Acordo antes de clarear com o propósito de ouvir o que Deus tem a me dizer. É a hora em que o silêncio me traz a voz do Altíssimo. E para que meus ouvidos se abram, assumi, há anos, o compromisso de fazer algumas leituras: as da Liturgia Diária e da Liturgia das Horas, uma colocação de Santo Agostinho e outra do livro “Caminho” de São Josemaria Escrivá e a do livro “Intimidade Divina” do Padre Gabriel de Santa Maria Madalena, O.C.D. (1895-1953) – Edições Loyola -, com um texto específico para cada dia do ano litúrgico. Em seguida, murmuro os Salmos e inicio minhas orações pessoais. No percurso para o trabalho, rezo o terço.
Os textos do livro “Intimidade Divina” me falam muito de Deus e me levam a, de imediato, conversar com o Senhor. Interessante como, a cada ano, descubro nas leituras uma indicação divina, que me passara despercebida no ano anterior. Não tenho dúvida de que é Deus! Ele é de uma delicadeza incrível e respeita o tempo individual. Conhece como se encontra o solo: em condições ou não de lançar uma nova semente. Identifica qual o canto escuro que está preparado para receber a claridade, sem temer a perda do mofo e das teias abandonadas. Li, há décadas, uma frase de Clarice Lispector que me comove: “Um dia uma folha me bateu nos cílios. Achei Deus de uma grande delicadeza”. Naquele período, não havia ainda refletido sobre as delicadezas de Deus. Hoje percebo essa delicadeza comigo e com os outros. Deus vem de mansinho, com a brisa, para acolher, abraçar e salvar.
Voltando, porém, às reflexões do Padre Gabriel de Santa Maria Madalena, O.C.D. Elas me fazem um bem imenso, porque revelam e mostram a essência de Deus. E quero que Deus seja o único Senhor da minha vida. E quero me libertar dos estereótipos do divino, criados à imagem e semelhança dos interesses do ser humano. Duas dessas reflexões habitam atualmente o meu pensamento. A primeira: “A vanglória põe o eu no centro da vida; a caridade põe Deus e o próximo. (...) Vanglória é busca de si; a caridade é entrega de si a Deus e aos irmãos. Caridade e vanglória são dois opostos e mutuamente se excluem”. Temo demais elogios. Alegro-me com a comunhão das pessoas, quando se emocionam com aquilo que me emociona. É comunhão de amizade e carinho, todavia aplausos me incomodam. Como me conheço, sei que posso tropeçar na vanglória e me perder de Deus. A outra é sobre o amor além dos laços de ternura: “Só a caridade pode amar assim, acima dos vínculos da carne e do sangue, acima de toda simpatia ou antipatia, de toda paixão, interesse ou busca de satisfação pessoal. O amor ao próximo torna-se então a garantia mais segura e o testemunho mais certo do amor a Deus”.
Como o mundo desconhece esse amor, que é de Deus, sem vínculos da carne e do sangue, sem amarras egoístas. Como são confusos, às vezes, os conceitos de caridade. Somente a caridade verdadeira, que não pede nada em troca, dilata o coração e faz com nele caibam os degraus do Céu.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE - É coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil
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