Tenho insistido na degradação a que chegou a nossa língua com a conivência de muitos e a indiferença de quase todos. O problema já é antigo. Nos meus primeiros artigos neste Jornal, eu relatei que a Imprensa Nacional-Casa da Moeda, dirigiu em Abril de 1981, a sessenta e oito escritores portugueses (romancistas, poetas, professores, críticos literários) uma circular, convidando-os a falarem da sua experiência e das suas opiniões de autores preocupados com a sua língua. Foram recebidas apenas dezassete respostas. A Casa das Moeda não quis fazer juízos de fundo sobre o significado das ausências, mas lamentou o facto de grande parte dos intelectuais contactados não estar interessada nem se preocupar com a defesa e o futuro da sua língua.
Como tenho mostrado, nada melhorou. Grande parte dos mentores e corifeus da nossa vida social e cultural, sente-se bem na categoria que lhe deram e não se sente na obrigação de se aperfeiçoar em nada, muito menos na rectidão da linguagem. Já ouviram dizer uma vez ou outra que muitos dos nossos intelectuais, deputados, ministros, críticos, locutores da rádio ou da TV, comentadores, etc., dão erros de toda a espécie, mas isso não é chuva que os molhe, nem vergonha que os faça corar. Tudo continua inalterado, alegremente, serenamente…
No segundo artigo desta série, eu manifestei a opinião de que quem deve pontificar na língua portuguesa somos nós, os portugueses, os que desde há alguns séculos caldearam essa língua, neste rincão que se chama Portugal. Somos nós que a devemos preservar e defender para a podermos “impor” como valor social, espiritual e cultural a todo o mundo. Mas, perante o panorama que se observa, perante a indiferença e apatia de grande parte de quem mais se devia interessar, torna-se lícito perguntar se os portugueses têm realmente esse direito de dar aos outros povos directrizes sobre a sua própria língua.
De facto, é uma realidade que o inglês está a ter uma hegemonia mundial e, pelo que se observa na internet, não somos só nós a permitir. Há, por exemplo, o “Dia Europeu das Línguas”, 26 de Set. de cada ano, dia com celebrações culturais em que teoricamente se procura o multilinguismo, ou seja, a conveniência de ordem social e cultural de cada cidadão europeu conhecer pelo menos duas línguas, para além da sua língua materna. Em Set. de 2011 celebrou-se o 10º.aniversário desse DIA, mas, pesquisando na internet, vê-se que o impacto na vida cultural portuguesa é praticamente nulo. Procurando referências a esse DIA de Set. de 2009, encontramos: “Em Bruxelas – ver: Relatório sobre as comemorações” ; convite em português mas o relatório está totalmente em inglês. Fala-se da intervenção de doutores e institutos (poucos…), mas não se vê concretamente em que consistiu essa intervenção. Procurando informações sobre esse DIA em 2012, aparece-nos a certa altura um quadro bem desenvolvido com os muitos países participantes, iniciativas tomadas, datas, locais e público a que se destinaram: estudantes, professores, tradutores, catedráticos, público em geral e mesmo crianças. A participação de Portugal é a mais modesta, para não dizer mesmo ridícula, pois foi apenas uma, destinada a …tradutores. De notar que todo este quadro está em inglês. Pelo exposto, não admira que entre nós tudo seja tão desconhecido e que, ao fim e ao cabo, o pretendido multilinguismo não passe de teoria pouco praticável de fracos resultados, do que o inglês é beneficiário.
Há em São Paulo, Brasil, não em Lisboa, um MUSEU DA LINGUA PORTUGUESA. Não é um museu-edifício, tal como o leitor pode estar a imaginar, mas uma ala dum grandioso edifício no centro daquela cidade, concretamente, na Estação da Luz. Se o leitor dispõe de internet pode pesquisar facilmente, e verificar que é um local condigno de cultura sobre a língua portuguesa, sob a tutela da Secretaria da Cultura do Governo do Estado de São Paulo. No dia 11 de Agosto de 2012, por exemplo, realizou-se mais um dos diversos eventos culturais, dessa vez um curso denominado MUNDO, LÍNGUA, PALAVRA. Para além dessas iniciativa culturais e às vezes artísticas, há a parte histórica e instrutiva sobre a formação da língua, desde os romanos, com a influência dos árabes e da era dos descobrimentos, não deixando de falar, como é óbvio, nas primeiras gramáticas, sendo mesmo a primeira a de Fernão de Oliveira, publicada em 1536, seguida pela de João de Barros em 1540. A internet informa que este MUSEU foi inaugurado em 20 de Março de 2006 e que até 28 de Dez. de 2012 tinha recebido mais de 2.900.000 visitantes. Tudo isto no Brasil, não em Portugal. Que deve haver no pensamento e no sentimento de um português que se preze? O leitor já conhece a minha resposta. Dê a conhecer a sua, a mim e aos seus amigos. É assunto pouco conhecido e falado, mas que devia ser muito falado e conhecido.
(continua)
LAURENTINO SABROSA - Senhora da Hora, Portugal
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