Certa ocasião, Helena Sacadura Cabral, declarou ao: " Diário de Notícias": " Em Portugal há uma longa tradição de murmúrio. De inveja. De cobiça e de preguiça também. Os valores raramente são reconhecidos e os mais inteligentes constituem o repasto ideal para a calúnia."
Se no início deste século era assim, segundo a escritora, não foi muito diferente nos séculos passados.
Hoje todos homenageiam Camões, como o maior poeta da nossa língua portuguesa, que narrou, nos " Lusíadas", a extraordinária epopeia dos descobrimentos.
Mas, como o reconheceram no seu tempo? Como o trataram e admiraram-no?
Morreu pobre. A magra pensão que lhe concederam, era tão insignificante, que mal lhe dava para sobreviver.
Diogo Couto, em 1567, encontrou-o em Lisboa, " Tão pobre que comia de amigos.", que lhe davam a roupa que necessitava.
Conta Almeidas Garrett, pela boca do Telmo, no: " Frei Luís de Sousa": "Lá foi Luís de Camões num lençol para Sant'Ana. E ninguém mais falou nele”.
E mais adiante, à Maria: " Livro sim: aceitaram-no como tributo de um escravo. (...) Acabada a obra, deixaram-no morrer ao desamparo, sem lhes importar, com isso.... Quem sabe se folgaram? Podiam pedir-lhes uma esmola, escusavam de se incomodar a dizer que não."
E D. Francisco Manuel de Melo, no " Hospital das Letras", escreveu:
- " De nós todos se poderá queixar, porque sendo honra e gloria de Espanha, tão mal tornamos por ele, que, se não poucos o leem, são menos os que o entendem."
Certa ocasião ao folhear o meu diário, deparei com a triste noticia que o notável intelectual, Lopes de Oliveira, após ter oferecido a valiosa biblioteca à cidade de Fafe (mais de cinco mil volumes) foi convidado a residir nessa localidade.
Vive ou vivia, sozinho, cozinhando e dormindo em velha casa, infetada de ratos, receando que os roedores lhe devorem os livros. - "O Comércio do Porto", 14/12/90.
Apetece-me dizer como António Nobre: " Que desgraça nascer em Portugal" – "SÓ".
HUMBERTO PINHO DA SILVA
São muitos os que se indignam - e com razão, - da exploração de crianças, no mundo do trabalho; e poucos os que se preocupam com os chamados meninos-prodígios, que tantas vezes são tratados, pelos progenitores, como verdadeiros escravos.
Sei que me vão dizer ou pensar: São " vitimas" da Arte. Trabalham pelo prazer e pela vaidade.
Mas quantos não puderam nem podem brincar, porque os pais os obrigaram e obrigam a treinos constantes, para estarem aptos a participarem em competições desportivas, artríticas ou teatrais?
Passam e passaram noites mal dormidas, percorrendo feira em feira, circo em circo até altas horas, angariando dinheiro aos progenitores.
Recordo a ginástica Nadia Comannecci, que alcançou importantes medalhas nos Jogos Olímpicos, para seu País podesse orgulhar-se da conquista de medalhas de oiro. Mas a que preço? De constantes sacrifícios, treinos forçados e infância perdida.
Lembro-me, de Saul e do notável futebolista - hoje multimilionário, Cristiano, que iniciou a carreira na Madeira, aos nove e entrou no Sporting. aos onze, sendo titular aos dezassete anos.
E também do extraordinário Lionel Messi, que começou a fulgurante vida de futebolista aos sete e aos treze foi para Barcelona, sendo titular aos dezasseis. Dir-me-ão: jogar a bola não é trabalho; trabalho é explorar os menores, para ajudarem os pais nas lidas domésticas ou nas tarefas agrícolas e oficina.
Não decorreu ainda uma década - penso eu, - que jornalista surpreendeu rapazinho, em plena serra transmontana a guardar o rebanho paterno.
Levantou-se a mass-media, indignada - criança de tão pouca idade devia estudar e não ser pastor!
Tratava-se de filho de agricultores remediados, que frequentava a escola secundária, mas por gosto, em horas de lazer, subia à serra com o gado do pai, para recreio. O problema é que a pastorícia não é Arte, mas trabalho, portanto - exploração infantil,
Crime é o comerciante levar o filho para a loja, no intuito de o coadjuvar ou o lavrador solicitar ajuda ao filho, nas labutas agrícolas. Porque o menor não pode nem deve trabalhar, asseveram os políticos e certos intelectuais.
Até 1841 era permitido as crianças trabalharem em todo o mundo. Depois foi proibido, em França, ou melhor: só podiam trabalhar com mais de oito anos!"...
Em Portugal, só no reinado de D. Carlos é que se levantou a questão do trabalho infantil.
No nosso tempo, na maioria dos países, o trabalho infantil está proibido, embora ainda se pratique em alguns, mas ilegalmente.
Os nossos velhos diziam (com razão?)" O trabalho do menino é pouco, mas mais louco é quem não o aproveita. Claro que só executavam – penso eu, - nessa época e na nossa terra, tarefas de acordo com idade. Caso contrário seria a crime.
Humberto Pinho da Silva
A Bíblia é, como se sabe, o livro mais vendido do mundo e, o mais traduzido, editado em todas as línguas e numerosos dialectos.
Infortunadamente muitos cristãos mal a conhecem, mormente os católicos. Muitos são, porém, os que a compram em edições monumentais ou nas reproduções mais modestas.
Compram-na para proclamar, ufanamente, que a possuem, mas permanece, eternamente, bem alinhada com outros tomos, nas prateleiras da biblioteca doméstica.
A Igreja Católica recomenda a leitura – pelo menos o Novo - Testamento, – diária, durante 15 minutos. Recomenda, porque quem a não lê, desconhece, quase completamente, quem é Jesus, e Sua doutrina.
A Bíblia é, e será sempre, o melhor manual de instrução do crente; o guia por onde pauta sua vida.
Felizmente os nossos irmãos separados – da Igreja Católica, não de Cristo, – como frequentam, desde a infância, as aulas dominicais, são em regra, mais conhecedores e, muitos sabem de cor, as passagens mais importantes para a vida quotidiana do crente.
Não admira, portanto, que não falte quem assevere que Deus disse e quer, o que na verdade nunca disse nem quer.
O Observatório da Solidão do Centro de Investigação e Intervenção Interdisciplinar do Instituto Superior de Ciências Empresariais e do Turismo (ISCET), realizou recentemente sondagem (400 pessoas contactadas, que é numero bastante escasso,) para conhecer como os portugueses vivem a quadra natalícia.
Segundo o estudo 60% não pratica nem frequenta Igreja cristão
76% - Considera que é o meio de fomentarem consumo.
62% - Pensa que o Natal é uma festa religiosa.
94% - Faz ceia de Natal em casa com a família.
1% - Passa a consoada fora da residência – restaurantes.
86% - Faz árvore e presépio.
32% - Aproveita para se ausentar, de férias
Destes: 45% - São jovens, e 53% pessoas de idade.
Quase todos os contactados consideram o Natal como festa de família
Saberão que é comemorado o nascimento de Jesus? Talvez saibam, mas não dizem...
Se o estudo fosse realizado décadas atrás, talvez o resultado fosse bem diferente. A entrada de imigrantes, em grande numero, com tradições, costumes e gastronomias diferentes e, das mais diversas religiões, tem provocado notáveis alterações nos hábitos, e levado, principalmente as camadas mais jovens, à apatia pelas tradições natalícias.
HUMBERTOPINHO DA SILVA
Compareceu no Conservatório de Lisboa, frágil e deprimida rapariguinha, que vinha prestar prova da admissão.
Diante do ilustre júri, a garotinha, enfiada, permanecia constrangida, contrafeita, estática e de olhos assustadiços.
Nervosamente balanceava as vestes, como as quisesse compô-las, numa tremenda ansiedade.
Condoído pelo inopinado acanhamento, o júri, sussurra-lhe, em voz amiga:
- " Diga, por favor, um poema..."
Enrubesce de pejo, a menina, e erguendo a custo os embaciados olhos:
-" Não me recordo de nenhum..."
Compassivos, insistem, amaciando ainda mais a voz:
- " Pequeno texto, que goste. Qualquer coisa que conheça de cor:
-" Não me lembro de nada..."
Proferiu em voz apertada, temendo e tremendo, mormente os irrequietos bracitos.
Estupefactos perante o inesperado acanhamento, o júri já pensava vedar-lhe o ingresso, quando...
Mirando pensativo a rua, de olhar vago, olhando através da vidraça da janela, o dramaturgo Dom João da Camara – membro do júri, – presenciava, apreensivo, e em silencio a cena deplorável.
Acerca-se da retraída menina, e movido de comovida compaixão, enternecido, sugere:
- "Menina: diga a Avé – Maria..."
Empertiga-se a jovem, perfilha-se, enrija o peito, e em tom forte e sonoro inicia a invocação.
Foi a mais comovedora e terna invocarão à Mãe do Céu, que jamais se ouvira.
O escritor, poeta e dramaturgo, descendente do conhecido navegador João Gonçalves Zarco, num gesto de singular bondade, conseguiu que a inesquecível atriz Maria Matos, pudesse matricular-se no Conservatório.
Não devo terminar a crónica, sem contar a mais sublime faceta da atriz – a gratidão:
Em missiva, (*) datada a 28/06/1910, depositada na posta de Castelo Branco, endereçada a sua mãe, a Senhora Dona Emília da Camara Almeida Garrett, amiga de Maria Matos, escreveu:
(...) A atriz está aqui em "tournée" e parece-me muito atilada (baseava-se na conversa que teve, em sua casa, com Maria Matos,) e confessou-me, que sempre possível passa pelo cemitério, onde repousa Dom João da Camara e, junto do tumulo, reza e pede-lhe conselhos.( Cito de cor.)
Maria Matos era de sensibilidade delicada e nunca olvidou quem lhe facilitara a fulgurante carreira artística.
*) Carta que minha querida amiga Dona Maria Eugénia da Camara Rebello de Andrade, neta do escritor, teve a gentileza de ma ler.
HUMBERTO PINHO DA SILVA
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