Em meio aos desertos da Quaresma e do Coronavírus, a senhorinha me procurou angustiada. Necessitava de notícias do companheiro que foi levado, na noite anterior, após passar pela UPA, para o hospital público. Passara mal a partir das dores no peito. Não pôde acompanhá-lo na ambulância pelos seus mais de 60 anos. A idade dela e os riscos de contaminação a impediram de vê-lo. Ele, que chegou há anos do sertão do Nordeste e perdeu o contato com a família, é mais novo. Suplicou-me em lamento: “Não quero que ele pense que está abandonado. Ele só tem eu (sic)”. Comovi-me. Em sua casa, ela também só tem ele.
Experiência de deserto. O Senhor também a vivenciou com quarenta dias de fome e provocou impacto no demônio que o tentava. Prática do despovoado a quarentena pelo Coronavírus. Cessaram-se proximidades, encontros, reencontros, abraços em despedidas, ombros em situações de dor. Há um silêncio que aperta o coração. Os noticiários sepultam sonhos.
Penso na Via-Sacra. É tempo também de rezar, contemplar os fatos, compadecer-se, acolher os mais tristes, abandonados e fragilizados. É tempo de renunciar a si mesmo, tomar a cruz que cabe a cada um e segui-Lo. Alguém me traz a oração dos missais antigos: “Senhor, Vós que confiastes a Moisés o mandato de bater na pedra para que dela brotasse água, batei na pedra do meu coração, para que eu verta lágrimas”. Que assim seja!
Penso na dor de Jesus a caminho do Calvário e na de Maria Santíssima ao observar o Filho Desfigurado. Recordo-me de uma colocação da Venerável Madre Carminha de Tremembé, que em janeiro último teve suas virtudes heroicas reconhecida pelo Papa Francisco: “Nunca Jesus se fez tão pobre como na Cruz! Seu trono é o patíbulo dos malfeitores! Quem morria na cruz era tido como amaldiçoado por Deus! Aceitar esta humilhação é loucura de amor”.
Quaresma difícil, sem a claridade das celebrações na Igreja, sem a Eucaristia... Momentos de tristeza e solidão, de sustos e temores, especialmente para os mais idosos. Tempo, no entanto, também de esperança, pois, conforme me disse o Padre Márcio Felipe, pároco desta Igreja, estamos no deserto, porém com Jesus Cristo. É nEle que somos convidados a não ceder às tentações existenciais, mas a caminhar com os olhos no Céu e nas necessidades do próximo. E se surge a pergunta sobre “Onde está Jesus?” A resposta também vem da Venerável Madre Carminha: “Achei Jesus na delicadeza do amor”.
“Deus Santo, Deus Forte, Deus Imortal, tende piedade de nós e do mundo inteiro.”
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE -
Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.
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