A essa altura eu já fico me perguntando quando é que a ideia me surgiu e como foi que, num repente, eu estou em meio a entulho, sujeira, tinta e desespero. O fato é que resolvermos arrumar algumas coisas em casa, mas eram apenas alguns detalhes e tudo se resolveria muito rapidamente, ao menos na minha ilusão.
Um belo dia alguém me indicou um excelente mestre de obras. O rapaz era um faz-tudo e de confiança. Vi fotos de trabalhos anteriores dele e acabei ficando empolgada. Após o orçamento, ficamos convencidos de que tudo caberia no nosso bolso e no nosso tempo de férias. Apenas não pensamos que não caberia na nossa paciência...
Combinado o dia para início, o rapaz, de fato muito bom no que faz e de confiança, chegou logo cedo com a equipe e foi coisa de alguns minutos para eu me dar conta de onde tinha me enfiado. Olhei para os lados e comecei a ver meus móveis sendo levantados, coisas tiradas do lugar e muita, muita sujeira se materializando. Mas isso ainda estava longe de ser tudo.
Para começo de conversa, eu não entendo, de coração, porque pedreiros e pintores precisam começar tão cedo. O relógio mal atingia as sete horas (madrugada para quem dorme depois da uma!) e a campainha já soava. Começamos a nos levantar às seis e meia e, ainda assim, ficamos vários dias sem conseguir chegar aos cômodos antes deles, prejudicando café da manhã e banho. Outra consequência disso foi passar os dias como sonâmbulos, caindo de sono...
O material necessário para a reforma que, repito, consiste apenas em poucos ajustes espalhados pela casa, já estava devidamente comprado, mas a despeito disso passamos a frequentar o depósito de materiais de construção praticamente duas vezes por dia. Meu cartão de banco, inclusive, passou a ter medo de me ver e eu, medo de ouvir a frase: “Dona Cinthya, precisa comprar...”
A sujeira, inevitável quando se estoura parede e se mexe com gesso, no início não me incomodou tanto, mas depois de 6 dias fazendo faxinas homéricas e diárias, minhas costas, minhas mãos e minha paciência ficaram em estado deplorável. E quando achávamos que ia acabar, eu ouvia, no final do dia que, amanhã, sem falta, estaria tudo finalizado. Passei a ter um novo sentimento sobre o título de uma música do Garth Brooks que diz “E se o amanhã nunca chegar?”
Para além de tudo isso, ainda some-se o fato de que temos dois cães e uma gata. Os cães, dois machos, fazendo xixi por todos os lugares, na tentativa vã de mostrar que ainda mandavam no lugar, coisa difícil enquanto outros cinco homens, quatro dos quais estranhos a eles, andavam por tudo. A gata, coitada, apavorada, tentou todos os esconderijos possíveis, sendo encontrada, depois de muito implorarmos que ela aparecesse, dentro da churrasqueira, em meio à fuligem, dando novo sentido ao termo “churrasquinho de gato”.
O fato é que hoje, uma semana depois do início de tudo, temos a sensação de termos corrido uma maratona, pulando num pé só e de termos feito uma cara viagem ao purgatório. No meio de tudo isso houve descobertas de consertos necessários e mais alguns retoques estéticos. Hoje eles juraram que acabam, mas entre minha alegria esconde-se um fundo de dúvida desesperada. Estamos satisfeitos com o resultado, mas eu juro que amanhã, se eles aparecerem, vou fingir que não ouvi a campainha e, rebelde, transgressora, vou dormir como se ainda não fosse madrugada...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo. - cinthyanvs@gmail.com
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