O Brasil está passando por uma fase de transição demográfica. Com a queda dos índices de natalidade e o aumento da expectativa de vida, o número de idosos no País está aumentando. A questão suscita várias análises e diferentes consequências, sendo que o setor de saúde e a qualidade de vida são os que recebem maiores atenções. No entanto, também na área jurídica ela merece destaque, notadamente no sentido de fazerem valer suas prerrogativas e o respeito à dignidade.
A questão dos direitos humanos, relevante por si só, adquire uma nova e inusitada dimensão quando considerada à luz do crescimento demográfico de todo o mundo, pois envolve, em relação à terceira idade, aspectos e peculiaridades que não podemos ignorar. Ela origina exigências de respeito, acatamento, reverência e solidariedade, tão importantes quanto os aspectos materiais e da saúde.
Tanto que a Constituição Federal do Brasil dispõe em seu art. 229, que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade” .Por outro lado, o art. 230 determina que “a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e seu bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”; acrescentando, no seu parágrafo primeiro, que “os programas de amparo aos idosos serão executados preferencialmente em seus lares”. Desta forma, a Carta Magna de nosso país pugna por maior atenção aos nossos idosos, cujo desrespeito, considera-se uma infração de natureza constitucional. Nesta trilha, algumas conquistas foram efetivadas nos últimos tempos, mas ainda estamos longe de alcançarmos a situação ideal.
No entanto, acima dos aspectos estritamente legais que deverão ser rigorosamente observados, tais como o Estatuto do Idoso, a Declaração Universal dos Idosos, os preceitos constitucionais supramencionados, as normas do Código Civil e demais consectários atinentes, precisamos refletir sobre a necessidade de valorizar os mais velhos e despertar na comunidade que eles mesmos ajudaram a construir, uma visão ampla das possibilidades de aproveitamento da força laborativa de que dispõem; a experiência, a criatividade e a imensa capacidade de amor e energia que podem transmitir, como meio, inclusive, de combater e prevenir problemas relacionados com sentimentos de inutilidade, solidão e infelicidade.
Em nossa carreira profissional, pudemos constatar que milhares de pessoas nestas condições estão marginalizadas em todos os setores. São tratadas como inúteis ou como crianças inconscientes e irresponsáveis. No mercado de trabalho não existe tarefa digna que possam exercer, mesmo com toda vivência que acumularam em seus anos de trabalho. O idoso perde os referenciais e se sente incapaz e inseguro, refugiando-se forçosamente no núcleo familiar, que o acolhe como um verdadeiro problema sem solução.
Por isso, a ética da convivência social impõe também o dever moral de educarmos as novas gerações na convicção de que eles trazem, além de outras virtudes, a de acumular um cabedal de sabedoria que exclusivamente o tempo proporciona, como um valor indispensável e insubstituível, que só os anciões carregam. Constituem-se em fator de equilíbrio, tolerância e comedimento na convivência familiar e no relacionamento em geral. Sua capacidade, portanto, tem de ser aproveitada, valorizada e estimulada. No Brasil, o indivíduo mais experiente tende a ser relegado ao esquecimento, o que é uma grave consequência. Por isso, devemos buscar constantemente, formas e atitudes que os possibilitem usufruir de seu direito à dignidade.
A VELHICE ABANDONADA É UMA QUESTÃO MUITO AMPLA, QUE VEM SURGINDO Na ESTEIRA DO ENVELHECIMENTO DA ESTRUTURA DEMOGRÁFICA DO PAÍS, AO MESMO TEMPO EM QUE A INSTITUIÇÃO FAMILIAR E AS FORMAS DE CONVIVÊNCIA SOCIAL ESTÃO SE ALTERANDO E ENFRAQUECENDO O ARCABOUÇO TRADICIONAL DE APOIO AOS MAIS VELHOS, ENRAIZADA NA FAMÍLIA E NAS ORGANIZAÇÕES COMUNITÁRIAS E RELIGIOSAS. ESTES ASPECTOS VISUALIZARAM UMA SITUAÇÃO DE MANIFESTA VULNERABILIDADE, ESPERANDO-SE POR PROVIDÊNCIAS NÃO APENAS OFICIAIS, POIS O ESTADO NÃO CONSEGUE SIQUER SE MANTYER ADMINISTRATIVAMENTE, MAS DE TODOS NÓS QUE DEVERÍAMOS NOS EMPENHAR NA MUDANÇA DO NEBULOSO QUADRO, INCLUSIVE OS PRÓPRIOS IDOSOS QUE AINDA TÊM FORÇAS PARA IMPOREM AS CONQUISTAS LEGAIS DOS ÚLTIMOS TEMPOS.
O aprimoramento no trato dos idosos não pode se transformar numa batalha perdida. Conscientizemo-nos de nossas obrigações e lutemos por instituições políticas estáveis e independentes, por racionalidade econômica, por um efetivo amparo social, incluindo um sistema previdenciário eficiente e justo, e por respeito e dedicação aos mais velhos.
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário (martinelliadv@hotmail.com).
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