Tudo bem que janeiro é um mês de chuvas, mas acho que já deu. Ok, quem sou eu na ordem do universo para determinar o fim de qualquer coisa, mas da minha parte, pelo menos, no que me diz respeito, já choveu muito.
Óbvio que, se eu pudesse, mandava essa água toda para os lugares onde a seca está castigando não somente as lavouras e os animais, mas também as pessoas. Contudo, também é óbvio que não tenho poder de redistribuir esse tipo de recurso. No máximo, redistribuo moedas entre minha carteira e porta-moeda. Ou seja, já que não posso mandar água para onde não tem, tenho ao menos o direito de dizer que estou um pouco cansada de tantas chuvas.
Não é que eu não goste de chuvas. Nada disso! Para aplacar a seca, para molhar as plantas, para lavar a alma e a sujeira, para embalar um soninho na cama ou no sofá em tardes preguiçosas, é sempre bem-vinda. Só é complicada quando complica o trânsito, quando dificulta a vida de quem tem que sair e chegar, de quem queria fazer caminhadas, de quem queria passear um pouco e até de quem queria tirar o branco bolor do corpo.
Claro ainda que tudo isso não é nada perto de quem perde tudo com as chuvas excessivas. Todos os dias somos bombardeados com notícias de alagamentos, desmoronamentos, mortos e feridos. Tudo bem que muito de tudo isso é culpa da ação humana, mas, mesmo assim, não dá para fechar os olhos e ficar alheio a tudo isso.
Além das questões sérias, há também aquelas menores, de caráter mais egoístico. Tanta chuva dá um pouco de tédio e de desânimo. Fiquei esperando as férias para fazer caminhada, mas isso agora só se for algo meio triatlo, ou seja, ao menos uma etapa na água. Eu ia consertar minha bike, mas depois de algum estudo, concluí que os ajustes para um veículo anfíbio ficariam um pouco caros e achei melhor deixar para lá.
Com esse tempo esquisito, além do mais, fica difícil achar o que fazer nas poucas e já se findando horas vagas. A opção seria comer, mas não queria desperdiçar todo meu esforço de restringir guloseimas em troca de uma satisfação momentânea e perigosa, afinal, não penso que alguém esteja imaginando que me refiro a ficar em casa, com chuva comendo alface ou torrada de água e sal. Só faria algum sentido e graça se fosse algo como um bolo de cenoura coberto com chocolate, mas isso, o Ministério da calça apertada não permite.
Durante a semana, é água para todo lado, entre um período de trabalho e outro. Além do mais, acho que essa chuva está me levando para outra dimensão, porque dia sim e dia não falta luz em casa. Como não concebo que isso aconteça em plena capital paulista, a única explicação é a de que a chuva transporta minha casa para algum lugar no passado, lá para época dos lampiões e fogões a lenha. Na última vez, depois de oito horas sem luz, comecei a temer que o portal tivesse se fechado, deixando-me para sempre no passado...
Enfim, podem me chamar de chata, ranzinza, mas essa chuva toda já me irritou. Estou em negociações com São Pedro, tentando conseguir alguns diazinhos de sol e céu azul, mas tá difícil. Desconfio, por fim, que ele não está mais lavando a casa, mas está mesmo é vertendo lágrimas...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA- Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo
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