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Segunda-feira, 21 de Outubro de 2013
HUMBERTO PINHO DA SILVA - A BRAGANÇA QUE CONHECI

 

 

 

 

 

 

 

 

Na década sessenta, residi em Bragança. Foram quase quatro anos passados no BC3, onde cumpria serviço militar, e com família brigantina, que recebia hospedes.

 

Nesse tempo, a cidade tinha um ar provinciano. Não havia largas avenidas nem movimento, e o comércio era pouco desenvolvido.

 

Mas era burgo acolhedor, e população que sabia receber, como poucos, os forasteiros.

 

Meus passeios favoritos eram pelos arrabaldes, em companhia de amigos. Chegamos a ir, a pé, a França, e muitas vezes a Gimonde, ou deambulávamos pela empinada estrada, que servia a pousada.

 

Tive muitos amigos, cujos nomes esqueci. Recordo que um era bibliotecário da Gulbenkian. Em dia e hora certa, estacionava a carrinha na Praça da Sé. Era um gosto ver crianças e estudantes, em busca de leitura.

 

Frequentávamos, entre outros, as cafetarias: “ Chave d’Oiro“ "Lisboa ",  “ Central “, e por vezes, o” Floresta “.

 

Mais tarde, apareceu, virado para a velha Sé, o “ Florida “. Era o último grito. O café da moda.

 

Mas sempre, o mais elegante foi o” Chave d’Oiro” e o “ Poças “, que era pensão bem frequentada, com pessoal simpatiquíssimo.

 

À noitinha, depois do Sol recolher-se, nos dias quentes de Verão, passávamos pelo café “ Floresta “, e ficávamos a cavaquear, pela noite dentro, no jardim sobranceiro ao Fervença, que só se enfurecia no pino do Inverno.

 

Nesse amplo terreiro, reuniam-se os jovens, em magotes, ou aos pares de namorados, a passearem ao som de música alegre.

 

Estava em voga o Roberto Carlos, que “ mandava tudo para o inferno”.

 

 

 

 

 

 

Dos médicos, da cidade, conheci o Flores. Clínico que usava formulas “ milagrosas”, que diziam serem eficazes.

 

Havia também o Pires, famoso pelos numerosos filhos.

 

Nessa época, o BC3, era composto por casarões, mal amanhados, que nem cercado tinham. Vi, mais tarde nascerem, quase pegado, o novo quartel.

 

 Convivi com o sargento Mário, que era solteiro, e tinha uma filha pequena. Vivia numa pensão, no centro.

 

Homem atencioso, quase paternal, apesar da rigidez militar.

 

Deixou-me o cargo que ocupava nas Escolas Regimentais, onde Padre Telmo, de longe a longe, fazia curiosas palestras.

 

Guardo, como recordação, louvor, pela forma como orientei o ensino. O professor Bi, soube fazer exames tão acessíveis, que todos passaram, e todos receberam diploma. Decorrido alguns anos, já a viver no Porto, indo de comboio paras Bragança, fui abordado por homem, bem aprumado e musculoso, fardado de polícia e de largo sorriso no rosto. Cumprimentou-me de mão estendida:

 

- Já não me conhece? Fui seu aluno. Graças a si obti o diploma que me permitiu entrar na polícia.

 

Nunca mais me esqueci disso.

 

Voltemos ao sargento Mário.

 

Certa vez ,já no Porto, a conversar com senhora, na rua do Bonjardim, ao saber que era de Vinhais, perguntei-lhe, se conhecia o 1º sargento Mário.

 

Respondeu-me que sim. Chegou, em menina, a ter namorico com ele. Coisas de crianças.

 

Como vêm o mundo não é tão grande como se pensa.

 

Acicatado pela saudade, fui mais tarde visitar Bragança. Encontrei-a remoçada. Vestida de vestes mais citadinas; mas senti saudade da cidade de outrora; e conservo, ainda, lindas recordações de cenas de profunda ternura, que cavaram bem fundo, e gravaram-se para sempre.

 

 

 

 

HUMBERTO PINHO DA SILVA   -   Porto, Portugal



publicado por Luso-brasileiro às 10:45
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2 comentários:
De António Manuel Cruz da Silva a 5 de Maio de 2014 às 00:06
Não tenho o prazer de o conhecer mas é verdade Meu Amigo estive em Bragança em 1970 a tirar a especialidade de Sapador de Minas e Armadilhas e lembro-me muito bem de como o BC3 era .
Eram barracões sem porta de armas apenas com dois paus em cruz de cada lado para aguentarem um maior que servia de porta em que o sentinela tinha dois bidões de ferro soldados para se meter, tinha direito a um carro de mão de lenha para se aquecer e a uma garrafa de bagaço, vivo em Algarve em Faro e ainda me recordo e sinto saudades.


De Humberto Pinho da Silva a 8 de Maio de 2014 às 11:28
Estive em Bragança não em 1970, mas de 1967 a 1969. Gostei imenso da cidade e da simpatia como fui recebido pela população.. Era uma cidade muito provinciana, na ocasião, mas muito acolhedora. Obrigado pelo seu comentário.


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