Já não deve surpreender ninguém que o amanhã será um deserto de empregos. Mas não de atividades. Estas surgirão e demandarão pessoas qualificadas para exercê-las. O autor do livro “Um Mundo Sem Trabalho”, Daniel Susskind, constatou que a pandemia acelerou a automação. Aquilo que era projeto passou a ser realidade.
Para o pesquisador de Oxford, há duas automações. Aquela que substitui ação humana e que já existe há muito, sobretudo na indústria e agricultura e a fracionada, que apenas interfere em uma parte da atividade submetida ao ser pensante. Avalia-se que 60% das profissões formais têm elevado potencial de automação até 2026.
O interessante é que nem tudo pode ser automatizado. Invoca-se o chamado paradoxo de Moravec, formulação do austríaco Hans Moravec, nos anos 1980. Indagado sobre as profissões que estariam livres de serem automatizadas, ele respondeu: “Tarefas que achamos complicadas são facilmente resolvidas por máquinas e as que achamos simples, os computadores não conseguem resolver”. Por isso estão em alta as profissões de enfermeiros, cuidadores, nutricionistas, terapeutas, isso para falar na urgência de se manter uma estrutura de saúde compatível com os riscos da pós-modernidade.
Mas outros espaços também necessitam de pessoas. O mundo maltratado pelos devastadores da natureza precisará de pessoas que coletem sementes, que façam mudas, que mantenham viveiros. Que incentivem crianças a um constante replantio do verde que foi exterminado, da recomposição das matas ciliares, da utilização de qualquer terreno ocioso para abrigar hortas, pomares e conjuntos de árvores. Estas são fundamentais para a preservação da higidez climática e para a saúde humana. Enquanto a criminalidade destrói a Amazônia, o Pantanal, o Cerrado e a Mata Atlântica, é um refúgio da esperança fazer com que as crianças se mantenham amigas do ambiente.
O globo será o ambiente dos idosos. Estes precisarão de companhia, de academias para treino, de lazer e entretenimento. Também haverá muitas anomalias mentais. Cresce a necessidade de psiquiatras, psicanalistas, psicólogos, terapeutas para casais e para solitários. Se a tendência à extinção de empregos se concretizar e sobrevier a renda mínima, será preciso criar esquemas de acompanhamento dos que não terão o que fazer. O trabalho não é apenas castigo, mas é fonte de diversão, para quem gosta do que faz. Como cuidar daqueles que têm com que viver, mas não têm o que fazer com suas vidas?
A educação no século 21 tem de acordar para investir nas habilidades socioemocionais. A inteligência artificial é poderosa e sábia. Mas não é suscetível de emoção. Aquilo que necessitar de sensibilidade, empatia, ternura, emoção, nunca será objeto de funcionamento de máquina. A ferramenta da consciência ainda é insubstituível. Ao menos por enquanto.
Segundo os estudiosos, algo que pode ser imediatamente automatizado é o atendimento do tipo call center. Meios eletrônicos tais como WhatsApp ou chatbots (conversa com robôs), dispensam a presença de um humano para atender às solicitações mais corriqueiras. Também tendem a desaparecer, gradual e lentamente, as aulas prelecionais. O professor que tem de repetir suas aulas infinitas vezes, pode fornecer um conteúdo digital que vai satisfazer a muitos discípulos. Ele será quase que um professor particular, para responder às dúvidas, para orientar e para tutorar o educando.
Em compensação, haverá a necessidade de novos profissionais como especialista em serviços sanitários. É aquela pessoa que zelará e garantirá a qualidade de um ambiente inteiramente livre de vírus e insuscetível de causar eventuais infecções. É algo com que todos deverão se preocupar de hoje em diante.
Outra profissão em alta é o “coach”, o profissional habilitado a capacitar outros nas competências comportamentais, também chamadas “soft skills”. O coach será muito requisitado no futuro próximo.
Também se indica o especialista em Tecnologia da Informação sob demanda. Todos estão mergulhados no mundo web e vão precisar, cada vez mais, de profissionais que virão a domicílio resolver problemas pontuais, de conectividade, de estrutura tecnológica, de tudo aquilo que é novidade e surpresa na vida digital.
Com a necessidade de se reverter a onda de extermínio da natureza, todas as profissões vinculadas ao mercado verde também serão muito bem vindas. A ecologia não é mais um saber sofisticado e desnecessário, cultivado por fundamentalistas ambientais. É algo de que depende o futuro da humanidade. Por isso é urgente recrutar jardineiros, agrônomos, técnicos em agricultura, engenheiros florestais, floricultores, paisagistas, especialistas em orquidários, cultores de hortas orgânicas, formadores de pomares, de hortas, de aproveitamento de qualquer terra e revitalizadores de solo extenuado.
O mundo terá de ser outro, ou, simplesmente, não será… É de se recordar a profecia de Mikhail Gorbatchev quando esteve na ECO92, de saudosa memória: “O ser humano tem trinta anos para mudar seus hábitos de consumo e de conduta. Depois disso, a Terra continuará a existir. Mas prescindirá da espécie humana para isso!”.
Pode ser que isso não aconteça. Mas ninguém pode garantir que isso deixe de acontecer.
Quantos anos faltam para que esse lapso ocorra?
JOSÉ RENATO NALINI é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2019 -2020
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