceu, como os entendidos chamam, lutino, o que significa, trocando em miúdos, que ele era uma espécie de albino, só que amarelo. Com os olhos vermelhos, ele era de um amarelo que parecia cintilar. Demos a ele o nome de Lico. Assim que ele ficou empenado, não dei mais sossego ao bichinho. Vivia abrindo a caixinha que fazia as vezes de ninho, só para olhar para ele e mesmo pegá-lo.
Um dia eu o encontrei já fora do ninho. Resolvera enfrentar a vida lá fora, deixando para trás dois irmãos, Pico e Tico. Já comendo sozinho, ele era como uma miniatura de periquito. Quando eu me atrevia a colocar a mão na gaiola, ele se aproxima e até mesmo subia nela, agarrando-se em meus dedos. Inexplicavelmente, contudo, ele começou a ficar bravo, ameaçando com o bico aberto a qualquer um que se aventurasse.
Em pouco tempo os irmãos tomaram o mesmo rumo e eles eram três a fazer companhia aos pais e a fugir das minhas mãos loucas. Minha idéia era deixá-los mansos, mas eu podia ver que o Lico não coadunava com minha intenção ou complexo de Bareta (essa só os mais velhos irão entender, mas...)
Em uma manhã de sábado, encontrei o Lico arfando, como se estivesse sem ar. Tentei pegá-lo e ele me fez lembrar um bêbado, tombando para o lado, buscando um equilíbrio que já não tinha. Fiz umas ligações e descobri que havia, perto de casa, uma clínica especializada em atendimento de aves. Eu já estava bem chateada porque um de meus peixes ornamentais havia morrido. Desde a noite anterior eu o descobri nadando de ponta cabeça e imaginei que algo estava errado, o que se confirmou nas primeiras horas do dia seguinte.
Já no veterinário, descobrimos que o Lico estava com uma infecção pulmonar. O doutor não soube explicar de onde ou como o coitado chegara àquele ponto, mas iria iniciar o tratamento colocando o periquito no oxigênio, para em seguida ministrar-lhe antibióticos e comida. Sem mais o que fazer, deixamos Lico internado, sem muita esperança de encontrá-lo vivo quando voltássemos.
Para nossa surpresa, contudo, ele apresentou uma melhora e, assim, somente o levaríamos para casa no fim do outro dia, para que ele pudesse se reestabelecer. No domingo, quase à noite, voltamos à clínica e, enquanto esperávamos, surgiram dois homens, esbaforidos, informando que tinham uma urgência. Um deles fazia respiração boca-a-boca em um enorme iguana. Inconformado, o dono dizia que o animal estivera bem até poucas horas atrás. Tivemos que aguardar até que o doutor pudesse prestar os primeiros socorros ao réptil e eu me lembrei das razões pelas quais, há décadas, eu pensei em me tornar veterinária. Vimos o iguana receber injeções de adrenalina direto no coração, descobrimos que ele tinha 13 anos de idade e que era um macho. Assistimos a todas as possíveis tentativas de reanimação, até que o bicho esboçou uma reação.
Voltamos nossa atenção ao Lico, que realmente parecia bem melhor. Ao lado dele, na enfermaria, digamos assim, estava um papagaio fazendo inalação e um cachorrinho tomando soro. Na sala de atendimentos, uma cadelinha tinha crises de vômito. Pegamos o Lico e o trouxemos para casa. Preparamos a inalação que fora prescrita, colocamos comida e o deixamos em um lugar quentinho. Novamente ele já tentava nos bicar, o que nos deu esperanças de uma cura. Passei a noite toda pensando nele, no meu peixe de ponta cabeças, no iguana com parada cardíaca e em como seria minha vida se eu fosse veterinária.
Assim que acordei, na segunda, fui ver como ele estava e, para minha tristeza, encontrei-o caído em um canto da gaiola, morto. Enterrei o corpinho de penas ainda muito amarelas e imaginei que enfim ele voava por aí. Dias depois retornei à clínica para devolver um remédio que o Lico não mais usaria e descobri que o iguana também não resistira. Fosse como fosse, fizemos o que foi possível. Ainda desolada, pensei que não me tornei veterinária por uma razão que havia me esquecido: eu não saberia, como de fato não sei, conviver com a dor dos donos que, impotentes, assistem seus amigos partirem...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo
Devo aguentar esta pinoia
pra não parecer debiloide?
E mesmo que sinta enjoo
não entrarei em paranoia?
Pra não bancar o anti-histórico
entrarei em autoescola
farei autoapendizagem.
Ideia que muito me amola.
E num esforço sobre-humano
traçarei uma semirreta.
E com força de um vice-rei
um anti-ibérico então serei
Tranquilo, bilíngue e... poeta?
Vinicius Azzolin Lena
Barreiras-BA, 09-01-2009
Jornalista - Editor do jornal Nova Fronteira de Barreiras BA. Membro efetivo da Academia Barreirense de Letras. Livros publicados: "Traçando Barreiras" Histórica (). No prelo: "Pequenas Histórias" - Contos, e "Reflexos" (Poesias)
O compositor Caetano Veloso é mestre em lidar com as palavras. Tem intimidade suficiente com nossa complexa Língua Portuguesa, o que se nota em inúmeras canções, como Sampa, Língua, Outras Palavras, Qualquer Coisa, Tropicália e tantas outras, verdadeiras obras-primas do cancioneiro nacional. Músicas que nos abrem verdadeiros tratados e nos colocam em contato com a riqueza de significados, críticas e reflexões sempre tão bem propostos pelo autor.
A inquietação de Caetano e a maneira como aborda os temas que escolhe, nunca encontrou par na Música Popular Brasileira.
Uma música em especial nos chama atenção logo ao primeiro contato. Trata-se de O Quereres, inclusa no disco Velô, de 1984, cuja letra é frequentemente objeto de análise por especialistas da área de Língua Portuguesa, professores de cursinho e estudiosos da obra de Caetano.
Considerada por alguns como a música que melhor traduz seu criador, O Quereres mostra-se pouco convencional já no título, unindo o singular ao plural e discorre, em seguida, sobre contradições reveladoras da personalidade camaleônica de Caetano Veloso. É o que lhe garante o diferencial perante os outros: nunca deixar-se desvendar, mantendo, assim, uma liberdade que não admite concessões.
Os termos são colocados como antíteses, mas o brilhantismo da composição está, também, no fato dele se utilizar de colocações pouco óbvias, fazendo uso, inclusive, de artifícios como metonímias. Outro detalhe importante e que acaba por valorizar poeticamente a canção: a composição é inteira em versos decassílabos e há uma citação a respeito, no terceiro verso da terceira estrofe, quando diz: “onde queres o livre, decassílabo”. A exceção fica apenas no refrão, em que há dois versos de sete sílabas. Mas não são somente as referências poéticas que fazem desta canção uma das melhores de seu repertório: a forma como estrategicamente lida com a construção de frases, mostra-nos tratar-se de uma homenagem à Língua Portuguesa.
A música reluta mediante conflito em tempo integral e finaliza demonstrando a insolubilidade da questão, ao colocar nos três últimos versos: “e eu querendo querer-te sem ter fim/ e, querendo-te, aprender o total/ do querer que há e do que não há em mim.”.
A interpretação dada por Caetano reforça o universo proposto pela música. Outros intérpretes também deram rica leitura à obra, como as cantoras Maria Bethânia e Gal Costa.
Leia abaixo, na íntegra, sua letra.
O quereres
Caetano Veloso
Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alta, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão
Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês
Ah! bruta flor do querer
Ah! bruta flor, bruta flor
Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói
Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és
Ah! bruta flor do querer
Ah! bruta flor, bruta flor
Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock’n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus
O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim
Renata Iacovino - escritora, poetisa e cantora / reiacovino.blog.uol.com.br/
http://reval.nafoto.net / reiacovino@uol.com.br
A moça carrega na alma flores de cerejeira. Não tenho dúvida disso. A flor da cerejeira, sakura em japonês, é a flor símbolo do Japão. Diz a lenda que sakura vem da princesa Konohana Sakuya Hime, que teria caído do céu nas proximidades do monto Fuji e se transformado em flor de cerejeira, que se tornou um símbolo de sabedoria. Desprende-se com simplicidade do ramo, sem passar pelo processo de apodrecimento. É considerada uma das flores mais belas, pelo seu formato e pela delicadeza e espessura de suas pétalas. A planta segue rigorosamente o ritual das quatro estações do ano. No outono perde as folhas e, no inverno, adormece com os galhos nus. Originária da Ásia, chegou ao Brasil por volta de 1908, através dos imigrantes, para amenizar a saudade da pátria. Foi aqui que a moça se apaixonou, em meio a outras flores, pela da cerejeira.
Ela é de empenho em direitos e deveres. Inteligente, culta e atenta a todos os acontecimentos, respeita o início e o término do tempo de cada um para tantas coisas, até mesmo para a aprendizagem, muitas vezes tardia, de que o bem não provoca tragédias. Moça firme, que pensa e repensa, mas não titubeia. Diria até que ela é metódica. O essencial é que gosta demais da luz.
Foi por se deter na claridade que avistou, há algum tempo, no parapeito de sua janela, uma avezinha a empurrar um vaso de flores coloridas, quem sabe pensando ter encontrado uma lagoa de água doce, adequada a ela, para se refrescar nos dias de calor intenso. Olharam-se nos olhos. Ela compreendeu a importância da água para asas a salvo, que carregam sementes, gotas de orvalho, murmúrios da brisa... O pássaro notou que poderia voltar todas as vezes que quisesse. Não era ela de correntes que prendem os pés. No dia seguinte, chegou de maneira tímida e encontrou, em meio aos vasos, um prato apropriado com água para seu banho e folguedos. Uau! Blub! Glub! He! He! He! Huuum! Chuá! Chuá! Pouco tempo depois, trouxe seus companheiros de árvores, praças e céu. Chegaram mesmo a explorar o local, voando por outros cômodos. Embora em espaço de concreto, sentem-se seguros. Ali exala perfume da floresta e respeito pela vida. Ali foi plantado aconchego, sem risco de armadilhas. Atualmente, ousam pousar, próximo à moça, em algum dos galhos das flores ou nas folhas longas e marmorizadas da espada-de-são-jorge. Em seguida, vem o banho com algazarra, para depois, em compasso de alegria, movimentarem-se pelo ar. Penso na magia da água que se oferta às pessoas, bichinhos e plantas. A água é sinal de purificação e vida. Quem oferece, se santifica. Quem recebe, torna-se, nem que seja por um instante, imaculado.
A moça é adepta da independência. Escolhe e permite que escolham. É de amabilidade extrema com as obras do Criador. Sementes ou mudas, que aterrissam em suas mãos, decolam em direção à primavera. Pessoas assim, penso eu, caíram do céu como a princesa Sakuya, e trazem, na alma, flores de cerejeira.
MARIA CRISTINA CASTILHO DA ANDRADE- É coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher e autora de “Nos Varais do Mundo/ Submundo” –Edições Loyola
O que vou escrever não tem nada de sobrenatural, nem é fruto de fanatismo, mas é apenas o relato do que acontece comigo e que poderá ser vivenciado por qualquer pessoa.
O cristão, especialmente o católico, acredita que quando morrermos nem todos terão o privilégio de ir direto para o Céu, o que está reservado apenas para aquela pessoa que guarda em seu
coração e pratica plenamente em vida os ensinamentos de Jesus. Ele mesmo ensinou isso.
Não quer dizer que todos nós que não conseguimos essa perfeição evangélica seremos condenados eternamente a não ir para o Céu. Quem não for aquele pecador obstinado, aquele que comete pecado mortal e dele não se arrepende com sinceridade, passará pelo Purgatório, local ou estado em que a alma da pessoa será purificada para então ter o direito de estar junto de Deus.
Não quero entrar em discussão teológica com quem não concorda que exista ou não o Purgatório, mesmo porque não tenho como provar nada. Apenas acredito que ele exista pelos ensinamentos da doutrina católica e pela fé que tenho de que Deus não irá condenar ninguém que não esteja pronto para estar com Ele, mas que também não merece a condenação eterna.
Aliás, Santa Faustina recebeu de Jesus esta explicação sobre o Purgatório, já que as pessoas pensam que Deus sendo misericordioso não precisaria fazer com que as almas passem por esse estágio, conforme está registrado em seu diário no número 20:
“ A Minha misericórdia não deseja isto, mas a justiça o exige”.
Quer Ele dizer com isto que cada alma que lá está sente imensa saudade de ver Deus, de estar junto a Ele, mas cada uma ficará um tempo diferente para ser purificada, de acordo com o que fez ou deixou de fazer na Terra. Essa saudade de Deus é que é o seu sofrimento maior.
As nossas orações e nossas caridades feitas pela intenção de alguma alma podem abreviar o tempo em que ela deve ficar naquele estado. Por isto rezamos pela almas dos nossos pais, irmãos, parentes, amigos.
Quero relatar a experiência que tenho e que não é nada aterrador, como muitos possam estar pensando.
Conto um fato acontecido em uma cidadezinha do interior mineiro onde nasci para ilustrar o meu procedimento.
Na cidade, muitos anos atrás, havia uma senhora que vivia da caridade pública. Tinha onde dormir, mas não tinha o que comer. Em qualquer casa da cidade em que ela chegasse na hora do café, do almoço ou do jantar recebia sempre a alimentação mesmo sem pedir, pois todos conheciam sua necessidade. Era inofensiva, embora parecesse não ter as faculdades mentais normais, e todos gostavam dela.
Durante muitos e muitos anos ela assim viveu.
Um dia ela não apareceu na casa de ninguém para tomar café. Ninguém se alarmou, pois achavam que ela estava em outro endereço. Passados uns dois dias a notícia do seu sumiço se alastrou. Todos saíram para procurá-la.
Reunindo as informações de quem a tinha visto por último, chegaram à conclusão que ela se perdera em uma parte de uma fazenda vizinha, pois tinha o costume de passear por lá, perto de um rio. Com receio de que ela tivesse se afogado, procuraram-na e ao passar pelos campos a encontraram morta no meio do pasto, dando a impressão de que ela estava indo em direção ao rio.
Ficou em todos os moradores da cidade a impressão de que ela tinha morrido de sede, quando procurava água para beber.
Formou-se um costume na cidade de pedir a ajuda da sua alma para procurar objetos perdidos.
Eu mesmo sou um dos que mais solicito sua ajuda. E creiam, pois é difícil acreditar, sou sempre ajudado.
Quando perco alguma coisa, vasculho todos os lugares possíveis para encontrar e nem sempre consigo. Tenho então o costume de rezar pela alma da Bia, que era como a mulher era chamada e pela alma mais precisada do purgatório, aquela quem ninguém se lembra de rezar por ela.
Acreditem ou não, logo acho o que perdi.
Se fosse relatar todos os casos, seria uma infinidade, mas vou ficar apenas com um.
Eu precisava fazer a cópia de uma chave da minha casa. Peguei o chaveiro onde ela estava e me dirigi para um profissional da área, no centro da cidade. Minha esposa dirigia o carro e o estacionou
A uns quinhentos metros do local.
O profissional tirou a chave do chaveiro, fez a cópia, colocou-a novamente no chaveiro e me entregou. Paguei e fui para o carro. Ao chegar a minha casa, procurei o chaveiro para testar a chave a não o achei. Procurei nos bolsos, nada. Revirei o carro, inclusive mexendo nos tapetes da frente e de trás da poltrona onde estava assentado, e nada achei. Olhei debaixo do carro, nada. Resolvi voltar à loja do profissional para saber se não tinha deixado cair por lá e ele me disse que se lembrava bem de tê-la me entregue e que eu saíra da loja coma ela na mão. Fiz o mesmo percurso da loja até onde o carro estava mais de uma vez olhando a rua e nada achei. Como já estava escurecendo voltei para casa. Mas, no dia seguinte, bem de madrugada voltei a fazer o mesmo percurso da loja ao estacionamento. Como já clareara, pude perceber que nada estava ali. Pensei que eu a tivesse perdido no tal percurso e que algum passante a tivesse achado e não sabendo de quem era a levou.
Voltei para casa desanimado, pois perdera a chave nova e as antigas também.
Quando cheguei à garagem da minha casa, resolvi dar mais uma olhada. Nada.
Então, resolvi pedir a ajuda das almas.
Depois de rezar por elas, me veio a idéia de olhar novamente dentro do carro. Ao abrir a porta do passageiro, não precisei nem de nele entrar. Em cima do tapete de trás lá estava o chaveiro.
Alguém pode falar: — o chaveiro estava lá desde o começo. Ele é que não procurou direito.
Isto não é verdade, pois cheguei a tirar o tapete do lugar para procurar debaixo dele.
Como não era a primeira vez que me acontecia fatos semelhantes, afirmo ao contrário de quem não acredita: — As almas precisam de orações.
Talvez Deus permita que tal aconteça para que nos lembremos delas.
Agora eu te pergunto: — Você reza pelas almas dos seus parentes? Pede a celebração de missas por intenção delas?
Aos vicentinos eu pergunto: vocês rezam pelos seus assistidos já falecidos? Pedem a celebração de missas pelas suas almas? E não estou falando da Missa das Cinco Intenções que pedimos para celebrar na data do aniversário da nossa Conferência.
Na próxima vez que você perder alguma coisa e depois de muito procurar não a encontrar, reze pela alma mais precisada do Purgatório e peça-lhe ajuda para encontrar o que perdeu.
Tenho a certeza de que vai encontrar.
ALUIZIO DA MATA - Vicentino, Sete Lagoas, Brasil
OS MEUS LINKS