Perguntou-me se sabia que engravidara. Já haviam me contado. Comentou sobre quem era o pai e em que situação se dera a gravidez. Recordei-me dela, há treze anos, com dois apenas, ao caminhar pela calçada de mãos dadas com a mãe. Procurava me aproximar, contudo me observava com olhos de estranheza.Tempos mais tarde, permitiu-se quebrar a distância. É uma das meninas-mulher que me toca o coração e me desperta a vontade de colocar ao colo e cantar para ela cantigas de ninar, com o propósito de que se proteja da crueldade do mundo que lhe impõe beiradas da sociedade e uso, com abusos que nem consegue identificar.
Passou pela escola creio que por seis ou sete anos. Não deu certo. O analfabetismo funcional foi um de seus carrascos e lhe condenou, pelas incapacidades impostas, ao bullying em sala de aula e ao tédio por não compreender. Em setembro do quinto ano, encaminharam-na para um serviço público de alfabetização a 20 km de onde morava. Inconcebível. Pai ausente, a mãe que fazia bicos e ela com 11 anos. Como chegaria até lá sozinha? Minguaram, dessa forma, as possibilidades para o mercado de trabalho. Passou, no entanto, pelo “primeiro emprego”, antes dos 13, ao tratar de filhos de seu entorno em troca de recursos escassos.
Relatou-me que a mãe do indivíduo -ele afirmou que registrará somente após o exame de DNA - lhe ofereceu-lhe dinheiro para o aborto. Respondeu-lhe que é de gente pobre, mas que jamais alguém dos seus matou bebê na barriga. Comovi-me. Permanecíamos em conversa, quando o cidadão passou, do outro lado da rua, junto à namorada, de relacionamento longo e ruptura rápida ao ficar com a mocinha. Relatou-me que não era apaixonada por ele, porém percebi em sua fisionomia decepção e desamparo. Convivo com situações tão dolorosas de filhos da miséria, estrangulados pela indiferença da sociedade e pela falta de oportunidades. Que barbárie!
A mocinha precisará de vitamina, de enxoval para seu bebê, de roupas maiores para ela, mas também de cuidados para as emoções, enquanto se prepara para ser cuidadora de seu próprio filho ou filha.
Habitada por um serzinho humano, mas desabitada de abraços e beijos. Novinha, desprotegida, todavia grande em defesa do feto. Peço ao Senhor da Vida, que olha para ela e para a criança de suas entranhas, que lhe abra caminhos de paz, luz e ternura.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE -
Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.
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