
Em 18 de abril, a convite do Teólogo Edisandro de Lima Rocha, reforçado pelo Padre Enéas de Camargo Bête - Pároco - e pelo Padre Eduardo Augusto Belão – Vigário, estive na Igreja Nossa Senhora do Sagrado Coração em Pirapitingui, Itu, acompanhada por minhas queridas amigas Rose Ormenesi e Michele Gomes, para falar sobre “A dignidade da mulher e a Pastoral da Mulher/ Magdala”. Encantada com o interesse e a delicadeza das pessoas que participaram. Gostei demais de estar lá.
Pirapitingui, em Itu, um dos cinco sanatórios construídos ou reformados pelo DPL – Departamento de Profilaxia da Lepra. Os demais no Estado de São Paulo: o de Aimorés, em Bauru; o de Cocais, em Casa Branca; Santo Ângelo em Mogi das Cruzes e o Padre Bento, em Guarulhos.
Vieram-me duas lembranças. Em 1963, estava com nosso saudoso pai na rua Barão de Jundiaí, quando um homem, que perdera parte do nariz como sequela da hanseníase, aproximou-se dele. Disse-lhe que, após um tempo em que se avistavam na região da Rua Bandeirantes, foi capturado e levado para Pirapitingui. Tratado com sulfona, deixou de ser transmissor. Agradeceu-lhe por, no tempo em que ficava com um bambu e a latinha amarrada na ponta, para pedir auxílio, nosso pai se aproximava e lhe entregava nas mãos.
Outra recordação foi de meu querido amigo escritor Marcos Rey – Edmundo Donato – nascido em São Paulo em 1925, que contraíra hanseníase aos dez ou onze anos. Aos 14, os sinais externos da doença apareceram. Em 1941, foi levado por guardas sanitários para o asilo-colônia Santo Ângelo e mais tarde transferido para o Padre Bento.
Tivemos muito contato a partir de meados da década de 70. Veio a nosso convite algumas vezes a Jundiaí para lançamento de livros, palestras e conversas com alunos. Autor de contos, romances, novelas, livros infantojuvenis, da série infantil “O Sítio do Picapau Amarelo” para a Globo, minisséries, cinema e outros.
Durante sua vida, jamais quis tocar no assunto da doença, por certo devido ao preconceito, mas autorizou sua esposa, Palma, que poderia ser revelada após a morte. O livro a respeito: “MALDIÇÃO E GLÓRIA A vida e o mundo do escritor Marcos Rey”, de autoria de Carlos Maranhão e com prefácio de Fernando Morais, foi lançado em 2004. Marcos Rey faleceu em 1999. Como escreve Maranhão: “...quando um doente chegava a um dos asilos sabia que estava sendo arrancado de tudo: família, amigos, casa, escola, trabalho, passo e projeto para o futuro. Na prática, virava um banido”.
Marcos Rey fugiu do sanatório Padre Bento depois de três anos e sete meses internado. A mudança de nome foi com o propósito de não ser encontrado. Dirigiu-se ao Rio de Janeiro e, para a sobrevivência, além de fazer traduções, ganhava algum dinheiro escrevendo cartas a pedido de mulheres prostituídas. Pela medicação tomada, não transmitia mais a doença.
No início da Pastoral da Mulher na Diocese, em 1982, deu-nos várias referências a partir de sua experiência existencial.
Hanseníase ou lepra, doença infectocontagiosa causada pela bactéria “Mycobacterim leprae” ou bacilo de Hansen, tem cura, mas o estigma sobre a doença não desapareceu de todo.
Estigma e enclausuramento, mesmo com superações, são sempre histórias de dor e, nos locais, permanece o lamento choroso das vítimas.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE -
Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil