A Faculdade de Direito do Largo de São Francisco foi celeiro de singularíssimas personalidades. Sua vinculação com a poesia é tradicional. Ali estudaram Fagundes Varela, Álvares de Azevedo e Castro Alves. Ali também foi aluno intermitente o notável Paulo Bomfim, o Príncipe dos Poetas Brasileiros, que perdemos no mês de julho de 2019.
Seus nomes estão eternizados nas colunas de sustentação daquele templo do direito, repositório de glórias e fornecedor dos melhores quadros aos dois Impérios e à República brasileira.
Mas não é apenas o lirismo de Álvares de Azevedo, que morreu sem completar o curso e a candência do “Navio Negreiro” de Castro Alves que ocupam espaço na memória poética das Arcadas. Ali também se praticava o esporte favorito dos alunos: brincar com os professores. Principalmente com aqueles que davam ensejo à recepção de apelidos ou que se notabilizassem por alguma bizarrice.
O famoso professor Pedro Lessa, que o meu orientador Manoel Gonçalves Ferreira Filho afirma ter escrito o melhor tratado sobre o Poder Judiciário brasileiro, foi alvo dessa musa brincalhona e irreverente dos acadêmicos. Ele era um daqueles mestres que aplicava piparotes na cabeça dos alunos desatentos ou indisciplinados.
Foi Agenor Silveira quem produziu o soneto que tenta descrever o professor e que os contemporâneos dizem ter sido fiel. Aí vai:
Bate o quarto, depois do meio dia;
A grita infrene dos calouros cessa.
Pesado e gordo, surge Doutor Lessa,
o nosso lente de Filosofia.
Esbaforido e suado, entrou. Sombria,
no grave rosto traz a raiva impressa.
Sentou-se. E agora a preleção começa
E começa também nossa agonia…
Um silêncio tristíssimo enche a sala;
E fala o mestre – coisas graves fala,
Num discurso pesado, extenso, informe.
Agora, as próprias moscas adormecem…
E dorme a classe – e os gestos se amortecem.
E a sintaxe do mestre também dorme…
Havia humor inteligente no século XIX, em pleno auge de funcionamento da primeira Faculdade de Direito do Brasil, criada em 1827, juntamente com a escola de Olinda, depois transferida para o Recife.
E hoje? Qual é a poesia produzida pelos milhares de acadêmicos de direito de nossa terra? Ainda há Academias dentro das faculdades, Grêmios Estudantis, entidades associativas. Fazer poesia é parte integrante dessa fase juvenil. É bom lembrar que “não fazem mal as musas aos juristas”.
JOSÉ RENATO NALINI é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-Graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2019-2020. 7
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