No meu último artigo, comentei a utilização de tecnologias digitais no ensino, e o misto de otimismo e preocupação que isso desperta. Encontro agora, no jornal Valor Econômico/The Wall Street Journal, de 28/11/2014, um curioso e instigante artigo de Nicholas Carr, intitulado “A automação excessiva emburrece.”
Antes de mais nada, há que apresentar Nicholas Carr. É um escritor norte-americano muito respeitado, crítico da automação e da “internetização” da vida corporativa, social e educacional. Nasceu em 1959, estudou nas Universidades de Darmouth e Harvard, foi editor executivo da prestigiosa Harvard Business Review e é atualmente membro do Conselho Editorial da Enciclopédia Britânica. Seu livro “A geração superficial: o que a Internet está fazendo com os nossos cérebros?”, lançado em 2010, esteve na lista dos mais vendidos nos Estados Unidos e foi indicado para o Prêmio Pulitzer, chegando a figurar entre os finalistas em 2011. Foi traduzido para 14 idiomas, inclusive o português. No Brasil, foi editado pela Agir em 2012, mas a edição rapidamente se esgotou e ainda não foi renovada.
Consegui encontrar um exemplar em Estante Virtual e já o encomendei. O tema é polêmico, de grande atualidade e interesse. Penso retornar a ele mais vezes, depois de lido e analisado o livro, mas desde já queria compartilhar com meus leitores, para conhecimento e reflexão deles, os tópicos principais do referido artigo publicado no The Wall Street Journal:
“A inteligência artificial chegou. Os computadores são hoje perspicazes e precisos. Deslumbrados com nossas máquinas, nós damos a elas todo tipo de tarefas sofisticadas que antes costumávamos fazer sozinhos. Nossa crescente dependência da automação e computadores, porém, pode ter um custo elevado. Evidências preocupantes sugerem que nossa inteligência está se retraindo à medida que nos tornamos mais dependentes da inteligência artificial. Em vez de nos elevar, parece que o software inteligente nos emburrece.”
Essa é a introdução do artigo. Em seguida, Carr mostra como, nas indústrias, à medida que a automação se foi intensificando, em meados do século passado, os empregados foram ficando cada vez menos ativos e mais passivos, cada vez mais adestrados a apertar botões que produzem efeitos imediatos e cada vez menos capazes de tomar decisões que, por atos explícitos de vontade, conduzissem a suas consequências. Em outras palavras, foram se automatizando, foram se transformando em robôs integrados à dinâmica e à estrutura dos mecanismos em que trabalhavam.
Mas isso não ficou apenas no campo da execução industrial. Os computadores foram se tornando mais sofisticados e eficientes, tomando conta de outros ramos de atividades:
“Os computadores estão assumindo tipos de trabalho intelectual considerados um privilégio de profissionais bem educados e treinados: pilotos dependem de computadores para operar um avião; médicos consultam computadores para diagnosticar doenças; arquitetos os usam para projetar prédios. A nova onda da automação está atingindo todo mundo. E evidências mostram que o mesmo efeito negativo que reduziu os talentos nas fábricas no século passado está começando a atingir as habilidades dos profissionais, mesmo os mais especializados. Os operadores de máquinas de ontem são os operadores de computadores de hoje. Veja o caso dos pilotos automáticos, inventados há um século para dar mais segurança e eficiência às viagens aéreas. Hoje, a quantidade de tarefas na cabine que foram transferidas para dispositivos computadorizados é tão grande, dizem especialistas, que os pilotos estão perdendo suas habilidades.”
Carr expõe, a seguir, diversas experiências feitas em vários campos de atuação, mostrando como, em geral, a automação e a hegemonia do conhecimento imposta pela Internet está perigosamente apoucando o intelecto humano. E conclui: “Se confiarmos demais na automação, vamos nos tornar menos capazes e mais subservientes às nossas máquinas. Vamos criar um mundo mais apropriado para robôs do que para nós.”
É curioso como esse método de emburrecimento, por meio da falta de exercício prático, é precisamente o que temia, há mais de dois milênios, o sábio Platão, quando se perguntava se a escrita era auxiliar ou a assassina da memória...
ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS é historiador e jornalista profissional, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
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