Um crucifixo ficou intacto. Ao lado de escombros e de centenas de mortos, o sacrifício de Cristo torna-se, mais uma vez, símbolo que salva, que resgata, que anima. É apenas um símbolo. Mas como viver sem símbolos? Tudo, em questão de comunicação, é símbolo. Há símbolos insignificantes, há símbolos fortes. Há símbolos que assustam, há símbolos que restituem a esperança e impulsionam à reconstrução do ser. Um crucifixo não é símbolo de morte, mas aponta para a ressureição, a vida feliz que não terá fim. Cristo, o amor de Deus que se fez pessoa, venceu a morte e proclamamou, com a sua páscoa, que a última ação da existência humana não é o aniquilamento do ser, mas a vida que se perpetua, apesar dos sinais de morte e de destruição, que são sinais frágeis, embora impresionantes. São mais frágeis que os sinais da vida, que, mesmo na terrível tragédia, vibram e conseguem trazer sorriso, como o sorriso da médica que fez, num hospital de campanha, o parto de quatro crianças, entregando-as ao abraço caloroso de suas mães que logo as amamentam.
A receber a terrível notícia da tragédia do Haiti e do falecimento de sua irmã Zilda, o Cardeal Paulo Evaristo Arns, no alto de seus quase 90 anos de vida e 65 de Apóstolo de Jesus, terminou suas poucas palavras com a eloquente expressão: Não é hora de perder a esperança. São palavras que só podem sair dos corações que entendem a dignidade da vida, creem em Deus que é amor e compreendem com extadião o valor do ser humano. Não é hora de perder a esperança, pois a ressurreição de Cristo, reluzente no crucifixo que ficou de pé, ao lado do espaço onde tombaram Zilda Arns e centenas de outras pessoas, se faz viva na força da Pastoral da Criança e da Pastoral da Pessoa Idosa, que prosseguirão seu caminho de solidariedade, de amor. A ressurreição de Cristo, acontecida no simbólico terceiro dia, se faz evidente no festival de solidariedade que estamos assitindo pelo mundo inteiro, unido para socorrer e para reconstruir o Haiti. Maravilhas do amor de Deus que, como semente do Verbo presente nas várias culturas, vai despertando a humanidade para os verdadeiros valores, os únicos pelos quais vale a pena viver e por eles, se necessário, dar a própria vida.
Certamento o sinal do crucifixo intacto pesa na consciência dos derrotistas, e até mesmo dos que não creem, pois mesmo desprezando tais sinais religiosos, nunca poderão admitir que não houve, entre tanta destruição, um símbolo sagrado, forte para a maioria das pessoas. Ao menos a lógica lhes poderá socorrer.
Não há dúvida que os sinais de vida, que surgem entre os mortos e os símbolos de doação sacrifical e de ressureição que se erguem como num milagre no meio da tragédia, aninham esperança no coração, unem rostos sofridos, criam força para a reconstrução de tudo. Isto é possível pela fé na vida, pela esperança de dias melhores e pela caridade que tudo resolve. Estas são lições de Cristo, o mesmo que morreu tragicamente numa cruz, mas que venceu a morte, ressuscitou, vive para sempre e continua trazendo vida para as pessoas, e afirmando ainda hoje: Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundânica.
Vivam a fé, a esperança e a caridade! Viva a vida que vem de Deus e para ele voltará, pois somos dele e isto nos basta. Eis a mensagem viva do crucifixo intacto, eis a lição do Haiti.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo de Juiz de Fora
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