Andava eu pelos meus dez anos (seriam onze?) quando conheci o Senhor D. Duarte Pio de Bragança.
Frequentava, o príncipezinho, o segundo ano, turma A, do Liceu Alexandre Herculano, no Porto, Fora-lhe dado o número: quatro.
Era menino robusto, de tez clara, recatado e retraído; rechonchudinho e coradinho. Um guapo rapaz!
Possuía farta e vistosa cabeleira cor de ouro velho, que o destacava dos restantes, quase todos moreninhos e cabelos cor de ébano.
Sentava-se o nosso principezinho na primeira fila, rente à janela, que abria para o recreio.
Certa ocasião, o príncipe, recebeu de tia, moradora em país de grandes compositores e altas montanhas, cobertas de alvas neves no inverno e de lindas flores silvestres, na primavera, relógio de pulso, cobiçado por muitos.
Estava o mestre a dissertar, quando paira no ar estranho e irritante sussurro. O que seria!?
Estupefacto, interrompe a elucidação, e logo dezenas de curiosos olhinhos espantados, volveram-se para o nosso príncipe.
Ergueu-se o principezinho, e declarou, concisamente:
O relógio era despertador. Inexplicavelmente, sem desejar, começou a soar. - Estava esclarecido o insólito.
Como os principezinhos das histórias de encantar, possuía, também, objectos mirabolantes, e hábitos estranhos. Estranhíssimos!!!...
D. Duarte Pio de Bragança quando andava na escola
Não queiram lá saber o que aconteceu em fria manhã de inverno: o menino principe, enfia a mão na algibeira e retira papel sedoso, e assoa-se.
O quê!? - Interrogam-se varados os petizes. - Ele limpa o nariz a papéis!?...
O mais afoito investigou o inusitado enigma...
Eram lenços de papel!.... Desconhecidos, em 1956, em Portugal....
Mas, em dia aziago, aconteceu inesperada tragédia:
Dona Delfina – esposa do jurista Lopes Cardoso, – resolveu realizar intima festinha.
Entre os convidados, contava-se o nosso principezinho. Comeram e beberam leite chocolatado. Depois solicitaram autorização para se retirarem.
O grupinho do príncipe era constituído, pelo Daniel, filho mais novo de Lopes Cardoso (meu informador das peripécias aqui referidas,) João Campos, António Baia e Emanuel Caldeira Figueiredo.
Assentaram, os garotinhos, dar curto passeio de bicicleta. Como os pneus estivessem em baixo, o grupinho, demandaram açodados, à Rua de Camões (Gaia,) em busca da oficina de José Grilo.
Inesperadamente, surdiu, enfurecido cachorro, que embirrou com D. Duarte. Aflito, atarantado, aturdido, refugia-se, encafuando-se numa viatura, com tanta infelicidade, que o vidro da janela estalou em pedacinhos.
E agora? Agora o pai do príncipe, com dignidade, reparou o dano.
Certo dia desapareceu o nosso principezinho...Soube-se que fora para as " Caldinhas".
Passaram-se longas décadas. O director do jornal, onde era redactor, encarregou-me de elaborar, entre outras entrevistas, curtíssima biografia de D. Duarte.
Nessa ocasião o meu principezinho encontrava-se casado, e era agora o Senhor Duque de Bragança.
Enviou-se-lhe o periódico. Ele e Dona Isabel, dirigiram-me afectuosa missiva e foto autografado, que conservo religiosamente.
Assim terminam as minhas singelas reminiscências do principezinho, que em 1956, estudava num liceu portuense, e brincava, ria e chorava, como qualquer criança portuguesa.
Bons tempos!...
HUMBERTO PINHO DA SILVA
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