Sempre que posso, tento programar uma viagem nas minhas férias. Na época de faculdade eram sempre pequenos passeios, normalmente contando com a boa vontade de amigos ou parentes que nos emprestavam seus imóveis em alguma cidade de praia. O tempo passou e agora eu me organizo para alguma viagem mais distante, sobretudo porque existe uma condição chamada parcelamento.
Assim, nesse ano, foi a vez de conhecer um pouco do Ceará. Embora não seja uma adepta de torrar ao sol, eu amo praia. Gosto da brisa, de caminhar de manhã pela areia, do céu azul em contraste com o verde esmeralda da água. Outra coisa que me atrai é a culinária, porque gosto muito de peixe e de frutos do mar. E cada vez que ouço alguém dizer que camarão é barata do mar, eu penso que se as baratas caseiras fossem tão gostosas quanto, vários problemas estariam resolvidos...
Assim, após avaliar as possibilidades, resolvemos por um hotel situado em uma praia menos badalada, própria para quem quer descansar e tomar banho de mar. A praia do
Cumbuco foi nossa escolha. À trinta quilômetros da capital Fortaleza, a praia fica no minúsculo município cearense de Caucaia. Infelizmente, minha primeira impressão de Fortaleza não foi das melhores, porque tudo que eu pude ver foi sujeira e pobreza. O caminho do aeroporto para a praia só passava pela periferia e, desse modo, constatei que o descaso dos governantes com a população carente é reincidente. Não é de se espantar, pelo pouco do que vi, que Fortaleza seja mais uma cidade com surtos de toda espécie de doenças transmitidas por mosquitos. Tenho certeza de a cidade deve ter lugares bonitos a conhecer, mas vai ficar para outra oportunidade.
Já no Hotel, que era muito gostoso, várias coisas chamaram a minha atenção. Primeiramente, achei o povo cearense extremamente gentil e solícito, bem diferente de outros lugares nos quais já estive. Uma triste constatação foi ver que não importa quantas estrelas um hotel tenha, gente mal educada frequenta todo tipo de lugar. Ainda que a praia seja limpa, daria para fazer castelos de tampinhas de garrafa e de copos de plástico e eu me pergunto se levar as coisas até o lixo seja um esforço cívico tão intenso.
Outra coisa que me deixou a ponto de arrumar uma confusão na praia foi ver que um rapaz trazia um pequeno Jerico para que as pessoas pudessem nele seguir montadas pela praia. Para começo de conversa, o sol estava escaldante e pobre animal não tinha uma sombra na qual se abrigar, tampouco água que eu pudesse ver a ele ser servida. Quando uma mulher imensa foi até o dono do animal, que no máximo deveria dar voltas com crianças, e nele montou, eu vi, ao longe, as pernas do bicho fraquejarem. Enlouquecida, foi na direção deles, mas fui detida pela turma do "deixa disso", sob o argumento de que não adiantaria nada. O pior é sei que eles estão certos, mas isso não tira a minha certeza de que, talvez eu pudesse fazer alguma diferença. Sob o peso da minha omissão, vi a cretina se distanciar e lamentei pela falta de sensibilidade e de senso de justiça que vem se tornando a regra entre as pessoas.
Depois de alguns dias no hotel, comecei a reparar para os rapazes e moças que faziam a recreação na beira da piscina, também eram encontrados divertindo as crianças, fazendo show de humor à noite e também eram vistos vestidos de personagens que iam abordando os hóspedes, de modo divertido, dentro do hotel. Quando encontrei uma das moças sendo responsável pela entrega das toalhas, pensei que, se não fosse o caso de serem "umpa lumpas", essa era uma prova de que o povo é trabalhador e talvez um pouco explorado.
Já nos últimos dias da nossa estadia, fomos conhecer uma praia nas redondezas, em uma cidadezinha ainda mais afastada da capital. Fui olhando o caminho e, além de pés de caju e carnaúba, não vi nada mais plantado, o que achei curioso. Na cidade, vi uma placa de advogado, o que me fez pensar que, de fato, já estamos em todo lugar mesmo. Notei também que a cadeia pública era na esquina, e as janelas da cela davam para a rua! Tinham vista panorâmica!
O comércio não era de todo ruim e, ainda que mal houvesse asfalto, tinha uma loja do Boticário! O cemitério ocupava meio quarteirão, ao lado de casas e outras lojas. Era a morte como parte da comunidade...
Não sei se terei a oportunidade de voltar ao Ceará, mas saio daqui levando muita história na memória e com o desejo de que os cearenses possam ter mais oportunidades para não deixarem esse belo estado no último pau de arara...
CINTHYA NUNES VIEIRA DA SILVA - Advogada, mestra em Direito, professora universitária e escritora - São Paulo. - cinthyanvs@gmail.com
OS MEUS LINKS