Quaresma é tempo de “Subir a Jerusalém”, disposta a colocar na Cruz o que me impede de uma aproximação maior com Deus, minha resistência ao bem. E, aos poucos, vejo uma faceta dessa realidade. O tempo é de Deus. Há meses rezo uma oração que creio ser da Espiritualidade Inaciana: “Aqui estou, meu Deus, diante de Ti, tal como sou agora. Estou sentada diante de Ti, Senhor, tranquila e pacificada. Estou na Tua presença e deixo-me conduzir. Abro-me à Tua proximidade. Deixa que Tua paz me habite. Concede-me a graça de me deixar ‘limpar’ por Ti, ser uma concha que se enche de Ti, meu Deus...”
Na conversa com Deus, na quarta-feira de Cinzas deste ano, no aspecto de me deixar purificar por Ele, roguei-Lhe que me diminuísse o amor próprio. Atendeu-me de imediato. E como se esmerou, nestas últimas semanas, em me mostrar a intensidade de meu amor próprio, que me impede sentimentos virtuosos, coerentes com a caridade. Nos primeiros acontecimentos, não notei de imediato que era Deus. Foi como se passasse um rolo compressor em meu coração. Chegou a doer. Pensei em fugir de certas situações que considerei humilhação. Senti-me desolada. Em seguida, recordei-me de meu pedido em prece e, mesmo que sangrasse, olhei para o Céu e sorri. Amor de Deus, que me abraçou, no caminho a Jerusalém, para pregar meus defeitos tantos na Cruz e me oferecer a morte de minhas mortes. E tem sido assim: um acontecimento que fere meu ego, o pus que escorre e o bálsamo do Espírito Santo. Uma experiência muito rica da Palavra, que me faz mais consciente do que é ser testemunha da bondade de Deus que é tão misericordioso comigo.
Vejo, agora, com lucidez possível, a diferença entre amor próprio e autoestima elevada. Amor próprio é me endeusar, autoestima positiva é reconhecer que tenho minhas habilidades e capacidades, mas todas elas são dons que Deus me concedeu para viver em plenitude e partilhar vida aos que se encontram próximos.
Em uma das reflexões do livro “Intimidade Divina” de Frei Gabriel de Santa Maria Madalena, O.C.D. – Edições Loyola -, para a quarta semana da Quaresma, li que Jesus Cristo, verdade eterna, aceitou ser tratado como mentiroso; bondade infinita, como malfeitor; sabedoria incriada, como louco; mansidão sem limites, como subversivo; Filho de Deus, como endemoninhado. E conclui o autor: “As humilhações de Cristo resgatam o homem do orgulho e, ao mesmo tempo, lhe dão força para segui-Lo no caminho da humildade”.
Santo Inácio nos ensina a contemplar Jesus, entrando nas cenas do Evangelho, pois no mundo da imagem, como disse alguém, “percebemos melhor que o ser humano se transforma naquilo que contempla”. Olho embevecida a luz de Deus em mim, meus limites e dificuldades e anseio por ser melhor. Peregrino, sem me deter em meus obstáculos, ao Monte Calvário, onde o Senhor me aguarda, a fim de me levar à madrugada da Páscoa. Bendito seja o Ressuscitado, que está conosco todos os dias até o fim dos séculos!
MARIA CRISTINA CASTILHO DA ANDRADE- É coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher e autora de “Nos Varais do Mundo/ Submundo” –Edições Loyola
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