Regressando a um hábito remoto, atravesso, a bordo de uma balsa, as águas que me levarão ao outro lado de um resultado incógnito.
Desenham-se ideias e intenções, mas, ao longo, acabam se desviando, pegam um atalho aqui, outro ali...
Procurarei não interromper a viagem para dar um mergulho em alto-mar, embora isto tantas vezes me tente.
O que me parece claro e seguro quando faço uso de um instrumento praticamente essencial, neste momento ousa escapar de minha mente, como se necessitasse do tal apoio extra-humano; como se caneta e papel estivessem mais próximos do humano e eu ficasse exposta a mim mesma.
A ausência de uma máquina que carrega anos de trabalho, obriga-me a abrir mão de teclado, consulta a dicionários e pesquisa via internet. Enquanto ela dista de minhas mãos e vista, recordo como se dá o velho e bom exercício de fazer nascer um texto sem mensurar tamanho ou calcular número de caracteres.
O delicioso e estranho labor prova-me que minha crença – ou sensação?! – é um mito.
A bordo de um computador, embora conte com a facilidade da internet e com as ferramentas nele dispostas, constato que raramente deixei de utilizar livros, revistas e demais suportes físicos para destrinchar o assunto escolhido. Até mesmo a escolha do tema muitas vezes passou longe do campo virtual. Além destes amigos reais, com os quais compartilho tato, olfato e visão, há, ainda, aquilo que não é possível tocar, mas comumente me auxilia: meu pensamento, com experiências de vida, empirismo, visões de mundo, subjetivismo... criando, num vai e vem, um resultado. Pode ser o início de um outro pensamento, o nascimento de algo oculto, que se não estimulado assim, permaneceria às escuras.
Faço uma pausa.
Releio o que se teceu acima. Com a diferença de que não há uma tecla para deletar ou corrigir o que parece ser necessário.
Rabiscos e letra rascunhada são sinais de que preciso passar a limpo o texto, visualizá-lo, compreendê-lo.
A balsa seguiu seu itinerário e me vejo chegando ao destino.
Antes de atracar, reconheço-me nesta busca, primitiva e fantástica como as missivas que escrevi na pouca idade ou as poesias que brotaram em cadernos exaustivamente manuseados e guardados naquela gaveta preferida.
É com este espírito que faço nascer mais um texto e o divido agora, colocando os pés em terra firme.
Renata Iacovino, escritora e cantora, reiacovino.blog.uol.com.br/reval.nafoto.net/ caju.valquiriamalagoli.com.br
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