É engraçado como o tempo tem o condão de transformar as pessoas em saudosistas, ainda que em diferentes níveis. Conforme os anos e as décadas vão se deitando as minhas costas, constato mais essa realidade. Aos poucos eu me vejo no espelho que até então somente refletia ecos dos meus pais e avós. Assim como eles, eu passei a sentir saudades daquilo que os ventos do tempo sopraram para longe.
Estamos próximos de mais um Carnaval. Já faz alguns anos que me pego pensando nos carnavais da minha infância e juventude. Embora meus pais não fossem exatamente apreciadores das folias de Momo, esse feriado sempre tinha o sabor especial, eis que era época de almoços em família e preguiça.
Reuníamos normalmente na casa dos meus avós e sempre tudo era festa. Por óbvio que a minha visão da coisa toda era a de uma criança, alheia a às circunstâncias que por certo envolviam vários adultos e crianças juntos. Sob meu ponto de vista, sobretudo agora, depurado pela saudade, foram tempos inesquecíveis.
Acompanhados de tios e agregados, saíamos com meus pais para ver o Carnaval de rua, lá em Lins, morrendo de rir dos palhaços, dos homens usando vestidos e perucas e boquiabertos com os trajes sumários de algumas mulheres e travestis. Na inexistência das câmeras de celulares e de redes sociais, tudo era registrado tão apenas em nossas lembranças. Cantando marchinhas e sambas-enredo, seguíamos assistindo à passagem do “desfile”, jogando confete e serpentina.
Um pouco mais tarde, adolescente, ia aos bailes de Carnaval da cidade. Só podia ir se acompanhada da família da minha amiga inseparável, a Patrícia. Eles compravam uma mesa entre as disponíveis no salão e eram meu salvo conduto. Com eles eu curtia as músicas, olhava meus paqueras (o equivalente da época ao crush de hoje), dançava e ria muito. Era outro tempo. Quando muito, bebericávamos um coquetel de frutas ou um copo de cerveja.
Pensando agora, em perspectiva, parece que isso foi há muito mais tempo... São memórias mais sensoriais do que nítidas e me dei conta disso quando ouvi, ontem, uma das marchinhas que embalava meus carnavais. Fui tomada por um turbilhão de emoções e, por alguns segundos eu tinha um terço da minha idade e, sem preocupações relevantes, brincava de Colombina apaixonada.
Aprendo, com os anos, que não se trata de uma geração ser necessariamente mais feliz do que a outra. Pode até haver certa verdade nisso, em alguns pontos, quando consideramos a violência, por exemplo, mas, tal qual me parece, são somente visões diferentes, distanciadas pelo tempo. No fundo, todos sentimos saudade do que não temos mais. É humano e compreensível sentirmos falta da leveza de algumas épocas de nossas vidas.
Nunca mais estive em um baile de Carnaval depois que passei dos vinte anos. Simplesmente não tive mais vontade. Mudei os planos, os gostos, mas permanecem as lembranças felizes, o gosto da canja de galinha servida às 6 da manhã, no pós baile. Remanescem os sons que são especiais porque únicos na memória de que estava lá, na mesma juventude. Não eram tempos melhores. Eram só outros tempos. Como se diz por aí, eram “outros Carnavais”...
A vida se encarrega de transformar tudo em antigas folias. Só nos resta dançar...
CINTHYA NUNES - é jornalista, advogada e professora universitária – cinthyanvs@gmail.com
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