Na cidade de São Paulo, bem como em outras cidades do Brasil, no dia 20 de novembro é comemorado o dia da “Consciência Negra”. Confesso que refleti muito antes de me decidir a escrever esse texto. Primeiro porque tive receio de não conseguir expressar, em palavras, o que de fato sinto e, segundo, porque vivemos em tristes tempos de intolerância e tudo o que é dito pode ser mal interpretado. De toda forma, a cronista que em mim habita levou a melhor sobre a cautela da advogada que sou.
É óbvio que, pela correria e trabalheira que todo final de ano envolve, uma folga na semana é sempre um alento, um oásis no qual é possível se encostar e simplesmente ver a vida passar um pouco mais desacelerada. Seria, portanto, uma hipocrisia eu dizer que não gosto que seja feriado, ainda que por razões particulares. Acredito, até, que todos os meses do ano deveriam ter um final de semana prolongado, uma pausa no calendário de dias que, para quem trabalha duro, escoam pelos dedos.
O que eu ouso ponderar nesse espaço é sobre ter um dia de feriado para a questão da consciência negra. Antes de mais nada, acredito que o dia poderia ser dedico a esse fim, mas não deveria ser um feriado. Se fosse para ser um feriado, destinado à reflexão, deveríamos ter um dia da Consciência Humana.
Houve um tempo no qual eu acreditava piamente que não havia muito preconceito de cor. Eu realmente pensava que o mundo era um lugar melhor nesse aspecto. Hoje percebo, infelizmente, que estava muito enganada. Descobri que há pessoas que simplesmente odeiam, desprezam e humilham alguém somente pela cor da pele e, embora no passado eu soubesse que pudesse haver, não imaginava a proporção e a violência desse tipo de conduta.
É preciso que eu defenda, sob pena de carregar comigo o peso da omissão, que sejam tomadas medidas voltadas a desestimular, coibir, evitar e punir o comportamento de que se entende melhor do que o outro pelo simples fato de ter menos melanina na pele. Entendo, porém, estabelecer um feriado para isso muito mais segrega, separa, do que une. Eu temo que, talvez no sincero afã de protegermos o que chamamos de minorias, acabemos nos tornando uma sociedade muito mais separatista.
Algumas vezes eu já me coloquei contra as paredes de minha consciência e me inquiri se eu seria uma pessoa preconceituosa. Até hoje eu tenho concluído que não sou, porque, de fato, não escolho meus amigos pela cor, pela opção sexual, pela religião ou por qualquer outro traço que não seja a afinidade. Se eu gosto de alguém, isso me basta e pela diversidade de meus amigos, noto que os vínculos que nos unem passam ao largo da cor que possuem.
A intolerância, o ódio e o preconceito já tem vitimado gente demais. É necessário igualar as diferenças, mas também é imprescindível realçar as semelhanças e o fato de sermos, todos, humanos, deveria bastar. Enquanto as pessoas se considerarem pertencentes a raças ou se qualificarem em escalas de importância, a vida vai chorar as suas muitas perdas e nós ainda teremos quem ache o terrorismo justificável, em nome de Deus ou de algum profeta (sejam eles quem forem)...
Não importa a cor que nossa pele tenha, nem como nos parecemos, porque, no fim das coisas, nosso sangue é igualmente vermelho e enquanto o branco da paz for com ele manchado, a única cor que nos restará será a do luto.
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo. - cinthyanvs@gmail.com
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