PAZ - Blogue luso-brasileiro
Sábado, 29 de Julho de 2017
LOURENÇO MIKA - O CASAMENTO POLINÊS

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Padre Lourenço Mika.jpg

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os imigrantes poloneses chegaram ao Paraná por volta de 1871. Estabeleceram-se em várias regiões do Estado como: Ivaí, Araucária, São Mateus do Sul, Mallet, Cruz Machado, Contenda, Tomaz Coelho, Rio Claro, Reserva e Irati. Em Curitiba, eram a maior colônia polonesa no Brasil. Fixaram-se em núcleos coloniais em áreas dos atuais bairros de: Pilarzinho, em 1871; Abranches, em 1873; Santa Cândida, em 1875; Lamenha, Santo Inácio, Órleans, Dom Pedro II, Dona Augusta, em 1876; Ferraria, antiga Rivière, em 1877; Murici, Zacarias, Inspetor Carvalho e Coronel Accioly, em 1878. Os imigrantes poloneses dedicaram-se principalmente à agricultura. Difundiram o uso do arado e de outras técnicas agrícolas. Contribuíram para o desenvolvimento de Curitiba e do Paraná.

            Década de 1960 (época da infância deste redator, bisneto de imigrantes poloneses). Arredores da cidade de Curitiba. Mais exatamente, em foco as colônias rurais formadas pelos descendentes dos imigrantes poloneses. Entenda-se aqui colônia como o grupo de descendentes dos imigrantes que vieram da Polônia para o Brasil e que preservaram as tradições, as características culturais, a língua e a religião trazidas da Europa. Eram pobres, mas viviam muito bem. Embora tenham aprendido o português e tenham assimilado a cultura brasileira, os descendentes dos imigrantes preservaram muitas tradições, como é o caso do casamento tipicamente polonês.

 

 

 

O local e a data - A festa do casamento era feita na casa dos pais da noiva, num dia de sábado. Em décadas anteriores, o casamento era celebrado na segunda-feira e não no sábado. Para marcar o casamento, era preciso pensar em contratar uma cozinheira ( kucharka ) com seus tachos e talheres, uma bandinha de música ( musykanti ), o padre ( ksiads )... algo que tinha que ser feito com uns dezoito meses de antecedência. Marcada a data com esses três profissionais, então era hora de ir convidando o casal coordenador da festa ( druzba e druzbina ), os padrinhos e madrinhas , os condes e as damas ( sfat e druszka ). O convite geral era dirigido para os familiares e vizinhos; na prática, a colônia toda era convidada.

 

 

* Nota - os vocábulos em polonês aqui inseridos entre parênteses nem sempre existem no dicionário polonês porque são vocábulos criados nas colônias polonesas.

 

 

 

A Cozinheira - Prevendo alimentação para mais ou menos 500 pessoas por dois a quatro dias, a cozinheira se alojava na casa da noiva já na segunda-feira, quando encaminhava a arte culinária da semana. Na década de 1960, poucas casas tinham energia elétrica. Na terça-feira, ela assava as bolachas de mel com decoração colorida feita à base de glacê e açúcar. Na quarta-feira, ela cozinhava a cerveja caseira ( piwo ) e a gengibira, mais doce. Na quinta-feira, assava as broas ( chleb ) e o bolo da noiva ( kolacz ) e preparava a geléia de porco ( zimne nogi ). Dois ou três porcos eram abatidos pela manhã, tarefa que todo colono sabia fazer; já para matar o boi previamente engordado, era necessário chamar um açougueiro que possuía os apetrechos adequados. Na sexta-feira, dia em que os condes e as damas vinham para ornamentar o ambiente, a cozinheira se ocupava em preparar os frangos; o frango caipira tinha que ser novo e era doado pelos convidados ao casamento. Os pernis suínos eram assados no forno. Eram fritados os bolinhos de carne ( klopse ) e os sonhos. O açougueiro esquartejava a carne do boi. No sábado pela manhã, a cozinheira assava os frangos. Um grupo de mulheres fazia a maionese de batata e ovo, cozinhava o arroz, preparava as saladas de cebola e tomate. Numa grelha montada especialmente para a ocasião, vários homens se encarregavam de assar o churrasco. A refeição principal era servida pelas 15 horas, pois a cerimônia religiosa era oficiada na igreja pela manhã ou no mais tardar pelas 14 horas.

 

 

 

A despedida - os pais dos noivos não iam ao casamento religioso na igreja, pois eles estavam ocupados com a festa. Quem acompanhava os noivos na viagem à igreja eram os padrinhos, os condes e as damas. A noiva se trajava em sua própria casa, com o auxílio de uma pessoa da família que sabia vestir a noiva ( staroscina ). Por isso, havia o rito da despedida ( renkowiny ) dos noivos de seus pais. Nesse rito, eram declamados poemas e orações, intercalados por músicas religiosas. Por três vezes, de joelhos, os noivos pediam a bênção dos pais e estes, chorando, lhes impunham as mãos sobre a cabeça e traçavam o sinal-da-cruz. O druzba, falando em nome dos pais da noiva, dizia: “Nossa filha sempre foi tratada como rainha; se por acaso ela não servir para você, caro noivo, traga ela de volta que aqui ela será tratada sempre como rainha!” No final dessa cerimônia familiar, a staroscina jogava balas para os convidados e o druzba servia vodka para os homens e licor para as mulheres. Os sfaty eram encarregados de comprar os foguetes e os cigarros e charutos que eram colocados em caixas de sapato ornadas com papel crepom desfiado. Cada convidado de honra recebia pregada na roupa uma flor, que era de cedro verde com um lacinho de fita colorida. Para cada categoria de convidados (pais, padrinhos, sfatydruzba) havia uma flor diferente. Alguns dias depois do casamento, os noivos iam para a cidade para a foto do casamento; a noiva se vestia de novo e então era feito o retrato. Não havia fotógrafos no dia do casamento, muito menos câmara de vídeo.

 

 

 

O matrimônio - de carroça puxada por uma parelha de cavalos, ou de perua rural, os noivos se dirigiam até à Igreja. Havia flores de crepom penduradas no arreamento dos cavalos, nos fueiros ( konica ) das carroças, e, mais tarde, nas maçanetas dos automóveis. O matrimônio era celebrado dentro da liturgia da missa. Nessa época, a missa mudou do latim para a língua vernácula. O casamento era celebrado em polonês, dado que todos conheciam a língua. O Concílio Vaticano II instituiu a equipe litúrgica que ajuda o padre a celebrar a missa; as tarefas litúrgicas cabiam a alguns membros da família dos noivos. O casamento civil ( slub cywilny ) era feito alguns dias antes ou depois do casamento religioso, na mais discreta singeleza; iam ao cartório apenas os noivos e dois testemunhas, que também podiam ser qualquer pessoa encontrada nas imediações do cartório.

 

 

 

Os arcos - terminada a cerimônia religiosa, o séqüito viajava para a casa da noiva. No trajeto, os foguetes sinalizavam em qual parte do trajeto os noivos se encontravam. Nas estradas de chão batido, se chovesse, a carroça demorava mais, mas era mais seguro para ir e voltar, pois o jipe, a rural ou a caminhonete freqüentemente encalhavam no barro. Nas principais encruzilhadas, desde o dia anterior estavam montados arcos ( bramka ), com duas taquaras verdes e enfeitadas com flores coloridas de crepom. O arco principal ficava na entrada da casa onde seria a festa. Os convidados para o casamento não iam para a igreja, mas calculavam o tempo para chegar na festa antes de os noivos chegarem da igreja. O druzba e a druzbina recebiam os convidados com um aperitivo, recolhendo os presentes para os noivos, que eram panelas, talheres, ferramentas, quadros religiosos e até guarda-chuva.

 

 

 

A festa - Enfim, a festa vai começar. Tão logo chegavam da igreja, os noivos serviam o bolo ( kolacz ) para os convidados. Os sfaty serviam - de novo - vodka e cigarros para os homens; as druszki distribuíam balas para as mulheres e crianças. Então, aos poucos os convidados se sentavam à mesa; as mesas eram montadas no paiol. A tarefa dos sfaty era servir a carne e a cerveja, enquanto as druszki serviam a comida. Como o espaço não era muito grande e eram poucos os pratos e os talheres, era necessário servir em duas a quatro mesadas.

 

 

 

A dança - terminada a comilança, as mesas eram rapidamente desmontadas para a dança. O paiol se transformava na pista de dança ( boisko ), que era enfeitado no teto com taquaras verdes e flores de papel e galhos de cedro pregados nas paredes. No início, o druzba dançava com a noiva ( wywodziny ) e a druzbina dançava com o noivo. Então os noivos passavam a dançar juntos. Druzba e druzbina dançavam com cada um dos pares de condes e damas, até o último casal. Daí a dança ficava livre até o amanhecer do dia. Cada pouco, alguém gritava: Viva os noivos! ( Niech zyja nam! ). Cada conde tinha o direito de realizar um szimango, isto é, se normalmente o rapaz tirava a moça para dançar, no chimango era a moça que podia tirar o rapaz. O chimango era sinalizado por um lenço branco pendurado num aro ao lado do abajur/globo ( kwiat ) principal do boisko

 

.

 

A música - as bandinhas musicais da época utilizavam o violino, o acordeão, o clarinete, o baixo ( basy ) e o bumbo. Como não havia energia elétrica e nem amplificadores de som, o melhor clarinetista era aquele que conseguia soprar com mais força no seu instrumento. As bandinhas eram familiares - pai, filho, genro, cunhado. Na Colônia Dom Pedro II eram famosos os Halerz; na Colônia Cristina, o Wojtek Olbrech e seu conjunto. As músicas de maior sucesso era um xote ( Sokola ), uma marchinha ( Na Zielonem Gaju ) e uma valsa ( Sla Dzieweczka do Laseczka). A Rádio Cambijú de Araucária-PR, hoje Rádio Iguaçu, cedia espaço para que essas bandinhas se apresentassem na rádio aos domingos; quando surgiu o gravador de cassete portátil, as músicas eram gravadas no casamento para serem reproduzidas na radioemissora. É famosa até hoje (ano 2003) aos domingos à tarde a Hora Polonesa ( Godzina Polska ) na Rádio Iguaçu, que pode tocar os CDs de música polonesa de algumas bandinhas remanescentes como: Celso Taborda, Grupo Musical Bela Vista, Musical Solo Ignácio Arendt, Coração Nativo, Grupo Ponczek... Celso Taborda possui o site www.musicapolonesa.com.br, através do qual se pode ouvir trechos de música polonesa.

 

 

 

A dança da mesa - pelas 22 horas, era realizada a dança da mesa, o czepowiny ou odczepiny. Os noivos eram colocados sentados à mesa ao centro do boisko, juntamente com os padrinhos. Cada conde e dama tinha a tarefa de ir buscando cada um dos convidados, dançar uma volta com o convidado ao redor da mesa dos noivos. Aí, o convidado pagava a gratificação do casamento, depositando uma cédula de dinheiro no prato dos noivos. A compensação da gratificação era um novo cálice de vodka ou licor, ou balas, ou cigarros. Não havia o costume de cortar a gravata do noivo ou recolher moedas no sapatinho da noiva. No final, o noivo ficava sentado à mesa e a noiva escolhia alguns rapazes para dançar com eles, o que era uma grande honra. Ao final dessa cerimônia, a noiva se sentava no colo do noivo e as senhoras casadas retiravam ( odczepic ) o véu da noiva e então ela recebia um lenço-de-cabeça ( chustka ); a partir dessa hora, já como mulher casada, ela passava a usar o lenço todos os dias. Fazia-se uma brincadeira, em que as casadas puxavam a noiva para o lado delas e as solteiras puxavam-na para o lado das solteiras. Enquanto isso, os homens respeitáveis, trajados de chapéu, em qualquer canto, com um baralho bem surrado, improvisavam uma mesa para jogar uma eletrizante partida de truco.

 

 

 

Poprawiny - a música e a dança continuavam até o amanhecer do dia. Para repor as energias, pela meia-noite era servido um cafezão com a comida especialmente preparada para essa hora: pastel de requeijão ( pierogi ), bolinho de carne ( klopse ), geléia de porco ( zylcz ), bolachas, sonhos, bolos, cuques... No almoço do dia seguinte, domingo, parentes e vizinhos iam de novo na casa da noiva para um almoço festivo - repique - , chamado poprawiny; se algo não foi bom no dia anterior, agora era reparado! A legitimação de se comparecer nesse almoço era a desculpa de se oferecer para fazer a limpeza do pós-casamento; porém, depois de tanto piwo e vodka, o serviço ficava, naturalmente, para os donos-da-casa para a segunda-feira.

 

 

 

Patatisko - casal que casa, quer casa para morar. O primeiro local que o filho ou a filha do casal polonês pensa em morar é ao lado da casa dos pais, ou seja, no Patacisko. Explicando: Patacisko é o local aonde se plantava batata-doce ( pataty ) para a alimentação da vaca ( krowa ) e do porco ( swinia ). Todo dia, a dona-da-casa ( babka ) tinha a tarefa de ir buscar a batata-doce para os animais, com o auxílio de um carrinho-de-mão ( toki ). Por isso, o Patacisko tinha que ficar perto da casa. Nas colônias mencionadas, há centenas de casas construídas no Patacisko. O pai era um pequeno lavrador; a mãe, dona-de-casa e responsável pela criação de animais. A casa sempre era construída perto de um córrego para facilitar a água para os animais. Na propriedade, sempre havia um poço de água potável; para cavar o poço, a fonte subterrânea era localizada com o auxílio de um ramo de pessegueiro em forma de Y, que se curvava no local da fonte nas mãos de uma pessoa que conhecia a técnica de encontrar água subterrânea. O potreiro, cercado com arame farpado, servia como pasto para eqüinos e bovinos. As terras férteis mais ao longe da casa eram destinadas para a plantação de batata, trigo, centeio, cevada, milho, feijão, ervilha, repolho... Olhando da janela da casa-mãe, a babka - mãe ou sogra - conseguia controlar no Patacisko as briguinhas do casal novo, as brincadeiras dos netos, a hora de as crianças irem para a escola, a hora que o genro chegava em casa, e, ai, se voltasse bêbado...

 

 

 

A Língua - até hoje (ano 2003), nas colônias polonesas pode-se falar a língua polonesa, especialmente com as pessoas mais idosas. Havia escola que ensinava o polonês, a missa era em polonês. Sobraram cantigas de natal ( kolendy ), de quaresma ( gorzkie zale ) e folclóricas que até hoje são cantadas nas festas polonesas. Na época de natal, havia a apresentação do Turon, uma espécie de bode (não se conhecia o papai-noel) que visitava todas as famílias. Para crianças de primeiro ano de escola, a desgraça ficava por conta de encontrar um professor que não entendia o polonês, como é o caso de Campo Largo-PR, onde havia colônias de poloneses e italianos; o professor era italiano e os alunos poloneses eram chamados de Polako Burro. Foram criados termos que não existem no dicionário da Polônia, mas que aqui no Brasil possuem um significado pitoresco e intraduzível para o português; para exemplificar, Patacisko (local onde se plantava batata-doce).

 

 

 

Os sobrenomes - Se alguém folhear a lista telefônica da região metropolitana de Curitiba, encontrará centenas de sobrenomes poloneses. Os que terminam em ...wicz (Machniewicz, Markowicz, Kudlawiec, Antosiewicz, Wachowicz), os que terminam em ...ski (Biernacki, Lukasinski, Belinowski, Zielinski, Zytkowski, Kwiatkowski, Ruzyski, Burkowski, Gorski, Dombrowski, Szydlowski, Grochocki, Wroblewski, Krzyzanowski, Ciachorowski), os que terminam em ...a (Mika, Sikora, Nalepa, Kula, Valenga, Przepiura, Bora, Kuzma, Krupa, Lipka, Gorka, Lica, Gogola), os terminados em ...k (Belniak, Surek, Hajduk, Szpak, Kmiecik, Jarek, Patyk, Ponczek, Rendak, Lalik, Bolak, Golombek, Cyulik), e mais alguns (Halerz, Dybas, Falat, Lau...). Os poloneses, ao redor de Curitiba, não gostavam se serem chamados de Polakos, pois este termo era pejorativo; preferiam ser chamados de Poloneses. Em troca, os poloneses chamavam os negros de Zielone; falar de negro ( czarny ) era passível de taxação preconceituosa, mas podia-se chamá-lo de Verde ( Zielony ). Havia dois grupos rivais de poloneses: os urbanos, 5% ( miastuchy ) e os rurais, 95% ( kolonisci ). Curiosamente, nos cartórios de registro civil no tempo da imigração houve tradução literal de nomes e sobrenomes da forma mais incrível: Sikiera tornou-se Machado, Kowalski tornou-se Ferreira...

 

 

 

A lavoura - a lavoura tipicamente polonesa trouxe ao Brasil ferramentas cujo modelo só é encontrado nesta região: arado ( plug ), aradinho de três lâminas ( radlo ), grade retangular ( brona ), grade triangular ( bronka ), carrinho sem rodas puxado por cavalo ( sanie ), ventilador para cereais ( mlynek ), foicinha ( sierp ), gadanha ( kosa ), moedor de milho ( zarny ), picador de palha ( siedczarka ), berço balançante ( kolyska ), costurador de pele curtida ( szydlo )... No prédio da casa e do paiol sempre havia o sótão ( pientro ), onde era possível guardar sementes ou feno para o inverno. Alguns utensílios domésticos eram típicos: fazedor de manteiga ( maslanka ), azedador de repolho ( beczka ). O krzan, raiz branca amarga usada na Swienconka, até hoje não possui um termo equivalente em português. No final do verão, o feno ou papuã era secado e empilhado ao redor de um tronco ( klopa ) para servir de alimento para o gado no período do inverno. Plantava-se batata-doce, batata inglesa, repolho, ervilha, centeio, feijão, arroz, linhaça, cebola, alho, beterraba... Para malhar o trigo ou para descascar o milho no paiol, havia mutirão ( pisieron ); o pisieron acabava em baile. Quando um lavrador, passando pela estrada, enxergava um colega a capinar a lavoura, levantando o chapéu, bradava: “Deus te ajude!” ( Boze pomagai! ), ao que o outro respondia: “Deus te pague!” ( Bóg zaplac ).

 

 

 

A carroça - a imigração polonesa ao Paraná destaca-se pela difusão da carroça ( wóz ) puxada por dois cavalos. A carroça representou um ciclo intermediário entre o transporte em lombo de burro e o transporte ferroviário e rodoviário. A carroça possuía um cabeçalho ( dyszel ), na ponta do qual era atrelado o arreamento ( sciengel ) do cavalo. As rodas da carroça possuíam uma chapa de aço ( rajfa ) e raios de madeira ( sprechy ). Os fueiros ( konica ) seguravam as paredes ( wasong, zotol ), artisticamente entalhadas e pintadas em várias cores. A carroça podia ser usada para transportar pessoas, quando eram colocados assentos de mola, ou para transportar cargas de até meia tonelada. Em dias de festa, eram colocados os guizos na coleira dos cavalos. A carroça polonesa era bastante diferente da carroça italiana, mais leve e para um cavalo apenas.

 

 

 

Os animais - em cada propriedade, era costume haver uma criação de animais que incluía vaca de leite, touro e porco para a carne, galos e galinhas para produção de ovos, cavalos para a tração animal. Por isso, sempre havia estábulo ( stajnia ), chiqueiro ( chlewek ), galinheiro ( kurnik ); incluindo residência e paiol para depósito e garagens, em cada propriedade rural havia no mínimo cinco construções cobertas com telhas de barro. Os animais criados para a defesa da propriedade eram os cachorros; os gatos moravam no paiol para caçarem os ratos. De vez em quando, no leilão da festa da igreja, era interessante arrematar um cachaço para poder melhorar a raça da criação de porcos. O mesmo podia acontecer ao arrematar uma abóbora, um casal de marrecos ou gansos - para produzir penas para o edredom ( pierzyna ) - , um cabrito, um coelho...

 

 

 

A cultura polonesa - Certamente o maior vestígio da cultura polonesa na região de Curitiba é a religião católica e a língua polonesa. Surgiram também profissões tipicamente polonesas, como a de ferreiro ( kowal ), cavador de poços ( studniarz ), construtor de casas ( budownicz ), moinheiro ( mlynarz ), alfaitate (  krawiec ). É notável também a influência da culinária polonesa (repolho azedo, pastel de requeijão...), da música e das tradições folclóricas (Clube União Juventus, Sociedade Tadeusz Kosciuszko, Sociedade Józef Pilsudzki, Centralny Zwiazek Polaków ).

 

 

 

A religião - As tradições polonesas estão intimamente ligadas ao catolicismo. As colônias polonesas eram atendidas pelos padres missionários vicentinos poloneses que formaram uma paróquia em cada colônia: Tomaz Coelho, Orleans, Araucária, Contenda, Catanduvas do Sul, Dom Pedro II, Abranches, Santa Cândida, Barreirinha, São Mateus do Sul, Irati, Ivaí, Imbituva, Prudentópolis, Alto Paraguassu, Itaiópolis, Mafra. A missa de domingo era o ponto de encontro dos poloneses, oportunidade em que colocavam todas as notícias em dia. Chegavam na igreja com mais de uma hora de antecedência. Depois da missa, iam na venda: os homens tomavam aperitivos, as crianças e mulheres tomavam capilé e comiam bolachas, e a prosa continuava solta. Aos domingos à tarde, havia o costume de visitar os parentes. Também havia comunidades de irmãs religiosas polonesas, como é o caso das irmãs franciscanas da Sagrada Família que se estabeleceram em Catanduvas do Sul, Orleans, Dom Pedro II, Campo Magro, Murici e Colônia Figueiredo; elas cuidavam da escola e selecionavam meninas vocacionadas para engrossar suas próprias fileiras. A celebração de Pentecostes ( zielone swienta ) era o dia em que a casa era enfeitada no interior e na varanda com ramos de cedro. A sala principal da casa era o oratório ( izba ), onde havia um altar com estátuas do Sagrado Coração de Jesus e Imaculado Coração de Maria e os quadros de Nossa Senhora do Monte Claro ( Matka Boska Czenstochowska ) e de Santo Izidoro, o protetor dos lavradores. Toda noite, a família se reunia na izba para a reza do terço de Nossa Senhora. Quando vinha a Capelinha de Nossa Senhora, os vizinhos vinham rezar junto, porque depois da reza havia comida e bebida. No sábado da Semana Santa, se fazia a Bênção dos alimentos ( Swienconka ). Velório e enterro eram um ritual dos mais respeitados; na noite do velório, recitava-se o rosário de Nossa Senhora - 15 dezenas de Ave-Marias -, as ladainhas e os cânticos apropriados. Ao lado da igreja, sempre havia um cemitério; o enterro acontecia sempre com a missa de corpo-presente e a procissão até o cemitério, onde, na hora do sepultamento, se cantava o hino Serdeczna Matko e o Angelus ( Aniol Panski ).

 

 

 

O Bosque do Papa - Inaugurado em 1980, logo após a visita do papa João Paulo II a Curitiba. Fica na rua Mateus Leme, no Centro Cívico, ao lado do Portal Polonês. O Bosque do Papa envolve uma área de 48 mil m², onde existia uma antiga fábrica de velas. É cortado pelo rio Belém e inclui uma reserva de mata atlântica, com mais de 300 araucárias. Um ambiente agradável acolhe os visitantes do Bosque. O Memorial da Imigração Polonesa, em Curitiba, está instalado nas clareiras do Bosque. Reconstitui-se o ambiente em que viveram os pioneiros imigrantes poloneses, que chegaram em Curitiba por volta de 1871. É um museu ao ar livre que traduz a luta, as crenças, as tradições e o estilo de vida daqueles imigrantes. Calçadas de pedra, equipamentos e utensílios usados pelos poloneses, como uma carroça e uma pipa de azedar repolho, estão expostos para visitação. Realizam-se anualmente eventos culturais de tradição polonesa, como a Swienconka (Bênção dos Alimentos) no Sábado de Aleluia, e a festa de Nossa Senhora de Czenstochowa (Nossa Senhora do Monte Claro), em agosto. Sete casas construídas pelos poloneses, com troncos de pinheiro encaixados, foram transportadas do entorno de Curitiba para o Bosque. Uma das casas foi transformada na Capela de Nossa Senhora de Czenstochowa, em homenagem à padroeira da Polônia. O Bosque também conta com trilha ecológica, ciclovia, palco, loja de artesanato e uma casa de chá, ao estilo polonês.

 

 

 CONCLUSÃO

 

Muitos são os estudos sobre a cultura plasmada em Curitiba. É impossível analisar a população curitibana sem citar as etnias - poloneses, italianos, alemães, portugueses, ucranianos, japoneses... Portais, bosques e memoriais relativos a imigrantes são apenas a ponta de um grande iceberg que é a cultura do curitibano. Ficaram traços estrangeiros na língua, na religião, na arquitetura, nos costumes, na culinária... A chegada da energia elétrica na área rural não conseguiu modificar muito o imaginário coletivo, principalmente dos poloneses; antes, consolidou-o.

Os descendentes dos poloneses fixados na região de Curitiba abrasileiraram-se, mas preservaram muitos traços culturais. Com a mecanização da lavoura e a crescente urbanização, a família polonesa foi abandonando o modelo rural tradicional para assumir uma fisionomia urbana teledependente. Hoje, alguns bisnetos e tataranetos dos imigrantes poloneses moram no Patacisko; outros, que tiveram que ir morar na cidade, quando chega o domingo, carregam no bagageiro do automóvel uma caixa de isopor com latinhas de cerveja e viajam 20 a 40 quilômetros para fazer um churrasco no antigo Patacisko, porque ali ainda se pode comer uns pierogi da vovó; e no casamento da prima, dançar sokola.

 

 

Curitiba, Dezembro de 2003

 

 

LOURENÇO MIKA   -   Padre Vicentino, Curitiba.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

- SIKORA, Mafalda Ales. Poloneses, sua História, sua Cultura. Colônia Dom Pedro II, 3 v. Campo Largo-PR, Gráfica Pema, 2002.

ANEXO ILUSTRATIVO

Visite: www.jaraguadosul.com.br/etnias

http://www.parques-curitiba.com/parques-natureza-turismo.htm

http://www.130anos.com/



publicado por Luso-brasileiro às 16:09
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