Moradora da cidade de São Paulo, tenho tido que lidar com a questão das revoltas ditas “estudantis” contra o aumento das tarifas de ônibus. Eu confesso que tentei me manter neutra em relação ao tema, guardando minhas opiniões para mim mesma, mas, depois de muito ouvir sobre o assunto, sou compelida a tecer algumas considerações.
Para quem não sabe ou para quem vem acompanhando apenas pela televisão, é preciso dizer que, de cara, as manifestações dos estudantes vem causando todo tipo de reações, de sentimentos e toda sorte de empatia e antipatia. Tenho percebido que, longe de haver um consenso, a própria discussão sobre o tema já se mostra capaz de dar azo a ânimos acirrados...
Antes de mais nada, eu preciso dizer que, na essência, sou favorável ao movimento, ao fato da população deixar de lado a indiferença e dizer que o que pensa, o que quer. Está claro e mais do que isso, dispensa maiores esforços semânticos o fato de que pagamos demais para serviços de menos. Nossa segurança, nossa educação, nossa saúde e nossos direitos são vilipendiados de forma reiterada e descarada, como se o dinheiro público tivesse a única função de encher a burra de políticos corruptos. Já está na hora de deixarmos de ser um país de bananas, de gente que se resigna diante de toda espécie de abuso de poder.
Contudo, por outro lado, ando desconfiada do mote real desse movimento contra o aumento da tarifa de ônibus na cidade de São Paulo. Não estou convicta das verdadeiras razões; nem das sabidas nem das escamoteadas. Acredito que muita gente está lá crente de que faz o melhor por si e pelos seus, mas talvez estejam sendo mal conduzidos ou manipulados.
Diante das recentes ondas de violência que tem vitimado muitos inocentes, com gente sendo queimada por não ter dinheiro, ou levando um tiro na cabeça por estar com um pouco dele, com gente sendo vítima apenas porque está na frente do interesse de algum marginal, eu acho no mínimo estranho que a grande revolta dos jovens tenha se dado por conta de vinte centavos a mais na passagem. Vejam bem, não digo que o motivo não é justo e sei que, no fim do mês, para quem depende desse meio de transporte, o montante pode significar um aumento significativo em orçamentos apertados, mas eu me sinto como se assistisse gente atirando bomba em passarinho, logo depois de ter sido atropelada por uma manada de elefantes, passivamente.
Já me perguntei se isso não seria o chamado “efeito gota d’água”, se não teria sido apenas um estopim, um caminho inevitável, a tão sonhada tomada de posição da população brasileira, mas, de todo coração, não estou certa disso. Para mim, estão misturando as coisas, estão usando meios e argumentos errados e estão punindo muita gente para quem os vinte centavos são verdadeiramente indispensáveis. Pode até ser que o equívoco esteja sendo de poucos, mas quando se apreende no meio dos manifestantes, drogas, facas e afins, quando se vê o caminho de estrago, de pânico e violência que fica para trás, não sou, ainda, capaz de crer em suas totais boas intenções...
Pode ser que a polícia esteja cometendo excessos? Pode ser. Mas seu papel é manter a ordem e se precisam proteger a integridade dos bens públicos e das pessoas que não desejam fazer parte ou não acreditam na legitimidade do movimento, então, dentro de um estado de direito, deverão responder no que ultrapassar os limites da lei.
Se cinco, dez mil estudantes estivessem acampados, dia após dia, na frente dos prédios do executivo, do legislativo, de quem tem o poder formal de mudar alguma coisa, eu não apenas irei aplaudir, como irei incentivar. Que não fosse apenas pelo transporte, mas que fosse pela saúde, pela moralidade, pela segurança, pela cidadania.
Seja como for, aqui a história não é como aquela da tartaruga que é achada encima da árvore. Nesse caso, todo mundo sabe como o prefeito foi parar na Prefeitura... Espero que a memória dos estudantes envolvidos no movimento, sobretudo, não seja tão fraca a ponto de mudar de foco até as próximas eleições...
Termino dizendo que não acredito em mocinhos e bandidos, mas que não aceito, por outro lado, que me queiram impor uma posição. Essa é apenas minha opinião e nada mais do que isso. Leia quem quiser...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo.
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