Muitas das minhas mais remotas lembranças remetem à escola. Filha de professores, eu frequentava esse ambiente desde muito pequena, na companhia deles, fosse para ficar sentada na sala de aula ou fosse para estar nas festividades como quermesses e festas juninas. Quando chegou a minha vez de estudar, era um ambiente já um tanto familiar e eu agradeço por me sentir assim, pois de lá até hoje eu praticamente vivi toda minha vida ligada à educação.
Profissionalmente, embora advogada, acabei enveredando pelo magistério jurídico, ao que me dedico até hoje. Olhando para trás eu fico pensando que era algo meio inevitável mesmo. Hoje, contudo, entendo porque um professor se aposenta mais cedo. Ensinar é um sacerdócio, é prazeroso, é algo que faço com amor, mas é exaustivo. Quando um professor se dedica verdadeiramente, dar aulas é muito mais do que simplesmente expor a matéria ou corrigir provas. Quando um professor é vocacionado, ele se importa verdadeiramente se os alunos estão aprendendo ou não e isso requer muita dedicação e múltiplos esforços.
Particularmente, fico frustrada quando percebo que algo que acabei de explicar não conseguiu fazer o caminho certo entre o aluno e eu. Com a prática, é possível perceber isso pelos olhares, pela linguagem corporal. Não consigo simplesmente não me importar, como se não ter entendido fosse um problema dele e não meu. Repenso instantaneamente as estratégias e explico a matéria novamente, incorporando exemplos e buscando mais clareza ou mais simplicidade, somente parando quando percebo que alcancei meus objetivos e ao final disso, estou exausta.
Nesses momentos, penso invariavelmente nos meus pais e em como eles também chegavam ao final de uma semana de trabalho verdadeiramente extenuados. Tantas coisas me veem à mente nessas horas, tais como a importância desse profissional que é o formador de todas as formações, que é o responsável por preparar gerações de futuros eleitores, de políticos, de policiais e até mesmo de presidentes, entre outras tantas profissões e funções. Daí que é impossível não ficar revoltada com o descaso com que a educação, de um modo geral, é tratada nesse país.
Sempre soube através de pessoas sérias e competentes que a educação é o único meio eficiente de transformar a realidade das coisas. Só um povo educado é capaz de tomar, se não decisões certas, mas conscientes. E desde sempre, ao contrário, tudo o que vejo é a educação cada vez mais sendo massa de manobra eleitoral e sendo tratada como área de menor importância. Na rede pública sobretudo, no ensino fundamental e médio, com louváveis exceções, professores são mal remunerados, as salas de aula caem aos pedaços ou não possuem estrutura adequada e o que deveria ser prioridade para um país, vira tristeza. Isso quando não envolve os escabrosos casos de desvio de verbas destinadas a merenda escolar e ao material didático.
Quando vejo notícias como a daquela prefeita que ostentava carros de altíssimo padrão e torrava dinheiro que não pertencia a ela, enquanto as crianças estudavam em chão de terra batido, coberto com lona e sem merenda escolar, eu chego a pensar que não há saída, que estamos perdidos.
O magistério que escolhi ainda vive outra realidade, pois o ensino particular superior ainda tem reservas de qualidade, mas ainda assim já se vive a realidade do aluno consumidor, aquele que quer ter razão mesmo quando não tem e isso também exaure, também desanima em alguns momentos. Os professores que educam as crianças, no entanto, é que deveriam ser os mais valorizados, pois isso atrairia somente gente vocacionada e as afastaria ou desalentaria, como em vários casos acontece.
Não sei se é verdade, mas li que, no Japão, o único que não precisa se curvar na presença do imperador é o professor, em sinal de respeito e consideração a tão fundamental profissão. Olho para os professores que conheço e vejo pessoas honradas, com amor por educar, que dão tudo de si e mais um pouco, gente com brilho nos olhos e um imenso desejo no coração. A despeito de todas as dificuldades, eles não querem que nada do “imperador”, mas apenas que seus alunos sejam o melhor que podem ser. Feliz Dia dos professores para aqueles que amam o que fazem e aprendem o que ensinam!
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo.
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