No século X, o monge francês Odilon Cluny iniciou uma série de rezas e festas sacras para os cristãos mortos, em 02 de novembro de cada ano, costume que se espalhou por outras religiões. As pessoas acreditavam que, rezando para os falecidos, nesse dia, os vivos diminuiriam os castigos das almas que pecaram durante a vida terrena. Após quatro séculos, a Igreja Católica oficializou a comemoração, instituindo o Dia de Finados ou Dia dos Mortos, que chegou ao Brasil pelos portugueses. Na ocasião, os templos e os cemitérios são visitados, os túmulos decorados com flores e milhares de velas acesas, aspectos que já se tornaram tradicionais.
A data nos convida a refletir sobre a morte. Constatamos que raramente nos detemos a meditar e nem mesmo a lembramos, embora se constitua em evento comum a toda humanidade, inevitável e certo. Efetivamente, é um dos poucos fenômenos acerca dos quais temos absoluta certeza: basta ter nascido para que se venha a morrer. Espelhando-se no que acontecia com o sexo, antes da revolução sexual, a morte se tornou um tabu e ao mesmo tempo em que está sendo cada vez mais banalizada em nosso país e as conseqüências deste quadro, geram uma situação de quase absoluto desprendimento.
Transformada em mera fatalidade biológica, as pessoas não se importam mais com a vida dos outros e ela passou a ser um evento quase neutro, revestido da aparência de mero espetáculo. Tanto que se assiste pela TV, a centenas de mortes por dia, numa visível demonstração de abandalhamento de princípios, que rendem exclusivamente, altos índices de audiência. O Direito consagra a vida como o mais valioso bem a ser protegido e impõe respeito aos mortos, tanto que considera crime a violação de sepultaras.
Apesar dessa circunstância, as pessoas ainda não tratam a morte como sendo rito de passagem, como deveriam entendê-la, tanto no aspecto religioso, como no moral, nem lhe outorgam as condições de dignidade exigidas por sua concepção jurídica. Tais constatações nos levam à melancólica conclusão de que a solidariedade está se exaurindo no ser humano, tanto na vida – dom maior de Deus -, como no final dela. Triste realidade...
DIA DA CULTURA
Em homenagem a RUI BARBOSA, nascido aos 05 de novembro em 1849, comemora-se nessa data no Brasil o DIA NACIONAL DA CULTURA, uma celebração de grande importância, principalmente porque em nosso país os aspectos culturais são colocados em plano extremamente secundário. Nessa trilha, invocamos Arnaldo Niskier - “...Características levantadas pelo professor Sérgio Werlang: a cultura preserva o passado e as tradições das pessoas; a cultura reflete os usos, costumes e a ética das sociedades; e a cultura gera felicidade em quem a aprecia. Com esses referenciais, conclui-se que a cultura é um direito de todos, não podendo ser apenas privilégio dos abonados. Cultura, qualquer que seja ela, clássica ou popular, classificação que, por ser limitadora, não tem unanimidade. Só se pode afirmar que a cultura merece o investimento, estatal ou não, pois ela é um instrumento para garantir retorno, irmã siamesa do que deve ser feito pela educação, hoje entregue ao Deus dará, em nível federal”(Revista TCMRJ- 04/2005- p. 78)
SITUAÇÃO ATUAL DO PAÍS
Diz o ditado popular que “quando uma estrutura está rachada, todo o prédio pode ruir”. Parece que este preceito retrata com fidelidade a atual situação de nosso país: a corrupção corre solta, atingindo elevados níveis e minando quase todos os segmentos sociais. E o que é pior: os que têm a força e o poder nas mãos acabam se esquivando por seus interesses pessoais e impedem quaisquer avanços em favor de uma sociedade mais igualitária e participativa.
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário. Presidente da Academia Jundiaiense de Letras (martinelliadv@hotmail.com).
Como já escrevi outrora que, na maioria das vezes, os temas dos meus textos são retratos dos momentos que tenho vivido, situações que tenho observado ou mesmo histórias das quais ouvi falar. Poucas são as vezes nas quais inicio a semana já com o texto definido nas minhas ideias. Prefiro deixar que a inspiração mais recente se aposse de mim e tome a forma que desejar tomar. Nessa semana, por sinal, foi o que se deu...
Como sói ocorrer com todos nós em algum momento da vida, tenho vivido algumas situações envolvendo pessoas que julgava serem de minha confiança, serem meus amigos, mas que se mostraram não merecedores do que de bom já em mim. Assim, sentimentos de traição, injustiça e tristeza acabaram ganhando espaço como inspiradores. Evito, contudo, externar em palavras todo esse turbilhão de coisas, pois sei que o tempo é o maior de todos os mestres e haverá de se encarregar de mostrar os erros e os acertos, inclusive os meus.
Sem a vontade de tocar em temas menos pesados, vivenciei um encontro um tanto inusitado e que renovou em mim sentimentos melhores. Eis que eu estava com alguns alunos e amigos em um barzinho próximo à faculdade onde trabalho, após um dia já passadas das dez horas desde que eu saíra de casa, quando um homem, nitidamente um morador de rua aproximou-se de nós e começou a falar.
Disse-nos que, se olhássemos para ele, provavelmente seriamos incapazes de saber que um dia, em um tempo no qual as drogas não o haviam destruído, ele foram alguém de posses e que também havia estudado, inclusive feitos duas faculdades, sendo uma de teologia. Disse que hoje estava irremediavelmente perdido, que era escravo do vício e por ele apaixonado, mas que já frequentara lugares luxuosos, já bebera vinhos caríssimos, frequentara altas rodas da sociedade. Tristemente, já dormira na rua, já bebera agua da chuva, bem como passara dias sem comer quase nada.
Olhava para o grupo, a maioria jovens, e dizia a eles que jamais caíssem na tentação de experimentar alguma droga que fosse, pois o futuro que lhes seria reservado teria a mesma face dele. Magro, sujo, mas falando de forma correta, ele dizia que se alguém quisesse fazer com ele uma reportagem, uma entrevista, ele teria disposição para contar a vida que teve e que perdeu.
Pediu-nos algo para comer, mas que não lhe déssemos dinheiro, pois ele o transformaria facilmente em pedras de crack. Comeu e bebeu ali mesmo o salgado e o refrigerante que lhe demos. Agradeceu a tudo com um sorriso no rosto e disse-nos que esperava que o exemplo dele pudesse servir para alguma coisa, bem como que éramos o primeiro grupo que lhe dava atenção. Antes de ir embora, dizendo àquele de nós que o ajudou com o lanche, que, se um dia precisasse de algo, nada lhe faltasse. Intimamente, senti uma fagulha sutil se acender na escuridão que começava a se apossar do meu coração.
Estranhamente, esqueci de perguntar qual o nome dele e o que ele fazia antes de estar ali, naquele resto do que aparentemente fora. Pena. Talvez pudéssemos fazer algo, talvez não. Ele, no entanto, mendigo, drogado, maltrapilho, fez por mim, pela minha fé nas pessoas. Fica, para mim, a lição de a ajuda pode vir de onde menos esperamos e que até o mais humilde de nós é capaz de nos ensinar alguma coisa...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo. - cinthyanvs@gmail.com
A mais célebre citação de Immanuel Kant, o filósofo com quem se pode concordar ou discordar, mas não se pode ignorar, é muito repetida em inúmeros ambientes. Ele escreveu: “Duas coisas preenchem a alma de uma admiração e de uma veneração sempre novas e crescentes, à medida que a reflexão a isso se aplica com mais frequência e constância: o céu estrelado acima de mim e a lei morar em mim… Associo-as imediatamente à consciência de minha existência”. Está no livro “Crítica da Razão Prática” e todo estudante razoável de filosofia a conhece.
São duas coisas destinadas a preencher a alma de admiração e veneração sempre novas e sempre crescentes, mas que estão em falta hoje em dia. A primeira, o céus estrelado. Raríssimo detectar alguma estrela no céu nublado ou envolto na densa camada de poluição das metrópoles. Evidência de escolhas erradas: o consumo de combustível fóssil levado ao paroxismo. Envenenamos o planeta e, aparentemente, não nos damos conta disso. De quando em vez surgem as estatísticas das enfermidades respiratórias derivadas do abuso na utilização de gasolina – de qualidade discutível – e do óleo diesel, que ainda é mais nefasto. O mundo todo fala em diversificação de matrizes energéticas, investe em carros elétricos, no uso da força eólica, das marés, do oxigênio, de outras energias produzidas a partir de substâncias neutras e continuamos a preservar cidades para carros. Será que já prescreveu o crime de acabar com as ferrovias para produzir a indústria do automóvel que, dentre outras características, é geradora de egoísmo e mortes a granel?
Mas é ainda mais grave a perda do sentido de “lei moral em mim”. O que é moral hoje para a maioria das pessoas? O que se ensina em termos morais para a infância e a juventude? Quais os ouvidos atentos para quem vier a perorar sobre comportamento irresponsável, boa conduta, ética e respeito à dignidade do semelhante? Entretanto a lição de Kant continua como advertência a uma civilização que parece ter perdido o rumo e tem dificuldades em retomá-lo.
Fonte: Diário de S. Paulo | Data: 27/10/2016
JOSÉ RENATO NALINI é secretário da Educação do Estado de São Paulo. E-mail: imprensanalini@gmail.com.
O romance “Os quinhentos milhões da Begum”, publicado por Júlio Verne em 1879, teve traduções para dezenas de idiomas, lançadas em numerosos países. A primeira tradução para nosso idioma foi lançada em Portugal ainda em 1879, por uma “Typographia das Horas Romanthicas”, que apurei ser a gráfica de David Corazzi, empresário cuja editora mais tarde viria a ser comprada pela Livraria Francisco Alves.
A primeira cena do romance é patética. O Dr. Sarrasin é um médico francês que está em Londres, participando de um congresso científico, quanto recebe a notícia inesperada de que é o único herdeiro de uma riquíssima princesa indiana, que lhe deixou nada menos que 500 milhões de francos, quantia fabulosamente elevada na época. Não vou contar o resto, para não estragar a leitura de quem ainda não leu...
A miragem de uma herança fabulosa e inesperada embalou e continua embalando sonhos e devaneios de muita gente.
Aqui no Brasil, há pelo menos dois casos judiciais que embalaram muitos sonhos. São os bem conhecidos casos das sucessões do Comendador Domingos Corrêa, falecido em 1873 (cuja imensa fortuna, constante de larguíssimas extensões de terra no Rio Grande do Sul e no Uruguai, até hoje é disputada por muitos milhares de pessoas que são ou se pretendem seus herdeiros) e do Barão de Cocais (José Feliciano Pinto Coelho da Cunha), falecido em 1869, que deixou uma fortuna muito grande aplicada num banco inglês e até hoje essa fortuna não foi retirada, embora esteja, teoricamente, à disposição das muitas centenas de seus herdeiros.
Ainda em nossos dias na França existem escritórios especializados, doublés de advocatícios e genealógicos. O mais antigo desses escritórios, o Étude Andriveau, está em funcionamento desde 1830. A especialidade de tais profissionais consiste em caçar herdeiros para fortunas jacentes (cfr. Fritz Utzeri, Franceses vivem de caçar herdeiros, "Jornal do Brasil", 2-11-1986).
Pela lei francesa, quando morre alguém sem herdeiros próximos, o direito de herdar se estende a parentes de graus muito afastados, às vezes remotos parentes inteiramente desconhecidos dos falecidos. Lá, as heranças jacentes devem ser administradas (como, aliás, também no Brasil) por um curador, durante um período razoavelmente prolongado, até que apareçam os herdeiros ou, não aparecendo eles, a herança passe para o domínio do Estado.
Então acontece que, quando morre alguém rico e não deixa testamento nem herdeiros conhecidos, esses escritórios se põem na caça dos herdeiros, levantando a árvore genealógica do defunto, e procurando ramos colaterais de sua família. Quando, afinal, localizam os herdeiros, evidentemente cobram caro seus serviços...
Cada interessado recebe, em sua casa, uma carta do escritório, dizendo que a equipe especializada daquele estabelecimento procedeu, por sua conta e risco, a laboriosas investigações genealógicas que habilitam o destinatário a receber uma herança de um parente desconhecido. Caso o destinatário tenha interesse, basta assinar um documento anexo, constituindo os advogados daquele escritório seus procuradores para o processo de inventário, e desde logo renunciando em favor do escritório a uma porcentagem sobre o total do valor dos bens herdados, à guisa de pagamento de honorários sobre a pesquisa genealógica (não sobre os trabalhos advocatícios, note-se). Somente depois de bem assinado e autenticado esse documento é que o escritório revela a identidade do "tio rico" desconhecido...
Para velar melhor o caso, alguns escritórios fazem o documento em termos que deixam o feliz recebedor de uma carta dessas ainda mais completamente no escuro. O texto a ser assinado pelo herdeiro prevê várias hipóteses: se o montante da herança for, por exemplo, de até 100 mil euros, o herdeiro se compromete a ceder ao escritório uma porcentagem bastante alta, de 50 % da herança; se o montante for maior, a porcentagem vai baixando gradativamente até 15 %.
Assim, o felizardo não tem condições de avaliar o montante da riqueza deixada pelo falecido, nem a quota que lhe cabe (pois podem ser muitos os herdeiros, e só o escritório tem o mapeamento completo deles); só lhe resta aceitar as condições propostas ou desistir da herança. A menos que queira ele mesmo se entregar a pesquisas genealógicas de incerto resultado. Mas como também não sabe quanto tempo faz que morreu o suposto ricaço, ignora se o prazo legal para a habilitação já está se esgotando, e ignora também o número de herdeiros... É pegar ou largar!
ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS, é historiador e jornalista profissional, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Ignoro como a moça conheceu o cidadão, que aparentava ser de respeito e de encantos por ela. Imaginou que compensara deixar a sua cidade às margens do Rio Tocantins para sair da miséria. Vinha de cidade em cidade, de casas “suspeitas”, de noites com tragédias, em busca de claridade e apreço. O primeiro homem que fizera florescer o seu útero assumira a criança e a colocara de lado. Com o moço seria diferente. Na faixa dos trinta e três anos, determinado, cursando faculdade para ascender socialmente. Em pouco tempo, ele se mudou para os três cômodos alugados por ela. E com o propósito de que se dedicasse mais aos estudos, coube à moça colaborar nas parcelas da escola, além do sustento da casa. Faxinas e “programas” se juntaram para dar conta das despesas. Ele se fez de paternidade com a filha dela e, sem que esperassem, o útero da moça floresceu mais uma vez. A criança dele completou três anos em paralelo ao término do curso universitário. A moça, em devaneio, se imaginava, ao seu lado, vestida de azul, na formatura. Valeria a pena o sacrifício.
Lamentável como a solidão, sentimentos e carências mal resolvidas fazem com que a pessoa perca a lucidez e navegue em direção de uma dor maior. É preciso ficar atenta à realidade, para não sangrar o coração.
Um pouco antes da festa, o indivíduo foi embora. Acreditou ser uma distância temporária. Nos silêncios dele, percebeu que não passara de um pedestal. Mas e a criança? Impossível que fosse indiferente à carne de sua carne, que acariciara desde o ventre materno.
Infelizmente, não existe crápula pela metade. Ignorou-a também.
A Justiça acertou a pensão. Tornou-se autônomo e reduziu o valor. Há dois anos que não paga o que deve e que a moça não consegue localizá-lo, a fim de entregar o endereço ao Fórum. Semana passada, de manhã, o avistou na Avenida Nove de Julho, bem penteado e vestido: calça e camisa social. Seguiu-o. Ao perceber que ela insistia, retornou irado, deu uma bofetada em seu rosto, tentou chutá-la e pisou em seu celular, com o qual ela o filmara. Parece-me que comercializa imóveis nas imediações.
Restou: a tela danificada do telefone, parte da filmagem e o sentimento esmagado da moça. Desejo que o próximo capítulo seja com ele de algemas. Talvez, perdendo esse tipo de liberdade que massacra as pessoas, se transforme de patife em ser humano.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE - Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.
Sônia Cintra com Lygia Fagundes Telles
A comemoração do 28º aniversário da Magna Charta Universitatum Observatory, fundada pela Universidade de Bolonha e pela Associação Universitária Europeia, em 1988, foi na Universidade de São Paulo, dias 20 e 21 deste mês. O Prof. Marco Antonio Zago, Reitor da USP, participou da intensa programação que reuniu representantes de diversas universidades. Dentre eles, Sijbolt Noorda, Presidente da Magna Charta Observatory e Francesco Ubertini, Reitor da Universidade de Bolonha.
A conferência de abertura, proferida pelo ex-Premier de Espanha (1982-1996), Felipe González, no Museu de Arte Contemporânea, abordou a crise da democracia representativa. A de encerramento ficou a cargo do ex-Presidente do Brasil (1995-2002) Fernando Henrique Cardoso, que discursou sobre a estratégia global, no auditório da Reitoria. A relevante conferência de Beatriz Paredes, Embaixadora do México, sobre Educação agregou valores sociopolítico e culturais à realidade atual da América Latina, e ressaltou o comprometimento da universidade com a sociedade e sua autonomia e independência de toda autoridade política e poder econômico, enfatizando a participação da mulher nas discussões e decisões em todas as instâncias e graus de escolaridade.
Resumidamente, os princípios fundamentais da Magna Charta Universitatum são: a universidade é uma instituição autônoma no coração das sociedades diferentemente organizadas por causa da herança geográfica e histórica, e se apoia na diversidade, através da pesquisa e ensinamentos comuns a todos. Ensino e pesquisa devem ser inseparáveis na vida universitária e ter liberdade dialógica, para atender às demandas sociais e aos avanços técnicos do conhecimento científico. Como legado da tradição humanista europeia, seu cuidado constante é o conhecimento universal, sua vocação transcende fronteiras e afirma a vital necessidade do saber das diferentes culturas.
No contexto do mundo atual, as universidades são mais importantes economicamente, politicamente, culturalmente e socialmente do que o foram antes. Os desafios que elas encontram são maiores, mais complexos e requerem que sejam mais fortes e unidas. Seus valores, reafirmados pela a Magna Charta Universitatum Observatory, que reúne assinaturas de cerca de 800 universidades de 85 países, podem ser sumarizados na liberdade para o exercício profissional e estudantil, com concomitante responsabilidade da sociedade.
SÔNIA CINTRA - ESCRITORA E PROFESSORA UNIVERSITÁRIA.
Pesa contra Igreja a acusação de ter condenado o físico italiano Galileu Galilei de maneira injusta. É importante, antes de tudo, esclarecer os fatos dentro do contexto da época, pois sem isso a interpretação histórica fica totalmente deformada.
Durante cerca de quatro séculos, por causa de uma divulgação distorcida e mau intencionada, anti-Igreja Católica, muitas pessoas, especialmente estudantes, pensam que Galileu foi um “mártir” da ciência e que a Igreja foi o carrasco e inimiga do progresso humano e da ciência. O caso Galileu ficou como se fosse o símbolo da rejeição, por parte da Igreja, do progresso científico, ou então do obscurantismo dogmático oposto à ciência. Este mito teve um efeito cultural imenso e fez com que muitos cientistas de boa fé aceitassem a ideia errada de que havia incompatibilidade entre a ciência e a fé cristã.
Por isso vamos examinar e resumir aqui este caso…
Na verdade, o processo de Galileu nem se tratou de um conflito entre ciência e religião, mas foi uma crise interna na Igreja.
Um Simpósio realizado na Universidade Católica de Washington, em 1982, a respeito do caso de Galileu, relatado pelo o repórter Philip J. Hills no jornal Washington Post em artigo transcrito pelo “Latin America Daily Post” de 5/10/1982, nos ajuda a entender melhor a opinião dos cientistas sobre o caso Galileu. O Simpósio foi denominado “Reinterpretando Galileu”. Entre outros astrônomos participaram do Simpósio Oven Gingerich, astrônomo de Harvard, o Padre William Wallace, dominicano da Universidade Católica e o polonês Joseph Zycinski.
Os intelectuais aí reunidos, revendo o famoso caso Galileu, do século XVII, destacaram o fato de que a tese heliocêntrica de Galileu não podia apresentar em seu favor razões convincentes na época; Galileu julgava que o fluxo das marés seria a prova da revolução da Terra em torno do Sol, quando na verdade se sabe que as marés se devem à força da gravidade da Lua. Sem argumentos sólidos a tese de Galileu só podia parecia errônea aos teólogos do século XVII, para quem o geocentrismo tinha não somente base científica, mas também autoridade incutida pelas páginas bíblicas (cf. Js 10,12s). É preciso, então, entender a atitude da repulsa a Galileu na época a partir das circunstâncias da época, e não em função de dados que só mais tarde foram definitivamente reconhecidos.
Os intelectuais fizeram vária afirmações contrárias à crença popular, entre elas:
Ainda o caso Galileu – EB (Parte 2)
Ainda o caso Galileu – EB (Parte 3)
Ainda o caso Galileu – EB (Final)
“Não havia simplesmente prova de que o modelo heliocêntrico de Galileu e de Copérnico fosse melhor do que o modelo popular geocêntrico demonstrado por Tycho Brahe. E o sistema da Brahe tinha a vantagem de não se opor à Escritura nem à doutrina da Igreja” (p. 94 deste fascículo).
Assim, pelos conhecimentos da época (disseram os intelectuais no Simpósio), houve justificativa para o processo, porque descobriram que Galileu desobedeceu às ordens da Igreja, e por acreditarem que Galileu não dispunha de elementos claros para demonstrar que o sol era o centro do universo. Disse ao astrônomo Wallace que Galileu acreditava muito bem que obteria finalmente provas cabais do sistema heliocêntrico. Mas na época do processo, quando contava cerca de cinquenta anos, Galileu sabia que não tinha argumentos para provar o seu ponto de vista.
Pretendia, portanto, abalar um grande edifício de ciência e fé, que durava vinte séculos (desde Ptolomeu!), sem ter razões convincentes. Com efeito, diz o articulista, Galileu tencionava provar sua tese a partir do fenômeno das marés: estas seriam devidas ao giro da Terra e às revoluções do nosso planeta em torno do Sol. Ora sabe-se que as marés não são causadas pelo movimento da Terra, mas pela força da gravidade da Lua. Os outros argumentos do cientista eram insuficientes para provar o heliocentrismo.
Para sermos justos temos que procurar entender os homens do século XVII a partir das premissas e dos referenciais que para eles eram válidos, e não a partir dos parâmetros que consideramos válidos hoje.
Galileu parecia especialmente inoportuno aos teólogos do século XVII pelo fato de que não se limitava a afirmar proposições de astronomia, mas introduzia-se no setor da exegese bíblica, tentando assim convencer os teólogos.
A oposição dos teólogos e do Sumo Pontífice à tese de Galileu não compromete a infalibilidade do magistério da Igreja, que se refere apenas aos temas de fé e de Moral.
Em 03/07/1981 o Papa João Paulo II nomeou uma Comissão de teólogos, cientistas e historiadores, a fim de aprofundarem o exame do caso Galileu. Esta Comissão estudou o assunto e, após onze anos de trabalho, apresentou seus resultados ao Papa. Este então, perante a Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano, proferiu um discurso, aos 31/10/1992, 350.º aniversário da morte de Galileu, em que reconhecia o erro dos teólogos contemporâneos a Galileu por parte do S. Ofício em 1633.
Mas ao mesmo tempo o Papa chamou a atenção para a dificuldade que os homens do século XVII deviam experimentar, para aceitar a tão revolucionária teoria de Galileu; era preciso que, de um lado, se fixassem novos critérios de hermenêutica bíblica e, de outro lado, a proposição heliocêntrica se corroborasse com argumentos ainda mais sólidos do que os que Galileu podia apresentar.
Para se inteirar ainda mais sobre este assunto, leia: Você conhece a verdade sobre o caso de Galileu Galilei?
FELIPE AQUINO - Escritor católico. Prof. Doutor da Universidade de Lorena. Membro da Renovação Carismática Católica.
No ano de 1571, os turcos atingiram o apogeu do poder e pareciam ter a cristandade nas mãos. Os seus exércitos estavam bem equipados e eram conduzidos por generais habilíssimos! Mostravam-se superiores à armada que os cristãos tinham para se defender.
Além de terem conquistado as mais belas províncias, também tinham por objetivo dominar a França e a Itália – transformando a Basílica de São Pedro em mesquita turca. O Papa Pio V governava a Igreja e estava aterrorizado com o perigo que ameaçava arruinar a própria civilização cristã.
Além de fracos, infelizmente os governos cristãos estavam muito divididos entre si. Intrigas, animosidades pessoais e ambições de cargos importantes impediam aquela união perfeita que se tornava tão necessária para resistir ao inimigo comum.
São Pio V, então, pôs toda a sua confiança no Rosário, trabalhando, ao mesmo tempo, incansavelmente por unir as forças cristãs. Por fim, deu ordem para que as suas armadas se organizassem para a batalha e, embora fossem inferiores aos turcos em número, equipamento, artilharia e navios, incitou-os a combaterem sem receio em nome de Deus e de Nossa Senhora.
As duas esquadras defrontaram-se no dia 7 de outubro e, para aumentar as dificuldades dos cristãos, o vento lhes era contrário; circunstância que, nos tempos de navegação à vela, podia tornar-se desvantagem fatal. Mas, obedecendo as ordens do Sumo Pontífice e colocando-se debaixo da proteção de Maria, a força cristã investiu contra o inimigo com ânimo admirável.
E, de súbito, o vento mudou, soprou com violência contra os infiéis e a batalha durou poucas horas, com total derrota da armadura turca. Tão completa foi a vitória que o poder do Islã ficou esmagado e salva a cristandade.
Durante esses terríveis dias e especialmente no dia da batalha, Pio V orava fervorosamente a Nossa Senhora do Rosário com fervor intenso, recorrendo assim à Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo. No momento da vitória, entrou em êxtase e teve a revelação de que os cristãos tinham vencido. Voltando-se para os que o rodeavam, o Papa deu a boa notícia e todos se ajoelharam para dar graças a Deus e a Nossa Senhora.
Soube-se depois que, no maior fragor da batalha, os soldados muçulmanos tinham avistado uma Senhora acima dos mais altos mastros da esquadra católica, que os amedrontava com seu aspecto majestoso e ameaçador.
Para recordar e agradecer pela vitória de Lepanto, alcançada em 7 de outubro de 1571, a Santa Igreja instituiu a festa de Nossa Senhora do Rosário. Prescrita primeiramente por Gregório XIII para certas igrejas, foi estendida por Clemente XI ao mundo católico, em ação de graças por um novo triunfo alcançado por Carlos VI da Hungria sobre os turcos em 1716.
Por isso, o dia 7 de outubro também é conhecido como dia de Nossa Senhora das Vitórias. E foi esta a primeira grande vitória do Rosário. Desde então, milhares de santos, bem-aventurados, apóstolos e missionários, tem espalhado essa devoção por todo o mundo.
E você, também gostaria de contribuir com a divulgação deste fato maravilhoso? Aproveite, então, para ler esta história e não perder as oportunidades que Deus lhe dá para evangelizar.
Dois jovens caminhavam por uma estrada e encontraram um grão de milho. Um deles, comentou:
– Tive uma idéia! Com este grão podemos ficar ricos! Plantaremos, nascerá um pé de milho e colheremos três espigas. Plantaremos as espigas e colheremos um pomar. Depois, plantaremos o pomar, colheremos uma roça e daí em diante ganharemos muito dinheiro!
– Excelente! - respondeu o segundo. – Agora, precisamos decidir o que faremos com a fortuna. Eu vou comprar um belo carro conversível e uma casa na praia; e você?
– Eu vou comprar uma caminhonete bem potente e um sítio. Só que tem uma coisa: não vou deixá-lo dirigir a minha caminhonete. Você é muito barbeiro e vai estragá-la.
– Tudo bem. Você também não vai passear no meu carro e muito menos dirigi-lo. Vou viajar por todo canto e você não vai comigo.
Após algum tempo de planos, discussões e troca de insultos, passou uma galinha e comeu o grão de milho!
Bem, o milho representa as nossas oportunidades e a galinha representa o tempo. Pense nisso, tire suas próprias conclusões e semeie um final de ano cheio de atitudes e vitórias na evangelização. Não sabemos ao certo qual é o nosso tempo aqui na Terra, mas sabemos que recebemos um grande presente de Deus por ainda estarmos vivos em 2016.
E o que faremos para retribuir tamanha graça? No mínimo, não deixar que a ‘galinha’ venha e coma o grão de motivação no serviço a Deus. Há muito que fazer, se tivermos consciência da proposta que a Igreja nos faz: sede cristãos e missionários!
Com Nossa Senhora do Rosário à frente, ninguém poderá atrapalhar as nossas grandes conquistas. Assim seja!
PAULO ROBERTO LABEGALINI - Escritor católico. Vicentino de Itajubá - Minas Gerais - Brasil. Professor doutor do Instituto Federal Sul de Minas - Pouso Alegre.‘Autor do livro ‘Mensagens Infantis Educativas’ – Editora Cleofas.
Ouvi, muitas vezes, meu pai dizer: que certa manhã, indo em direcção à Ribeira portuense, pela mão de sua mãe, ao atravessarem o tabuleiro inferior da ponte de D. Luís I, depararam, à saída do Porto, encostado à porta de ferro, que existe aberta no pilar de pedra, pobrezinho, que pedia esmola, por Amor de Deus.
Minha avó, que era muito caridosa, abriu a bolsinha de prata, e retirou dela um selo de correio, e deu-lhe de esmola, perante o espanto do filho, que na ocasião teria uns seis anos.
Sempre que escutava o episódio, e foram tantas vezes – os velhos gostam de contar e recontar factos passados, – custava-me acreditar que fosse possível: dar de esmola, um selo de correio!
Decorrido alguns anos, depois de ter concluído meus estudos liceais, vim a saber, que na Primeira Grande Guerra, a situação económica de Portugal, era tão desesperada, tão má, que nem moeda havia.
Então, Câmaras Municipais, assim como Juntas de Freguesia, Misericórdias… e até casas comerciais, resolveram emitir "dinheiro", em papel, para comutar a falta de moeda, de valor quase sempre, entre: um e cinco centavos.
As emissões eram “ clandestinas”, mas as cédulas circulavam livremente, e aceites, como se dinheiro fosse.
Embora só a Casa da Moeda pudesse emitir dinheiro, a escassez era tanta, que os “obrigava” a imprimirem pequenos rectângulos de papel, a que davam determinado valor.
Algumas cédulas eram artisticamente trabalhadas, como se tratasse de dinheiro verdadeiro.
Em 1924, o governo tentou proibir a circulação das cédulas, mas só após a revolução de 28 de Maio, é que começaram a desaparecer definitivamente, com emissão, em massa, de moeda, de pequeno valor.
HUMBERTO PINHO DA SILVA - Porto, Portugal
É um poema declamado que acorda memórias dos nossos ente queridos e amigos que partiram antes de nós nesta altura que mais nos convida a refletir sobre esta única certeza na vida.
Ouça e veja este poema aqui neste link:
http://www.euclidescavaco.com/Poemas_Ilustrados/Petalas_de_Saudade/index.htm
EUCLIDES CAVACO - Director da Rádio Voz da Amizade , Canadá.
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Horário das missas em, Jundiai ( Brasil):
Horário da missas em São Paulo:
Horário das missas na Diocese do Porto( Portugal):
http://www.diocese-porto.pt/index.php?option=com_paroquias&view=pesquisarmap&Itemid=163
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ACABA DE SAIR
"Leva-me Contigo, a senhora S & outras histórias"
de
REMISSON ANICETO
Publicado pelos competentes Tonho França e Wilson Gorj (Editora Penalux, 220 páginas, 14×21 – R$ 40,00), apresenta 23 contos e crônicas numa linguagem leve, fluida e emocionante.
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O Papa João Paulo II organizou o primeiro Dia Mundial de Oração pela Paz em Assis na Itália em 27 de outubro de 1986 e a partir de então essa data se caracterizou como de preces para que o mundo viva pacificamente e se paralisem conflitos e guerras. A celebração tem uma concepção ecumênica, reunindo elementos de diferentes raças, culturas e tradições religiosas para rezarem em conjunto e compartilharem esperanças de dias melhores.
Já se disse que a oração é a comunicação e o fruto consciente do relacionamento com Deus durante a qual alguém louva, agradece, intercede pela vida de outro, pede bênçãos a ele ou a terceiros. Através dela se desfruta da presença do Criador, a quem é dirigida, podendo se efetivar de vários modos, em voz alta, falada, em canção ou em silêncio. Por isso que se afirma que orar é um ato ou um gesto de fé, passado de geração a geração.
Façamos um convite a nós mesmos: inspirados por esta comemoração também nos silenciemos por alguns instantes e oremos. Por meio de rezas poderemos compreender que a palavra divina é a que ensina, reconforta e traz esperança, revelando-se nas mais diversas formas, tais como um sorriso infantil, a emoção de uma descoberta, um instante de reflexão, os gestos comuns, a liberdade, a luta por igualdade, o respeito ao próximo e principalmente, a partilha.
A maioria das pessoas tem consciência desses atributos, mas por comodidade e apego material, adapta os ensinamentos religiosos aos próprios interesses. Interpretam-nos de acordo com tudo que lhes convém, modificando a essência clara e extremamente nítida dos princípios e pregações. Pratica uma auto religião, simula atos caridosos e tenta enigmaticamente esconder-se do remorso que a persegue. É por isso que o mundo se encontra moralmente tão instável e frágil, no qual o predomínio de uma cultura consumista, obediente a ditames exclusivamente econômicos, vem sufocando a espiritualidade e esfriando a convivência humana.
Rezemos para que o mundo seja mais fraterno e solidário, para que se evitem guerras e confrontos até de natureza religiosa e para conseguirmos manter uma postura digna diante dos percalços da vida. George S. Patton afirmou: “Aqueles que rezam fazem mais pelo mundo que aqueles que lutam; e se o mundo vai de mal a pior, é porque existem mais batalhas do que orações”. Aliás, Dom Paulo Evaristo Arns disse, com muita prioridade: “O nome de Deus é justiça e a finalidade da convivência humana é a paz duradoura”.
DIA DA DEMOCRACIA
Comemora-se a vinte e cinco de outubro, o Dia da Democracia. Resultado da própria concepção grega, ainda que em não em sua abrangência absoluta, ela pressupõe igualdade, ou seja, as leis devem valer igualmente para os cidadãos em geral, impossibilitando-se alguém de obter privilégio diante das mesmas. Assim, revela-se num sinônimo de isonomia, ou seja, todos indistintamente são iguais no exercício das aspirações civis, políticas, econômicas, sociais e culturais. Requer o acesso da população integralmente, em idênticas condições, aos direitos fundamentais básicos.
BREVE REFLEXÃO
Celebra-se também a vinte e cinco de outubro o Dia Internacional Contra a Exploração da Mulher. “AS MULHRES DEVEM FAZER PARTE, NÃO ESTAR À PARTE” (Z. Almabert)
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário. Presidente da Academia Jundiaiense de Letras (martinelliadv@hotmail.com)
Encontros de amigos recentes têm a tônica da alegria ingênua, desprovida ainda de decepções que só o bom e velho Senhor Tempo, travestido de oportunidades as mais diversas, sabe aplicar.
Entre um copo disso, uma porção daquilo, risos fartos, piadas bobas e infames trocadilhos, acontece às vezes de estagnarmos abruptamente à vista de um rosto que remonta a antanho.
Assim se passou.
Eu narrava a história da minha mais recente invenção culinária: folhas, frutas, croutons, sementes e molhos, e a forma constrangedora como foi recebida. Admito o aspecto inusitado, mas, o melhor estava por vir – o sabor!
Acontece que a visão do passado, personificada no amigo dos tempos de ensino médio, entornou o caldo.
Fiz uma salada em que a salada, motivo pelo qual eu me exibia, já não tinha a relevância de há pouco, e a graça se perdeu entre um ingrediente e outro.
Levantei-me, e mal me aproximo do casal, desculpando-me de pronto pela interrupção, sou recebida com aquele abraço. Abraço que só o bom e velho Senhor Tempo, travestido de experiências as mais diversas, nos ensina a dar e receber: apertado de memórias adolescentes, tingido de ralos brancos nos cabelos outrora negros de ambos.
Fica um vácuo nessas horas, não fica? Nem a balbúrdia do recinto, nem a expectativa dos acompanhantes, nada, absolutamente nada faz com que o mundo torne a girar. Até que de novo e inevitavelmente ele gira. E a gente pensa: “caramba, quanto tempo!!!”.
Mas, assim como nos aproximamos, despedimo-nos. Não sem inúteis tentativas de adiá-lo: “tudo de bom”, “pra você também”, “feliz natal”, “é... e ano novo também”, “então”, “então”... “tudo de bom”, “pra você também”.
Salada e nostalgia à parte, amizades me trouxeram tanta dor nos últimos tempos que, às vésperas dos festejos de fim do ano, eu me fizera uma promessa: não mais fazê-los – amigos.
Os que ficaram, teriam ficado. Os novos... bom, aos novos eu não me entregaria mais do que no momento presente, sem expectativas e sem envolvimento.
Aí eu tive essa visão. E a certeza de que não tem como a gente se livrar de amigos. Mesmo aqueles cujas relações o senhor Tempo desfaz vão sempre conosco. É impossível viver sem eles, longe ou perto.
VALQUÍRIA GESQUI MALAGOLI, escritora e poetisa, vmalagoli@uol.com.br / www.valquiriamalagoli.com.br
Manhã de terça-feira. Ao estacionar, reparei a perua, desgastada pelo tempo, repleta de sucata. Papelão e plástico era o que mais se via pelos vidros empoeirados. O proprietário se achava na calçada, diante da lixeira do prédio residencial requintado, abrindo, com respeito, os sacos de lixo. Observava se havia algo que pudesse ser útil ao seu labor. Em seguida, os colocava da mesma maneira que encontrara.
Ao passar por ele, me saudou com um “bom dia” cauteloso. Notei que não me era estranho. Considero-me, e não é de hoje, com uma memória limitada para o “de onde o conheço”, mas guardo fisionomias. Já passei por muitos lugares na área profissional e também como voluntária e isso me embaraça as origens da convivência.
Retornei logo e ele me deteve. Desejava saber se o identificara. Disse que sim, mas não atinava de que passagem. Respondeu-me que da cadeia. Foram 21 anos de visita aos presídios através da Pastoral Carcerária. Alguns deles e algumas delas revi nas ruas, de volta aos cárceres e em situações diversas. E é muito bom ouvir testemunhos quando conseguiram se fortalecer e escolher o bem. Como dizia uma autoridade, assim que foi retomado o trabalho da referida Pastoral na Diocese de Jundiaí, no início de 1993: “Só se diminui a violência na transformação do violento”.
O moço da perua me relatou que, em um dos dias de nossa ida à cadeia, na despedida, olhei-o nos olhos e lhe falei: “Fique com Deus”. Espantou-se. Como ficar com Deus, ele que mergulhara no submundo do tráfico e, pelas horas vagas, dentro da cela, planejava o retorno e outras maneiras de diminuir os riscos de prisão. Como ficar com Deus? E essa pergunta se fez, pelos anos seguintes, na penitenciária para a qual foi transferido.
Ao receber o benefício do regime aberto, decidiu não mais se envolver com o ilícito. Desejava, ardentemente, ficar com Deus. As chances de inserção no mercado de trabalho seriam remotas pelo atestado de antecedentes criminais, pela baixa escolaridade e falta de formação profissional. Enxergou no comércio de sucatas a sua chance. Primeiro fez isso com um carrinho de mão. Agora tem a perua. Nem sempre é fácil encontrar o que vender, porém é observado sem riscos de algemas.
E eu tenho muito a agradecer ao Senhor por ter me colocado em meio aos excluídos, pois me ajudam a sair de mim para escolher o Céu.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE- Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.
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