“A corrupção é o mal que exaure a dignidade e a cidadania dos povos, drena a riqueza das nações e desvia recursos que proporcionariam o bem-estar e o processo de todos para o bolso e privilégio de alguns poucos” (Paulo Adib). O nosso país é um dos mais tolerantes do mundo com práticas desta natureza, que são constantes e infelizmente, perdem-se no espaço e no tempo da impunidade e morosidade da Justiça brasileira.
A ONG “Transparência Internacional” divulgou no dia 17 de novembro de 2009, seu relatório anual de percepção de corrupção no mundo, para servir de base a reflexões durante a comemoração do Dia Internacional Contra a Corrupção, celebrado a 08 de dezembro. O ranking reúne 180 países, classificados em um índice de
A corrupção é um problema mundial, verificando-se em todos os níveis, dos pequenos delitos diários aos grandes desvios financeiros no poder público e privado. Tanto que se estima que ela propicia um movimento superior a US$ 1 trilhão por ano em todo o planeta. Entretanto, em nosso país, face à impunidade e a morosidade do Poder Judiciário, ela é desenfreada e infelizmente, manifestamente tolerada pela população.
Como muito bem acentuou Paulo Adib, “a corrupção generalizada, cínica, quase inconsciente e de uma crueldade sem limites, é considerada uma praga. A tese de que as pessoas são susceptíveis a ceder a alguma forma de corrupção já foi defendida em congressos mundiais de psiquiatria. Ives Pelicier disse que “tudo está à venda e é uma questão de preço, de mercado e de oportunidade”. A ganância é a principal motivação, bastando esperar o momento ideal. Entende que isso é um fenômeno humano que em alguns momentos assume um caráter patológico. O psiquiatra Allan Beigel reconhece que a corrupção exerce uma fascinação mórbida sobre as pessoas. Essa fascinação é reconhecida também por outros psiquiatras que acham “que existe muita gente que se sente frustrada por não ter a astúcia de um corrupto”. Seria uma “massa imensa, desonesta e silenciosa”. A Fundação Getúlio Vargas, por exemplo, já calculou que, se a corrupção fosse reduzida em 10% no Brasil, o Produto Interno Bruto (PIB) aumentaria em R$ 50 bilhões ao longo dos próximos dez anos (“Correio Popular”- 06.09.2009- A-3)
O livro “A Cabeça do Brasileiro” de autoria do sociólogo Alberto Carlos Almeida, escrito a partir de uma pesquisa que captou os “core values” (valores enraizados) da sociedade brasileira, demonstra que quanto mais baixa a escolaridade, maior a aceitação das práticas corruptas, que não existem, portanto, por culpa exclusiva de uma elite política perversa, mas são aceitas por amplos segmentos sociais. A referida obra literária mostra ainda que a educação é o grande corte social e ético do Brasil: os 57% de brasileiros que têm até o ensino fundamental são mais autoritários, mais estatísticas revelam menos valores democráticos; à medida que a escolaridade aumenta, os valores melhoram – o que, prova, segundo o autor, que a educação é a principal matriz a transmitir valores republicanos às pessoas.
Em nível internacional, existe a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Uncac, na sigla em inglês), em vigor há quatro anos, tendo em pouco tempo, modificado o mapa global da corrupção. De acordo com Stuart Gilman, “as nações têm um marco estratégico, não só com leis mais efetivas e procedimentos criminais, mas também com instrumentos de prevenção e controle. O que precisamos agora é de governos com vontade política para combatê-la de forma efetiva” (Folha de São Paulo- 09.12.2007- A-3). Realmente, pesa sobre o poder público a responsabilidade de tornar a engrenagem burocrática mais transparente e mais ágil, ao mesmo tempo em que deve fortalecer os processos de revisão e fiscalização. Concretizar a Uncac é como Victor Hugo via o futuro: “Para os fracos, inatingível; para os corajosos, uma oportunidade”.
No momento, há mais de cem países que ratificaram a Uncac. Espera-se, quando implementada, que não haverá lugar para corruptos se esconderem. O instrumento prevê cooperação internacional para rastrear, bloquear e devolver dinheiro origem ilícita aos países de origem. O Brasil aderiu à convenção em junho de 2005. Desde então, o Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC, na sigla em inglês) vem trabalhando com respeitáveis instituições do governo, principalmente a CGU (Controladoria Geral da União), para dar vida a muitos elementos da convenção.
Invocando novamente Stuart Gilman, “o mais nocivo custo da corrupção é humano. A corrupção corrói o elo da sociedade, degrada instituições públicas e enfraquece o ambiente de investimentos. E o impacto maior recai sobre a população mais vulnerável. Este é o culto real: crianças sem educação, doentes sem acesso a serviço de saúde, pequenos negócios que não conseguem sobreviver”.
Eliminar a corrupção por completo não será possível, mas devemos controlá-la e preveni-la. A população precisa combatê-la, denunciá-la e principalmente, não aceitá-la como se fosse uma espécie de característica de nossa cultura. A sua estagnação se inicia com a conscientização de impedi-la, cobrando punição coerente dos órgãos responsáveis aos infratores e evitando políticos já condenados por esses delitos.
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário
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