Tenho refletido sobre mudanças que acontecem no meu dia-a-dia e no entorno que possui ligação comigo. É incrível! De uma hora para outra, as coisas mudam e exigem novos rumos, projetos diferenciados, atitudes imprevistas. Meu pai ressaltava, nas alterações, que “o homem põe e Deus dispõe”. Penso ser isso: é Deus que me desinstala para me dizer algo.
Se não fossem as modificações, por certo me tornaria uma pessoa estagnada. Procuro organizar o que faço e o que possuo com cuidado. Caso tudo acontecesse e se repetisse da minha forma, conforme arquivos arrumados com primor, andaria no mesmo ritmo, imune a sustos e emoções. Ah, é isso, caminharia por estradas retas sem sobressaltos e descobertas! Ao me remover da cadência de chuva mansa no telhado, Deus me oferece a oportunidade de me ver ao perder o controle sobre os fatos e de me aprimorar. Ele me mostra que contratempos, com os quais me deparo, são ínfimos, ao observar, com olhos de compaixão, tanta gente que sofre por miséria, doença, abandono, fome, guerras. E constato, ainda, que sou impotente diante de certas situações. Incontáveis vezes, em minhas conversas com o Senhor, Lhe digo: “ Para essa circunstância, não possuo trilhas. Deixo em Suas mãos”. É uma forma de assumir meus excessivos limites e entrar na humildade que o “posso tudo” mascara.
Já experimentei, em deslocamentos repentinos, a falta de esteio. São pessoas que se distanciam ou partem e que, para mim, representavam força nos riscos de naufrágio. São as cartas enigmáticas indecifráveis no presente e para o amanhã. São fronteiras que me impedem um próximo passo. Em “Aquarela”, de Vinícius e Toquinho, existem versos intensos sobre o que há de vir: “E o futuro é uma astronave que tentamos pilotar/ (...) Sem pedir licença muda nossa vida/ e depois convida a rir ou a chorar...”
Ao nascer, chorei demais. E continuei chorando tanto, nos primeiros dias, que passei a ser conhecida, na maternidade, por “Manhosa”. Acabara de ser transferida do aconchego das entranhas de minha mãe para o mundo que oscila entre áspero e macio. Ao longo dos anos, prossegui em variações, de um lugar para o outro, com ou sem escolha. Quanto me rebelei, em atitude interior de desassossego e inconformismo!
Hoje, apesar de determinados receios, ao perceber que Deus me desinstala disso ou daquilo, já não me comprime em profundidade o coração. Carrego vivências de transformações e, embora parte delas dolorosas, para todas houve um sinal do Céu. Reconheço-me peregrina. Encorajo-me na certeza de que “o homem põe e Deus dispõe”. E, se Deus dispõe, há, no acontecimento novo, a mão dEle, que ampara, acaricia e conduz. Mão de ninho que acolhe e acompanha a um voo mais próximo do azul.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE - É coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.
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