Há poucos dias perdi um amigo. Por mais triste que seja, é inegável que se foi desse mundo como muitos anseiam. Adormeceu e foi levado por Morpheus para terras menos áridas. A morte o levou desacordado e gosto de pensar que ele acordou do outro lado, como quem chega de um sonho. Para a derradeira viagem da existência, foi de primeira classe, privilégio de poucos.
Meu amigo Shigueyuki tinha 80 anos, mas alma de moço. Mandava e-mails, tinha redes sociais e fazia posts engraçados, quase sempre com animais de estimação da família. Conversávamos pelo Messenger, o aplicativo de bate-papo do Facebook. Ele me atualizava sobre as notícias da Academia Linense de Letras, da qual nós dois somos titulares.
Sobre a Academia, inclusive, é preciso que eu diga que ele foi um dos maiores incentivadores do meu ingresso e foi através dele que estive lá em alguns momentos que me foram muito importantes. De várias formas, apenas pela amizade, ele foi a minha voz em um local que, por muito que me honre participar, pouco pude em todos esses dez anos estar presente.
Jornalista de formação, também era formado em Direito. Na internet costumava atualizar a colônia japonesa sobre os falecimentos ocorridos, sobretudo dos mais idosos. Espero que alguém o tenha substituído nessa tarefa, inclusive para noticiar o passamento dele e espero também que lhe tenham feito jus.
Fico imaginando o que ele mesmo escreveria sobre isso. Penso que mencionaria as pessoas que lhe eram importantes, mas que terminaria o texto com um “saí de férias, mas volto qualquer hora dessas” ou algo do tipo. Duvido que não fizesse graça com a situação, porém da forma que lhe era habitual, de forma inteligente e sutil. Não deixaria para os seus a marca única da tristeza.
Como sempre, não estamos preparados para morte, ainda mais quando a pessoa não está doente ou não aparenta estar. Sempre imaginamos que haverá tempo para reencontros, para conversas. Nunca há, em verdade. Vivemos ignorando que nos equilibramos em uma linha invisível e frágil chamada vida. Sequer sabemos até que ponto podemos estica-la. Só seguimos fingindo que caminhamos sobre terra firme.
Pois então meu amigo, como sempre, as despedidas ficaram no ar, pois o fio se rompeu e agora você pertence a outro lugar, aquele sobre o qual tecemos teorias, mas que desconhecemos por experiência ou do qual não nos é dado recordar. Aceite o meu carinho deixado nessas linhas, junto com a minha gratidão por todos esses anos de uma amizade improvável, mas que se realizou.
A Academia Linense de Letras perde um de seus membros fundadores, o titular da cadeira n. 22, cujo patrono é Norberto Masaru Kondó. Ficamos todos empobrecidos com sua ausência, mas acalantados com a certeza de que seu legado é muito maior do que sua vida terrena. Lembraremos do seu sorriso, da sua disposição em ajudar e do seu jeito de eterno menino. Imortal que foi, imortalizado que será. Vá com Deus! Até qualquer hora dessas!
Cinthya Nunes é jornalista, professora universitária, advogada e nunca deixa de lamentar as ausências que a existência impõe – cinthyanvs@gmail.com
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