PAZ - Blogue luso-brasileiro
Domingo, 31 de Janeiro de 2016
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI - O CARNAVAL MUDOU. MAS AINDA É A MAIOR FESTA DO BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O carnaval é tido como espetáculo folclórico, diversão popular e até catarse coletiva, existindo inúmeras palavras ou expressões que o definem. O fato é que em alguns países, como o Brasil, tornou-se uma grande festividade nacional e popular. Historiadores e sociólogos não têm uma única teoria para explicar a importância que ele passou a ter para os brasileiros, mas todos concordam que ele promove uma ruptura provisória da hierarquia social, com ricos e pobres, homens e mulheres, adultos e crianças transgredindo ou dissolvendo símbolos de gênero, poder ou classe. No entanto, ele sempre teve beleza poética, exibições artísticas e riqueza rítmica.

Além do mais, durante muitos anos serviu como instrumento de demonstração de cidadania e de participação, possibilitando aos foliões,  através de marchas, fantasias e outros aspectos típicos criticarem a sociedade em geral, principalmente as atitudes negativas de alguns políticos e protestarem contra determinadas situações. Nessa trilha, transcrevemos trecho de editorial do jornal “A Tribuna” de Santos (04.02.2008-A2): “Para além do simples divertimento descompromissado, que constitui a sua verdadeira essência, no Carnaval, alguns aspectos a destacar. Um deles são as manifestações do senso crítico da população. Desde os seus primórdios, o Carnaval serviu para extravasar sentimentos coletivos, seja na forma da critica dos costumes, seja como expressão de desagrado em relação ao establishment e aos seus barões. A ferroada ferina, mordaz, implacável, a exacerbação do ridículo dos fatos e das pessoas, notadamente das pessoas poderosas ou que estejam em evidência, sempre foi uma das marcas registradas da folia...”.

O antropólogo Roberto DaMatta, autor de  “Carnavais, Malandros e Heróis”, publicada em 1979, coloca o período carnavalesco como um ritual de inversão de papéis, ou seja, no cotidiano o Brasil é um universo dividido entre o mundo da rua – baseado em leis universais, numa burocracia antiga e fortemente ancorada e num formalismo legal-jurídico quase absurdo – e o mundo da casa – fundado na família, na amizade, na lealdade, na pessoa e no compadrio. No reinado de Momo,prevalece um estado de que vale quase tudo. Na visão do  saudoso Darcy Ribeiro, “o nosso povo é tão sacrificado,  que alenta e comove a todos” e que manifesta uma “inverossímil alegria e espantosa vontade de felicidade”.

Atualmente, no entanto, essa fusão de mundos, talvez seja válido ainda nos lugares onde o Carnaval é tão forte quanto intenso, levando todos às ruas, como no Recife, Olinda ou Salvador. Em outros lugares, prevalece só o espetáculo, destinado à contemplação, como nos desfiles do Rio de Janeiro. O Carnaval está se transformando num período de descanso – um feriado prolongado, como tantos outros – onde, quando muito, se assiste aos desfiles das escolas de samba pela televisão, numa nítida constatação que estamos perdendo esse pequeno espaço de superação das desigualdades.

Por outro lado, a sociedade se transforma a cada geração, incorporando novos hábitos às tradições que se modificam ao sabor das novidades e da forma como as pessoas se relacionam. Cabe a cada grupo determinar as vantagens de estabelecer comunicação em todos os níveis, respeitando-se os limites do bom senso e da convivência saudável. Efetivamente mudou o Carnaval e talvez nós tenhamos mudado também. Alguma coisa se perdeu e como não foi dado conta, pelo gradativo da alteração, não houve como reaver. Ainda que as tentativas de resgate sejam válidas, importantes. Na década de 70, sem que diminuísse sua força, a marcha carnavalesca, ora fazendo críticas aos políticos e aos costumes, foi deixada de lado pelos grandes meios de comunicação como o rádio e a televisão.

Outro aspecto que o diferencia no presente é o significado exacerbadamente econômico que prevalece no Carnaval. É uma gigantesca engrenagem que se movimenta pelo País inteiro, a estimular negócios e a gerar empregos e renda para não pouca gente, deixando bastante de lado o simples divertimento descompromissado, que se constitui a sua verdadeira essência. E apesar de todas essas circunstâncias, de um jeito ou de outro, que fique um pouco de Carnaval em nossos corações e que aquela infantilidade gostosa de outrora não se perca de vez.

                       

 

 

JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é adgovado, jornalista, escritor e professor universitário. É presidente da Academia Jundiaiense de Letras (martinelliadv@hotmail.com).



publicado por Luso-brasileiro às 19:53
link do post | comentar | favorito

mais sobre mim
arquivos

Julho 2024

Maio 2024

Março 2024

Fevereiro 2024

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Julho 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Dezembro 2021

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

favoritos

JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINEL...

pesquisar
 
links