Encontrei-a nos primeiros tempos da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena. Rondava-nos à procura de algo que desestabilizasse o trabalho. Primeiramente, espalhou o boato de que pretendíamos abrir uma casa de comércio de sexo e que buscávamos as que poderiam, em regime da escravidão, oferecer um lucro maior. Havia, no entanto, algumas atitudes concretas de nossa parte que discordavam dos argumentos dela. Intuía que a influência, por parte da Igreja, com as mulheres em situação de prostituição, era perniciosa, diminuiria seus ganhos. Estimulava o aborto provocado e os realizava em sua residência. Ali mesmo, os bebês eram enterrados por seu filho.
Mais assustada ainda, quando as mulheres passaram a frequentar a reunião de evangelização na Catedral. Na tentativa de não perder o contato, fez-se presença também em meio a elas. Confesso-lhes que, de início, me incomodava seu comparecimento com objetivos outros e o seu olhar de resistência às preces e às reflexões. Após rezar muito, me fortaleci na certeza de que Deus é misericórdia sempre e tem os seus caminhos e a mulher deixou de me causar espanto e repulsa.
Passados quatro ou cinco anos, deparei-me com seu filho na cadeia. Cometera um delito para conseguir pagar uma dívida no tráfico de drogas. Disse-lhe que há tempo não via sua mãe. Pediu-me que a visitasse, porque se encontrava “esquisita”.
Recebeu-me muito bem e quis que eu observasse “as crianças que resgatara”. Em cima da cama de casal, uns vinte nenês de borracha, que ela tratava, dando banho, mamadeira, trocando fralda... Comentou que, ao se fortalecerem, os devolveria às mães e pegaria os demais. E assim por diante. Se não quisessem, entregaria ao Fórum para adoção. De mensageira de óbitos, se transformara em protetora de pequeninos. Emocionou-me, embora demonstrasse desequilíbrios psíquicos. O Senhor da Vida tocara as entranhas de sua alma. Mencionei-a, em outro texto, faz anos.
Voltei à sua casa, diversas vezes, para ouvi-la, acompanhar a dedicação com “os bebês” e rezar com ela, como me solicitava. Quando o filho saiu da cadeia, veio em busca de dinheiro. Ao saber que ela “fechara o cemitério da Casa da Moeda” e se dedicava a “recuperar a vida de bebês”, deu-lhe uma martelada fatal na cabeça. Detido novamente, não soube mais dele. Ela, por certo, de alma em joelho diante dos anjos, recebeu o abraço de Deus.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE - Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.
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