Há muito tempo que curto um hábito saudável: levanto e após minhas orações, leio uma poesia de boa qualidade que escolho entre as muitas existentes, quer seja de autores consagrados ou desconhecidos, quer de locais ou regionais. A manhã acaba florescendo com tamanha aptidão de viver, que os dias quase sempre são extremamente maravilhosos. Nesse momento, lembro-me de Clarice Lispector que afirmava “a palavra é meu domínio sobre o mundo”. Com efeito, através dela, não só flutuo sobre a criação alheia, como compartilho minhas, em redes sociais, o que propicia muitas vezes um encontro de sentimentos, dores, alegrias, tristezas, saudades e tantas outras circunstâncias que fomentam nossa subjetividade.
É por isso que adoro escrever e ler, e como na maioria das vezes minha inspiração não se concretiza em versos, aproprio-me da ode terceiros, repleta de coisas delicadas, com ritmo e harmonia típicos dos poetas que imortalizam tudo o que há de melhor e de mais belo no mundo; românticos que se revelam aos outros, sem receio de serem incompreendidos em seus sonhos, aspirações, desejos e principalmente, emoções.
Nesse aspecto, invoco a singeleza de Cora Coralina: “Poeta, não é somente o que escreve. É aquele que sente a poesia, se extasia sensível ao achado de uma rima à autenticidade de um verso”. Todos os que admiram esse gênero literário, com certeza, exercitam suas almas aproximando do próprio íntimo, sem pudores com o materialismo. Extravasam o espírito, sem se consumirem integralmente. Renovam-se a diferentes leituras na incessante procura de uma vida melhor.
Celebra-se a 14 de março o Dia Nacional da Poesia no Brasil, em homenagem a Antônio Frederico de Castro Alves, nascido nessa data 1847e que se consagrou como o poeta dos escravos por ter lutado e defendido arduamente a abolição da escravatura no Brasil. Um ótimo momento para homenagearmos todos que se dedicam a essa deslumbrante forma de arte transmitida pela escrita na qual revelam suas interioridades e pensamentos, com o poder de modificar a realidade, segundo as próprias percepções, aliando beleza e encanto, com a supremacia das concepções criativas.
Que Deus abençoe os poetas e os ajudem a permanecer difundindo seus trabalhos, fazendo da poesia uma das expressões artísticas mais populares em que permeada por seu lirismo característico, enriquece sobremaneira a profícua literatura brasileira. Numa reverência a comemoração de ontem, invocamos “Soneto da Separação” de Vinicius de Moraes: “De repente do riso fez-se o pranto/ Silencioso e branco como a bruma/ E das bocas unidas fez-se a espuma/ E das mãos espalmadas fez-se o espanto.// De repente da calma fez-se o vento/ Que dos olhos desfez a última chama/ E da paixão fez-se o pressentimento/ E do momento imóvel fez-se o drama.// De repente, não mais que de repente/ Fez-se de triste o que se fez amante/ E de sozinho o que se fez contente.// Fez-se do amigo próximo o distante/ Fez-se da vida uma aventura errante/ De repente, não mais que de repente”.
JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário. É presidente da Academia Jundiaiense de Letras (martinelliadv@hotmail.com).
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