Assim como todos os brasileiros, senti a morte de Tônia Carrero, no dia 3 de março. Na verdade, uma lenda, um símbolo, uma expressão maiúscula de beleza, talento e patriotismo. Tive o privilégio de jantar com ela na casa de Heloísa e Arnold Wald. Era prima de Heloísa e, nessa noite, estava conosco a querida e saudosa Mariazinha Congilio, por sinal aniversariante no mesmo dia: 23 de agosto.
Simpática, alegre e acessível, seu humor contagiou o encontro. Monopolizou a mesa, com narrativas pitorescas, uma postura fidalga de quem sabe devotar a cada um dos presentes idêntica atenção. Quantas pessoas têm dificuldade de olhar outros comensais quando não são íntimos daqueles que se congregam em torno à refeição.
Ao final da ceia, era íntima de todos, mesmo daqueles a quem conhecera havia poucas horas. Pessoa a quem não se podia deixar de admirar, tão fascinante a sua personalidade. Tão difícil ser simples, quando o mais fácil é se dar ares, considerar-se especial, adotar a arrogância como parceira permanente.
Ainda há dias, ao comentar com um grande amigo a homenagem que se prestava a Bibi Ferreira, observou-se que a longevidade oferece árduos desafios. A beleza de Tônia resistirá ao passar dos anos? O que significa para um paradigma de formosura atravessar décadas e vivenciar a chegada de fragilidades, de deficiências, de perdas e de um generalizado depauperamento?
As imagens de Tônia no esplendor de sua juventude, cotejadas coma implacável marcha do tempo, não causam perplexidade, nem estranhamento. Ela resistiu bravamente à célere corrida dos dias e noites, meses e anos, insuscetível de paralisação.
Conservou seus belos traços, realçados por um espírito indômito. Alguém que viveu sempre intensamente e vibrou fervorosamente com as grandes causas brasileiras. Destemida, à frente das passeatas, pugnou por Democracia, combateu a censura e se divertia no teatro, no cinema e na novela em que era a mais atraente e instigante personagem.
Já fazia parte da melhor parte da História do Brasil. O Brasil do talento, da criatividade, da alegria transmissível a um povo que já foi considerado cordial, embora resultante de três raças tristes. Um povo que tem direito à felicidade, a despeito daquilo que muitos continuam a fazer para que a sensação geral do País não seja a mais alvissareira.
Fonte: Jornal de Jundiaí | Data: 03/04/2018
JOSÉ RENATO NALINI é secretário estadual de Educação e docente da Uninove
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