PAZ - Blogue luso-brasileiro
Domingo, 17 de Abril de 2016
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - OLHAI POR NÓS

 

 

 

 

 

 

 

 

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            Quem conhece meus textos sabe que tenho por hábito evitar temas polêmicos, primeiro porque é preciso respeitar a divergência de opiniões e segundo porque eu acredito na leveza das palavras para dar algum alento ao excesso de notícias pesadas e complexas com as quais a mídia, de uma forma geral, já nos “brinda” diuturnamente.

            Mas estava eu aqui diante da tela em branco do computador, pensando sobre o que escrever, em um daqueles dias nos quais a ideia já não está pronta na cabeça, borbulhando para escorrer pelos dedos, rumo ao teclado. Esse fato, essa aparente “ausência” se deve a que meus pensamentos hoje estão em outro lugar, no mesmo lugar no qual, creio, deve estar a de todo brasileiro que tem a mínima noção da atualíssima situação política e histórica que o país está vivendo.

            Hoje, dia no qual escrevo, ainda não foi decidido o impeachment da Presidente Dilma, porém estamos às portas dessa decisão. Confesso que, embora advogada, não é nessa qualidade que me manifesto nesse texto, mas como cidadã. E nessa qualidade, de pessoa pagadora de impostos, altíssimos, diga-se de passagem, é que sinto ser minha obrigação usar esse espaço, nesse momento, para tratar um pouco desse assunto. Creio que até seria uma decepção para os meus leitores se eu simplesmente tratasse de um outro tema qualquer e como “um filho seu não foge à luta”, não pude me calar.

            Pois bem, todos os dias temos ciência de novas denúncias, de novos favorecimentos, novas escutas e novos “conchavos estratégicos” para que o a Presidente não venha a perder seu cargo. Fico até com a impressão de que, tamanho apego se deve à confusão de mandato com propriedade, de cargo com trono, mas trocadilhos à parte, fica a sensação de que não está pensando no bem do país e dos brasileiros, mas tão somente de um partido, de um estado de coisas, da manutenção de um projeto de apropriação indevida.

            Não sou dona de verdade alguma e muita coisa ainda está em análise, sob judice, de forma que é complicado dizer que tal coisa é certa e tal coisa é errada, mas há argumentos com os quais não posso concordar e aos quais jamais irei me curvar, como os que tem como finalidade dividir uma nação em cores e em classes sociais. Repudio veementemente essa babaquice de que quem não aceita mais o atual estado de coisas na verdade quer que os pobres e negros se lasquem. Meus amigos, à exceção de quem está lucrando com a roubalheira, já estamos TODOS lascados, para dizer o mínimo.

            Fica muito difícil, igualmente, engolir, tal como se produz o maldito foie gras[1], o argumento de que “todos roubam e que não foi o PT quem começou com isso”. E desde quando isso é o que importa?? Tem que cair todo mundo, tenha a porcaria de sigla que tiverem. Está na hora de nos livrarmos dessa corja de vagabundos que aumentam seus próprios salários, que vivem como se fossem senhores feudais, que desviam dinheiro que salvaria vidas, que nomeiam amigos, que denigrem deliberada e criminosamente a imagem de quem não se coaduna com eles.

            Confesso que não faço ideia do resultado da votação do impeachment, mas seja ele qual for, que os movimentos por um país melhor, menos corrupto, menos venal, não parem. Que todos os homens e mulheres de bem que bancam esse país com o suor de seu trabalho tenham sua voz ouvida e que, dessa baixaria toda possa sair um novo começo, pois a se manter as coisas como estão, penso que não haverá mais condições de se ter esperança de dias melhores, perdidos que estaremos em uma Pátria Mãe Hostil...

 

 

[1] http://mundoestranho.abril.com.br/materia/como-e-feito-o-foie-gras

 

 

CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo.  -  cinthyanvs@gmail.com

 

 

 



publicado por Luso-brasileiro às 19:28
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VALDEREZ DE MELLO - QUESTÃO DE EGO !

 

 

 

 

 

 

 

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            Há pessoas que nascem para o bem, outras para gerar desavenças e fincar o pé no muro que separa o sim e o não a ignorar para o que vieram. E, assim recostados na ociosidade, vivem de trocas de favores, oportunidades e até chegam a crer portadores de magnânima esperteza. Esse tipo de cidadão, que vive de escambo de favores, cujo objetivo maior não é o trabalho, mas sim o poder de marionetar asseclas simplórios e crédulos, se auto intitula o salvador da pátria, ou seja: o imaculado, o Deus! E, deveras atrevido, levanta o grande totem construído à sua imagem e semelhança e acredita piamente ser o Messias prometido.

            Tudo obra e culpa do ego exacerbado e inflado, que, fartamente nutrido pela soberba, cresce em ignorância! Consequentemente, não há espelho que possa refletir o tamanho físico do portador do superego, sequer meios eficazes de detectar o grau de incompetência, tampouco resgatar resquícios de sabedoria! O portador do ego inflado, não mais consegue distinguir  o notório do duvidoso, a realidade da utopia, e o mais grave: não consegue enxergar o outro como ser humano! Atropela a mãe, derruba o pai, ignora os filhos, a esposa, achincalha  autoridades como se nada e ninguém pudesse  se equiparar à tão notória criatura: o sábio, o poderoso,  o dono da verdade, o insubstituível, o único! E de posse desse onírico galardão, destrói cidades, pessoas, crenças, objetivos, distorce verdades, incentiva a luta, divide a nação, tudo para alimentar a mente pervertida, doente e quiçá, maquiavélica.

            Quando o poder pousa nestas mãos, o caos é certo, a anarquia acampa e o incentivo à guerrilha cresce  até que irmãos ataquem irmãos! Um chefe de Estado deve demonstrar sabedoria, postura, carisma, linguajar aprimorado e sobretudo liderança nata, não a adquirida através do mercado de almas. Um governo democrático, urge conhecer e acatar as leis, respeitar os símbolos da Pátria, as cores da bandeira e sobretudo os poderes constituídos, caso contrário estaremos diante de governo, incapaz, autoritário, lesa-pátria e oportunista!

            Imperativo lembrar que um verdadeiro líder,  há que ser íntegro, probo, capaz, eficiente e eficaz, pois, o sucesso de um governo se mede pela educação oferecida aos cidadãos, pelo sistema público de saúde apresentado e pela segurança quanto ao direito de ir e vir! Pois, segundo Voltaire, o melhor governo é aquele em que há o menor número de homens inúteis! Oportuno citar: “Os políticos e as fraldas devem ser trocados frequentemente, e pela mesma razão.” (Eça de Queiroz).

 

 

VALDEREZ DE MELLO   -   Advogada, Pedagoga, Psicopedagoga Autora de Menino de 500 anos!



publicado por Luso-brasileiro às 19:21
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VALQUIRIA GESQUI MALAGOLI - O RACIOCÍNIO PREGUIÇOSO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“O gato é uma maquininha/ que a natureza inventou;/ tem pelo, bigode, unhas/ e dentro tem um motor./ Mas um motor diferente/ desses que tem nos bonecos/ porque o motor do gato/ não é um motor elétrico./ É um motor afetivo/ que bate em seu coração/ por isso faz ronron/ para mostrar gratidão./ No passado se dizia/ que esse ronron tão doce/ era causa de alergia/ pra quem sofria de tosse./ Tudo bobagem, despeito,/ calúnias contra o bichinho:/ esse ronron em seu peito/ não é doença – é carinho” (Ferreira Gullar).

Após o gato ter sido domesticado pelo homem, resta ainda saber, nessa relação, quem na verdade adotou quem.

Resumidamente: não faltam provas de que o felino foi, em certo local e época, cultuado como criatura superior.

Muito bem, contrabandos adiante, ele vem parar noutras nações, não mais com direito a suntuosos enterros semelhantes aos dos faraós, mas, desta vez, simplesmente gato.

Deram-se cruzamentos com animais nativos de maneira que nasceram novas espécies.

Capítulos correram nessa trajetória, entre os quais aquele em que ele teve importantíssimo e vitorioso papel, como por exemplo, na guerra contra a peste bubônica.

Não obstante, está de novo, em tempos modernos, quem diria?, entregue a outra peste, esta do porte da superstição que o rebaixou ao status de criatura odiada quando fora queimado, quer dizer, quando queimava-se bruxas em forma de gatos.

A praga da vez é a ignorância, a desumanização da mesma raça que o “livrou” um dia da sua natureza selvagem.

Ora... ora... mas quem será o bruto: o animal irracional ou o único distinto pela capacidade de raciocinar, e, portanto – o único dotado da preguiça para tal?

Essas criaturas talvez tenham mesmo poderes sobrenaturais. Sempre que me vejo nuns olhos felinos, magicamente me enojo da minha humanidade; sinto nojo de pertencer à família dos que, numa mão levam imagem de devoção em novenas, e noutra o chumbinho com que se determinará qual ser e de que forma merece morrer!

O que torna tão difícil alguém chegar noutro alguém e dialogar ao invés de sair fazendo valer seu poder silencioso de criatura superior a todas as demais criaturas?

 

 

VALQUÍRIA GESQUI MALAGOLI, escritora e poetisa,  vmalagoli@uol.com.br / www.valquiriamalagoli.com.br

 



publicado por Luso-brasileiro às 19:09
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SONIA CINTRA - SANDRO VAIA

 

 

 

 

 

 

 

 

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Na esteira de textos que expressam as saudades de Sandro Vaia e lavram sua memória, deixo registradas essas breves palavras, que reverberam a amizade com uma das pessoas mais cultas e dignas que conheci. O rigor e a doçura caminhavam de mãos dadas na essência do ser humano e do profissional desse mantovano adotado por Jundiaí. Conviver com sua refinada sensibilidade nas reuniões do sitio de Erazê, com sua ironia nas linhas e entrelinhas de artigos para blogs e jornais, com seu humor nas páginas de crônicas, com sua argúcia política nos livros “A ilha roubada - Yoani, a Blogueira que abalou Cuba”, e “Armênio Guedes – Sereno Guerreiro da Liberdade”, contemplar a reciprocidade afetiva entre ele e seus familiares, pertencer à roda de seus amigos, foi aprendizado indelével deste vasto mundo.

Porém, ninguém melhor para falar de Vaia do que ele mesmo, pois, como diz o Araken, Sandro era especial! Em sua crônica “A última vez” (Jornal de Segunda, 1976), publicada no livro “Crônicas de 2ª com Pufs! de primeira”, (Literarte, 2000), por exemplo, a ambientação de um bar e o clima de despedida levam a personagem a buscar solução para o mal-estar do momento na sétima arte: “Se fosse Marcello Mastroiani, pensou, podia fazer uma expressão de tédio cinematográfico. Pegaria bem. Como um filme de Antonioni. Sempre que não sabia dizer as coisas, pensava em filmes de Antonioni, como se tudo que Antonioni fizesse acabasse em silêncio”. Entretanto, ao final: “Quando o bar fechou, de madrugada, saíram todos juntos, ele e ela de mãos dadas, como os outros e as outras. Ninguém disse nada mas todos sabiam que era a última vez”. A linguagem primorosa do cronista ao mesmo tempo vela e revela a ponte entre ficção e realidade.

Certa vez, reunidos em casa com Vera e Sandro Vaia, Iolanda e Fábbio Perez, Helena e Inos Corradin, ficamos conversando até o dia raiar sobre arte, e o caldo-verde, que ele tanto apreciava, fumegante nas terrinas, alimentou nossa vã filosofia, ao som de fados e chorinhos. Acerca de “Cantares do Japi” (Laser Press, 2003), livro de poesia comemorativo dos 20 anos de Tombamento da Serra do Japi, Sandro escreveu: “Estranhos seres esses que pisam nas nuvens enquanto os mortais, aqui embaixo, tropeçam nas pedras das ruas. Mas por esses estranhos seres que pisam nas nuvens, os poetas, o fluxo da vida passa diferente, Esse fluxo não grita, ele sussurra”.

 Sandro também sussurrava...

 

 

SONIA CINTRA - ESCRITORA E PROFESSORA UNIVERSITÁRIA .

 

 



publicado por Luso-brasileiro às 19:03
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PAULO R. LABEGALINI - O TESOURO QUE NÃO SE ACABA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Num pequeno país distante, existia um cidadão chamado Saul, que se julgava infeliz por ser pobre. Vivia se queixando da vida que levava, precisando trabalhar duro para dar um pouco de conforto à família. No mesmo lugar, morava um homem simples, muito sábio e admirado por todos. Aparentava paz de espírito por onde andava, sempre sorrindo e fazendo o bem sem escolher a quem.

Um dia, Saul descobriu que o sábio era portador de um grande diamante. Então, pensou: ‘Essa é a explicação da sua felicidade: disfarça ser pobre, mas, na verdade, é muito rico!’. E resolveu testar a bondade daquele homem, na intenção de desmascará-lo em público se não conseguisse o que pretendia.

Quando chegou à casa do sábio, encontrou-o colhendo verduras na horta e partiu logo para o ataque:

– Sei que o senhor se faz de miserável, mas possui um valioso diamante. Por que escondeu por tanto tempo isso da gente e nos fez pensar que pessoa como eu poderia alcançar a felicidade?

– Saul, meu amigo, a joia que possuo foi confiada a mim quando meu avô morreu. Isso já faz trinta anos e nunca precisei desfazer dele para sobreviver e servir o próximo.

– Ah, é? Então quero ver se consegue ficar sem o tesouro. Já que é considerado um bom homem, por que não o dá a mim de presente?

– Sempre desejei fazer isso: entregá-lo a quem o desejasse muito e tivesse a coragem de pedi-lo a mim. Vou buscá-lo, ele é seu!

Surpreso com tamanha caridade, Saul saiu de lá saltando de alegria e se sentindo o homem mais rico do mundo; mas nem tudo foi maravilhoso como sonhou. Após se desfazer do diamante, largou o emprego, gastou o dinheiro e as dificuldades vieram em maior número. A cada nova derrota, mais lhe chateava saber que o sábio continuava feliz.

E Saul foi novamente ao seu encontro, mas agora com um pouco de humildade no coração:

– Perdoe-me importuná-lo novamente, mas preciso que me revele qual o seu verdadeiro tesouro. Sei que é muito maior do que aquele diamante que me deu. Pode também doá-lo a mim e me fazer um homem feliz?

– Infelizmente, isso eu não posso fazer, porém, quero que saiba que onde está o seu tesouro, sempre estará o seu coração. Valorize o que é belo, o que agrada a Deus, e será feliz.

Esta história eu ouvi na homilia de um sacerdote. Gostei da mensagem porque parece que o mesmo fato já aconteceu com cada um de nós. Toda vez que desejamos mais paz em nossa vida, nos esquecemos que ela está dentro de nós!

Nosso coração fica tão atribulado com amenidades sem valor espiritual que não encontramos a própria felicidade escondida no peito. Mesmo quando Jesus nos fala, insistimos em não ouvi-Lo, como no Evangelho de domingo passado:

“Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar a vós o Reino. Vendei vossos bens e dai esmola. Fazei bolsas que não se estraguem, um tesouro no céu que não se acabe; ali o ladrão não chega nem a traça corrói. Porque, onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.”

Portanto, o tesouro que não se acaba está na prática cotidiana da caridade, no perdão, na paciência, na oração, na humildade, na bondade, na sinceridade, enfim, no amor! Quem age assim, será cada vez mais abençoado e encontrará a felicidade eterna. Aqueles que constroem o Reino de Deus no mundo sabem bem do que estou falando.

No livro ‘Minha Vida de Milagres’, lançado pela Editora Santuário, escrevi isto na introdução:

“Não foi à toa que em 1991 eu fui resgatado das trevas e devolvido à luz. Minha missão neste mundo ainda não estava cumprida, aliás, mal havia começado. Hoje, tenho consciência que não tinha experimentado com profundidade o amor de Deus; portanto, afastado Dele, deixaria de entrar no Céu se morresse naquela época.

Jesus não manda castigo a ninguém, contudo, quando permite que coisas ruins aconteçam, há dois motivos para isso: salvar alguma alma que se perderia futuramente ou providenciar abundantes graças às pessoas de fé.

Foram centenas de terços e muitos joelhos no chão para que eu pudesse voltar a caminhar com minhas próprias pernas, fora do leito de um hospital. Mas, Deus é tão bom que aproveitou todas aquelas orações para me dar uma graça ainda maior: a cura espiritual.”

E posso completar estas palavras dizendo que a cura espiritual é sempre acompanhada de grande responsabilidade por parte de quem a recebe. É como se Jesus dissesse: ‘Eu lhe dou a paz, Eu lhe entrego a minha paz, e ela continuará com você enquanto for fiel às coisas do alto’. Quanto mais nos entregarmos ao serviço gratuito na Igreja, mais graças recebemos.

Isto também é bíblico: “A quem muito foi dado, muito será pedido; a quem muito foi confiado, muito mais será exigido”. E como muito me foi dado, retribuo um pouco a cada dia – para não perder o tesouro a mim confiado. Amém!

 

 

PAULO ROBERTO LABEGALINI - Escritor católico. Vicentino de Itajubá - Minas Gerais - Brasil. Professor doutor do Instituto Federal Sul de Minas - Pouso Alegre.‘Autor do livro ‘Mensagens Infantis Educativas’ – Editora Cleofas

 



publicado por Luso-brasileiro às 19:00
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HUMBERTO PINHO DA SILVA - A INGRATIDÃO DA ESPOSTOA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Quando era menininho, ia, na companhia de minha mãe, para aldeia perdida entre serranias. Ficava em quebrada de serra, que a protegia de ventos frios, e desabridos temporais, que fustigavam desapiedadamente as povoações vizinhas.

Quase todos os verãos abalávamos para Trás-os-Montes, em velhíssimo comboio de amplos bancos de madeira envernizada, que serpenteava as mansas águas do rio Douro.

Nessa recuada época, as águas do rio eram cristalinas e plácidas, e caminhavam tranquilas para a foz. Numa quietude quase absoluta: sem pressa, sem correrias, sem atropelos…

Numa dessas viagens comboianas (como gostava de cactos, e ainda gosto,) levei envasado, um, que comprara na florista da minha rua; e criara-o com esmero e amor, no peitoril da janela de meu quarto.

Meu pai aconselhou-me a levá-lo. Segundo ele, a planta estiolaria e talvez morresse, no pequeníssimo vaso de barro vermelho, onde nascera.

De tanto o ver e cuidar, afeiçoei-me. Falava com ele; acariciava-o com os meus deditos; penteava-o com doçura a branca penugem sedosa; e convenci-me, que ele, de tanto me ver, de tanto o ter abraçado, também nutria por mim, sentimentos de grande ternura.

Replantei-o com carinho, em terra fofa e bem adubada. Todos os dias, logo que o Sol se levantava, visitava-o, dando-lhe os bons-dias; e, pelo anoitecer, quando a tarde calmosa, adormecia, ia vê-lo. Passava, então, largos minutos a cuidá-lo: libertando-o de indesejáveis bichinhos.

Foi em lágrimas que me despedi. Creio que o beijei; e convenci-me que ele, também chorou: pois cobriu-se de gotinhas de orvalho, na manhã da partida.

Quando, no aconchego do meu pequenino quarto, entre alvos lençóis, ouvia a chuva e o vento vergastarem as vidraças, da minha janela; e via, pelas frinchas das portadas de madeira, o clarão azul de raios, que rasgavam a noite negra, rezava, muito baixinho, para que o bom Deus o guardasse, com Sua Mão ou Seus anjos, das intempéries impiedosas.

Para me cativar, meu tio, fez-lhe uma estufa, com sólido telhadinho de colmo, que o defendia de agrestes invernadas.

No ano seguinte, parti ansioso. Não via hora de chegar: para o abraçar e quiçá, beijá-lo.

Para meu espanto, tinha crescido. Estava quase do meu tamanho! … Era, não digo, um cacto adulto, mas adolescente…

Aproximei-me para o abraçar, e logo recuei, com as mãos crivadas de pequeninos e agressivos espinhos.

Ralhei asperamente com ele. Eu, que o cuidara com tanta dedicação; que o amei tanto, fui recebido como estranho, como se fosse malfeitor! …

Olhei-o de frente – e, enquanto retirava, um a um, os espetos que se enterraram na epiderme, pensava com pesar.:

Quando era menina, a minha espostoa, recebia os meus carinhos, com alegria; e retribuía-os, acariciando-me, com os sedosos pelos, a minha mão acalentadora.

Crescera, tornara-se adulta, e considerou que não mais precisava de mim, e recebeu-me com indiferença; com a superioridade de quem tem esteiros sólidos, e não precisa mais de ajuda…

Lembrei-me de narrar a história da espostoa, porque, amiga minha, minhota de coração, e alentejana por casamento, em hora de amargura, contou-me: que casara ainda menina com industrial. E tão menina era, que não poucas vezes, o marido, surpreendeu-a a dançar o Vira, no quarto…Então, corava de vergonha…

Gostava muito de crianças, mas nunca foi abençoada. Dedicou-se de alma e coração ao filho do caseiro da quinta, onde morava.

Queria-lhe tanto, que se alegrava com suas alegrias e chorava quando ele chorava, pelo amor que lhe tinha. Resolveu, então, deixar-lhe a casa, onde vivia, por muito lhe querer.

O menino cresceu. Esqueceu os mimos que receberas; e, indiferente à velhinha entorpecida, que muito lhe queria, abandonou-a na companhia de rude criada, que mal falava o português! …

Minha amiga chorou muito, em segredo. Porque sentimentos e afectos sofrem-se em silêncio, para que o mundo não se ria de quem ainda os tem.

O mesmo acontecera comigo: a espostoa criou espinhos para se defender de inimigos; mas não soube recolhê-los, quando eu, cheio de ternura, e olhos radiantes de amor, a abracei.

Tinha crescido…já não precisava dos meus carinhos…

 

 

HUMBERTO PINHO DA SILVA   -   Porto, Portugal.



publicado por Luso-brasileiro às 18:46
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EUCLIDES CAVACO - GUITARRA TU ÉS PRINCESA
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Mais uma glorificação à nossa Guitarra Portuguesa aqui transformada neste cativante fado que ofereço a todos vós.
Ouçam este fado e vejam o poema formatado aqui neste link:
 

http://www.euclidescavaco.com/Poemas_Ilustrados/Guitarra_Tu_Es_Princesa/index.htm


Desejos duma magnífica semana.
 
 
 
EUCLIDES CAVACO - Director da Rádio Voz da Amizade , Canadá.
 
 
 
 
 
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PINHO DA SILVA   -   MINHA VIDA COM
TERESINHA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O casamento e a mortalha...
 

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(Continua na próxima semana)

 

 

 

PINHO DA SILVA - (1915 – 1987). Nasceu a 12 de Janeiro, em Vila Nova de Gaia, (Portugal). Frequentou a Escola de Belas Artes, do Porto. Discípulo de Acácio Lino, Joaquim Lopes e do Mestre Teixeira Lopes. Primo do escultor Francisco da Silva Gouveia (autor da celebre estatueta de Eça de Queiroz). Vila-florense adotivo, por deliberação da Câmara Municipal. Redator do “Jornal do Turismo”. Membro da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto. Foi Secretário-geral da ACAPPublicou " Minha Vida Com Teresinha", livro autobiográfico.

 

 

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Ajude a Cáritas a ajudar quem precisa com o IRS

 

 
 
 
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publicado por Luso-brasileiro às 18:40
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Domingo, 10 de Abril de 2016
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI - HINO NACIONAL, DIFÍCIL, MAS ADORADO PELOS BRASILEIROS.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A maioria dos brasileiros gosta do Hino Nacional, apesar de alguns entenderem ser extenso e integrado por palavras difíceis. No entanto, em dois aspectos todos concordam: sua melodia e letra são muito bem elaboradas e bonitas, e sempre emociona principalmente se tocado em grandes ocasiões, como quando os nossos atletas sobem a um pódio, elevando o nome do país.

Ele foi executado pela primeira vez em 13 de abril de 1831, com música composta por Francisco Manuel da Silva e não dispunha de letra. Por tal razão, essa data lhe é comemorativa – Dia do Hino Nacional. A composição - uma marcha destinada à sua consagração - só em 1909 recebeu versos de Joaquim Osório Duque Estrada. E apenas em 1922, finalmente completa, foi oficializado como cântico oficial brasileiro e reconhecido como um dos símbolos nacionais, ao lado da Bandeira, das Armas e do Selo pela Lei 5.700, de 1971.

Observamos com freqüência nas ocasiões em que é executado, que poucas pessoas o conhecem de forma completa ou compreendem o  significado de inúmeras de suas expressões. Dessa forma, aproveitamos a celebração para tentarmos alcançar seus verdadeiros propósitos e objetivos, indicando o significado de algumas de suas palavras: BRADO: grito;
RETUMBANTE: som que se espalha com barulho; FÚLGIDO: brilhante, cintilante; IMPÁVIDO: corajoso; FLORÃO: flor de ouro; GARRIDA: florida, enfeitada com flores; LÁBARO: bandeira e CLAVA: arma primitiva de guerra, tacape.

Hoje, o hino nacional também é um instrumento de homenagem à Nação, devendo ser executado nas aberturas das festividades cívicas, patrióticas, escolares, esportivas internacionais, onde a população deve contemplá-lo cantando em uma só voz. Mais importante de tudo é que ele se constitui numa demonstração de apreço e respeito à Pátria, apesar da triste situação que enfrenta, tanto no campo político e moral, como na área econômica e de convivência social.  Por isso, sempre que o entoarmos, façamos imbuídos de imenso respeito, destacando ainda, que atualmente  também é invocado em situações de inconformismo e protesto contra os desmandos do Poder Público em geral, o que não deixa de ser uma manifestação reconhecidamente nacionalista.

 

 

  BEIJO, DEMONSTRAÇÃO DE AFETO

E CARINHO

 

 

Dia 13 de abril também é o Dia Internacional do Beijo. Para muitos, o ato de beijar é a melhor forma para demonstrar carinho e um dos termômetros de qualquer relação afetiva. Em relação à data, uma das brilhantes concepções de Carlos Drummond de Andrade: “O amor é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar”.

 

 

 

JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor, professor universitário. É presidente da Academia Jundiaiense de Letras (martinelliadv@hotmail.com)



publicado por Luso-brasileiro às 19:21
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ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS - AS LOUCAS AVENTURAS DO RABBI JACOB

 

 

 

 

 

 

             

                

 

 

 

 

 

 

 

 

Não sou, habitualmente, afeito ao gênero comédias, salvo quando inteligentes e críticas, indutoras à reflexão e, portanto, enriquecedoras do nosso espírito.

Rir, somente por rir, não me atrai. Mas rir para pensar, aprender e melhorar, isso sim, é algo que vale a pena fazer. O riso não é fim, é apenas meio. Não é prato de resistência, é apenas um importante tempero na mesa da nossa existência cotidiana.  É até indispensável. A Escritura diz, explicitamente: “Há tempo de rir, há tempo de chorar” (Eclesiastes, 3,4). De todos os animais, somente o homem é capaz de rir, somente ele tem senso de humor, precisamente porque é o único racional. A capacidade de rir é decorrência da racionalidade.

Assisti recentemente, em DVD, a uma comédia franco-italiana extremamente engraçada, que dá o que pensar: “As loucas aventuras do Rabbi Jacob” (1973). O principal figurante é Louis de Funès (1914-1983), ator francês de origem espanhola, que trabalhou em dezenas de filmes. A direção é de Gérard Oury (1919-2006), pseudônimo do cineasta francês Max-Gérard Tannenbaum (1919-2006).

O enredo é simples. Trata-se de Monsieur Pivert (picapau, em francês) um empresário rico, com os preconceitos, as idiossincrasias e o modo de pensar médios, da cultura mediana francesa. Sua filha se casa nesse dia, numa igreja de Paris, com o filho de um general, e todas as aventuras ocorrem desde a saída, de sua casa, para a igreja, até à cerimônia de casamento.

Paralelamente, duas outras personagens entram em cena. Rabbi Jacob, um rabino muito respeitado em Nova York, naquele mesmo dia está chegando, de avião, em Paris, para visitar sua família, que lhe prepara uma recepção calorosa, juntamente com a comunidade judia de um bairro parisiense. E Suliman, ativista revolucionário de uma nação árabe do norte da África, muito rica em petróleo, é caçado, naquele mesmo dia, em Paris, por um comando enviado pelo governo daquele país, o qual está sendo ameaçado por um golpe de estado tramado pelo grupo de Suliman.

As vidas dos três se entrecruzam, do modo mais surpreendente. Suliman, sequestrado pelo comando árabe, é salvo por acaso, por Pivert, que acabara de sofrer um acidente e brigar com seu motorista Salomão, o qual é, por coincidência, judeu religioso muito observante e sobrinho do Rabbi Jacob que está chegando. Suliman sequestra, então, Pivert e ambos se disfarçam de rabinos, sendo confundidos, pela comunidade judia, com o verdadeiro Rabbi Jacob e um seu acompanhante.

A recepção, na sinagoga, de Pivert e Suliman, disfarçados de rabinos, é extremamente hilariante. Interferem no caso a polícia, que procura Pivert, por julgá-lo criminoso; a esposa de Pivert, que o imagina fugindo de Paris com uma suposta amante; o comando árabe, que caça Suliman; e o motorista de Pivert que, reconciliado com seu patrão, ajuda-o a fingir que é o verdadeiro rabino.

No final das peripécias, Suliman, de caçado se transforma em herói, porque o golpe de estado, em seu país, foi bem sucedido e ele foi nomeado presidente da república. Acaba se casando com a filha de Pivert, que desiste de seu antigo noivo. Os dois rabinos Jacob, o verdadeiro e o falso, afinal se encontram e, esclarecida a confusão, ficam amigos e vão jantar juntos.

O enredo é muito simples, repito, mas o interessante é que ao longo de todo o filme vão sendo colocadas em realce múltiplas manifestações de racismo, xenofobia, incompreensão pelo que é diferente etc. Tais manifestações se revelam dos modos mais inesperados, mas sempre mostrando como estão presentes no modo de ser habitual do francês mediano. É um filme que vale a pena ser visto e apreciado.

 

 

ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS é historiador e jornalista profissional, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.



publicado por Luso-brasileiro às 19:18
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CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - DESCASO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Difícil ficar indiferente a certas coisas. Não raras vezes eu fico observando as pessoas no apressado de suas horas, no vai e vem dos dias e penso se elas ficam confortáveis ou conformadas com a situação das ruas, com a sujeira e com o descaso que parece já ter se transformado em rotina.

No centro de São Paulo, ao menos, mas acredito que não exclusivamente, as calçadas estão esburacadas, dificultando o trânsito de quem anda sem limitações e inviabilizando o caminhar de idosos e deficientes, sujeitos que ficam a quedas e a outros acidentes. Isso sem falar da sujeira, do lixo que macula de morte as ruas, praças e rios. Daí eu concluo que, assim como eu, outros tantos devem estar indignados, revoltados até, mas na prática acaba sendo difícil fazer algo de concreto.

Uma coisa que me incomoda muito é a quantidade de pessoas pelas ruas, perdidas em meio às drogas, à criminalidade e mesmo ao abandono. São homens, mulheres, velhos, jovens e crianças, todos comungando de uma realidade paradoxalmente paralela e transversal. Parecem possuir o inútil superpoder de serem invisíveis na maior parte do tempo e de serem incomodamente presentes em algumas ocasiões...

Nessa semana, enquanto eu caminhava pelo centro da cidade, nas proximidades da Praça da Sé e em meio a Tribunais, Fóruns e Instalações da OAB, eu vi um grupo de adolescentes e algumas crianças, envoltos em cobertores surrados e muito sujos, notadamente sob a influência de alguma droga, deitados na calçada, quase na hora do almoço e sob um calor escaldante. O olhar perdido de um menino, um dos únicos que estava em pé, embora enrolado em um cobertor imundo e fedorento, assolou-me... Doeu-me pensar que nem de longe o olhar era a única coisa perdida e irremediavelmente perdida e que, de alguma forma, embora eu pouco pudesse fazer por ele, eu tenha minha parcela de culpa.

É claro que não estou afirmando que sou diretamente culpada por algum morar na rua, bem como pela sujeira das ruas, até porque, no que tange a esse último caso, sequer jogo um papel de bala que seja fora do lixo. O que acontece é que me sinto responsável como cidadã, moralmente responsável por não exigir que algo seja feito, por ver que a omissão dos governantes e a omissão da população se equivalem de algum modo e não posso me dar ao direito de me excluir como co-responsável.

Ando cansada de ter que explicar aos meus alunos que o Estado tem o dever de cuidar dos seus e que a população paga impostos para que isso aconteça. Cansada de explicar a eles que o direito dos códigos não é o mesmo da vida real. Cansada de fingir que a sujeira das coisas e nas coisas não está ali e que, um dia, talvez por mágica, tudo se transforme e se ajeite. Cansa brincar de Poliana para não enfartar, para poder aguentar a rotina das horas, as injustiças e o descaso com o qual nós, brasileiros e brasileiras de bem, somos tratados.

Tenho buscado fazer a minha parte, mas a minha parte é um quase nada que me frustra. Além disso, nem consigo acreditar mais que, pelas minha palavras e atitudes, eu seja capaz de mudar quem quer que seja, pois sequer consigo convencer, em alguns casos, quem está perto de mim.

O que sei é que estamos próximos do limite. Acredito que vai chegar o dia no qual a gota d'Água fará transbordar o caneco, inclusive aquele que o governo nos passa constantemente, ávido por se apropriar do que nos pertence, como nosso dinheiro é nossa dignidade...

 

 

CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo.  -  cinthyanvs@gmail.com



publicado por Luso-brasileiro às 19:13
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MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE - PORTAS ABERTAS

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 
A moça comentou sobre a importância de portas abertas. Conhece a fundo as consequências das que se encontram fechadas.
Conheci-a com 15 anos. Embalava com ternura a filha recém-nascida, embora as dificuldades fossem inúmeras. Residia na encosta de um morro, em cidade vizinha, que invadiram aos poucos, sem bagagem, em busca de habitação. Determinada, insistia diante dos obstáculos para que a família sobrevivesse com dignidade. O marido, num misto de desencontro e revolta, derrubava umbrais com o propósito de se incluir na sociedade que o empurrara às margens.
E quantas portas fechadas ela enfrentou devido: à cor mestiça, ao marido detido, à irmã doente, ao dinheiro contado...  E as filas diante de fechaduras frias? Para o emprego, para a visita na cadeia, para o atendimento desta ou daquela necessidade, cujo ingresso, feito de rebaixamento do ser humano, fazia sangrar o coração.
Veio-me o jovenzinho de cabelos encaracolados que, apesar do olhar mortiço, me recordava as estampas de São João Batista. Procurou-me assim que saiu da cadeia, após oito meses encarcerado. Contou-me sobre seus sonhos a partir de um emprego. Retornou seis meses depois, a fim de me informar que retornaria ao tráfico para sobreviver. Não encontrara acesso a um trabalho sem delitos. Mais um ano e estive em seu velório.
A moça se referia à porta da misericórdia, aberta pelo Papa Francisco e enfatizou: “Quando ela se abre, é Deus chamando a gente”. O Papa insiste, no seu livro “O nome de Deus é Misericórdia”, em conversa com Andrea Tornielli, sobre a humanidade precisar tanto da misericórdia, por ser uma humanidade que possui feridas profundas e não sabe como curá-las... Afirma Francisco: “E não são apenas as doenças sociais e as pessoas feridas pela pobreza, pela exclusão social, pelas inúmeras escravidões do terceiro milênio. Também o relativismo fere muitas pessoas: tudo parece igual, tudo parece o mesmo. (...) A fragilidade dos tempos em que vivemos é também esta: acreditar que não existe a possibilidade de redenção...”
Quantas histórias tenho ouvido sobre portas que se fecham ou que jamais se abrem para determinadas pessoas.  Existem as da crise pela qual passamos, contudo se agigantam as mais perversas, as que franqueiam o caminho somente àqueles que vendem sua dignidade, sua honra, sua história. A que ponto chegamos...

 

 

 

Maria Cristina Castilho de AndradeProfessora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.

 



publicado por Luso-brasileiro às 19:05
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JÚLIA FERNANDES HEIMANN - CRIATIVIDADE BRASILEIRA

               

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

É consabido que o povo brasileiro tem a fama de acolhedor e criativo, distinguindo-se pelo jeito de se adaptar a situações diferentes com facilidade.

Ao fazer  um paralelo com outros países, verifico que o brasileiro é, realmente, acolhedor.

Passei alguns dias no Rio de Janeiro e observei que é corretíssima essa ideia que fazem de nós.

Como o Rio é uma das cidades que mais recebe turistas, os cariocas natos ou os que lá se radicaram tornaram-se peritos no atendimento informal. Isso  tornou  a cidade do Rio de Janeiro a mais democrática do mundo.

Em um dos dias em que lá estive, sentei-me ao lado da estátua de Carlos Drummond de Andrade e fiquei observando a diplomacia dos vendedores ambulantes de Copacabana e sua arte com os turistas estrangeiros.

Um deles me chamou, particularmente, a atenção e estive um bom tempo observando-o. Vi quando montou uma pequena mesa com um fogareiro de carvão em cima. Ao lado, uma caixa de isopor com cervejas e refrigerantes.

Na grelha do fogareiro eram assados espetinhos de carne bovina e de frango. Ao lado, havia um prato com farinha de mandioca torrada, nossa farofa.

O vendedor ambulante anunciava:

- Beef! Beef! Chicken ! Chicken! Beer “com” ice!

A função fática da língua portuguesa, que não importa como se fala, cumpria sua missão e os turistas se aproximavam. Olhavam os espetinhos, sentiam como estavam cheirosos e, através de mímica, mostravam nos dedos quantos queriam e arriscavam:

- Two.. three...beer...ice...

Em gestos de uso internacional, esfregando o indicador com o polegar, indagavam o preço. O vendedor também mostrava o valor nos dedos.

Olhavam o prato com a farofa e o vendedor arriscava:
- Flour...

Uns faziam sinal que sim, outros que não e falavam:

- Yes, please ou not..not...

E por ali foram passando japoneses, chineses, franceses, holandeses e muitos alemães com seus ‘já’, ‘nein’, ‘jawhol’, obrrigada  senhorr  e outros.

Era gente loura, morena, alta, baixa, com roupas coloridas e diferentes. Todos tinham uma coisa em comum: estavam vermelhos “como camarão”, queimados pelos raios solares do verão carioca.

Senti alegria em observar a destreza e a versatilidade daquele homem simples, trabalhador informal que sai à luta e vendeu, em meia hora, dezenas de ‘espetinhos’.

Alguns pessimistas falam com desdém do jeitinho brasileiro, dando-lhe conotação pejorativa de astúcia. Deveriam perceber a versatilidade como demonstração de inteligência em superar momentos de crise.

Após uns quarente e cinco minutos de observação, dei os parabéns ao vendedor pela desenvoltura – pareceu não entender bem o elogio – e cochichei ao ouvido do nosso grande poeta mineiro: - O povo brasileiro é o mais criativo do mundo, não é Drummond?

Ele não respondeu. Quem cala consente; neste caso, confirma!  

 

 

 

 JÚLIA FERNANDES HEIMANN   - escritora, poetisa e acadêmica. Jundiaí. 



publicado por Luso-brasileiro às 18:57
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ANTONIO VENDRAMINI NETO - UM BANCO VAZIO NA PRAÇA - " FALA-MOÇO "

 

 

 

 

 

 

catedral-nossa-senhora[1].jpg

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Amanheceu um banco vazio naquela praça de muito movimento defronte à Catedral da cidade, mostrando aos transeuntes daquela época, uma ausência de um personagem que fazia do trabalho de engraxate o seu meio de vida.

Destacava-se dos demais por ser o mais velho e da raça negra. Tinha um “bordão” que os outros não ousavam imitar.

Era sua característica; sentado no banco tendo à frente a caixa de ferramentas de trabalho, jogava no ar sua frase famosa quando passava alguém trajado de terno e com bonitos sapatos de couro. Apontava com o dedo indicador da mão direita para os sapatos e dizia: FALA MOÇO!

Era o seu modo de oferecer os seus serviços aos que topavam perder alguns minutos para lustrar os sapatos, sim, porque naquela época ainda se usavam, hoje caiu de moda, na praça só passam pessoas que ostentam belos tênis e para eles não existem graxa.

Foi com essa modificação dos novos tempos, que os engraxates sumiram da praça e perderam lugar para os “marreteiros” que vendem suas bugigangas sem nenhum alarde, ficam silenciosos esperando o freguês parar e começar a bisbilhotar suas mercadorias de segunda, terceira e até de quinta categoria.

O FALA MOÇO não existe mais, ficou um banco vazio na praça, não ouviremos mais suas gargalhadas e os sambas-de-breque do Germano Matias (antigo cantor) que imitava enquanto engraxava, fazendo um “batuque” com o pano no calçado do freguês. Quando terminava o serviço, levantava e fazia um rodopio agradecendo uma gorjeta que era oferecida pela sua simpatia e o belo “lustro”

Testemunha dos anos, de lá do banco quando não tinha “serviço” ficava com o olhar disperso parecendo atravessar as paredes da memória e do tempo, buscava coisas que não podia enxergar. Ia além delas. Atravessava ruas, cidades e oceanos, até tornar-se um menino de alguma cidade, pois sempre agradecia ao Prefeito, por permitir que trabalhasse vindo de outro lugar.

Com a passar do tempo, veio a bebida em sua vida e tudo se transformou, tornou-se um velho ranzinza e começou a mexer com as mocinhas que passavam em frente a sua caixa de panos e graxas. Assobiava fazendo gracejos, pois estava com umas pingas na cabeça, falava alguns palavrões, ferindo a suscetibilidade das meninas, o que causou sua retirada do local, através de um movimento dos motoristas de carros-de-praça (assim se chamava os taxistas de outrora). 

Enveredou-se para as ruas adjacentes trafegando pelos bares pedindo bebida e dizia que não tinha dinheiro para pagar. O dono para se ver livre do incomodo, dava uma dose e pedia para sumir do local.

Soube depois de algum tempo que morreu em uma noite de muito frio, na porta de um bar. Não deixou parentes, ou filhos; somente um banco vazio no canto da praça. 

Hoje, no final da tarde, por ali transitarão apressados pedestres, caminhando pela praça com uma sinfonia de pardais alegrando o entardecer. Lá do alto os sinos da catedral badalarão solenemente, convocando os fiéis para o culto religioso. Quem sabe alguma alma generosa solicitará uma prece para o infeliz engraxate. 

Foi-se o tempo, passou pela cidade um personagem daqueles tempos, o FALA-MOÇO, engraxate da praça da matriz.

 

 

ANTÓNIO VENDRAMINI NETO   -   escritor,cronista e poeta. Jundiaí, Brasil

 



publicado por Luso-brasileiro às 18:36
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