Criança, gostava de acompanhar minha avó materna (que morava conosco) em seus passeios: visitas a parentes, a amigas que moravam ao redor, idas à feira livre, à padaria, ao armazém... Os programas eram feitos a pé, pois morávamos no Centro e quase tudo girava naquele entorno.
Havia um lugar que minha avó ia algumas vezes com minha mãe, e eu as acompanhava. Também se situava muito próximo de nossa residência e subíamos a pé. Elas iam ao Cemitério Municipal lavar o jazigo da família de minha avó, levar plantas e flores para a floreira... Aquele ato me fascinava. Fazia-me bem estar ali, parecia uma maneira de conhecer um pouco a respeito de parentes que eu não tivera a oportunidade de conviver, como seus pais e irmãos.
Ouvia um pouco das histórias e saía caminhar pelo cemitério, apreciando os jazigos mais suntuosos, pertencentes a famílias tradicionais ou de personalidades famosas de nossa cidade. Num determinado momento, após idas anos seguidos, eu já sabia o que estava escrito aqui e ali, a que família pertencia tal jazigo e por aí vai.
Quando nos reuníamos no Natal ou Páscoa, por exemplo, as histórias também eram contadas e eu não me importava em ouvir quase sempre os mesmos enredos, ao contrário, ficava esperando por aqueles de minha preferência.
Nessas ocasiões, após comermos exageradamente, íamos “fazer o quilo”, no que consistia, algumas vezes, em uma ou duas voltas no quarteirão, e em outras a caminhada era feita toda ao redor do cemitério.
O ponto de referência de casa era o cemitério. Para indicar onde residíamos, bastava dar essa referência.
Um pouco mais crescida, já explorando vários cantos da cidade a pé ou de bicicleta, eu tinha o costume de passear pelas ruas do cemitério, especialmente quando estava triste ou chateada. Lá me sentia em paz.
Depois fui morar em São Paulo, foi escasseando a oportunidade de estar com parentes vivos ou mortos.
Mais adiante minha avó se foi. E lá estava seu nome junto aos demais que por tantas vezes eu lia quando ali estava com ela em vida.
E assim os entes queridos foram partindo.
Hoje, após tantos anos, estive lá. Com a dúvida se ainda saberia encontrar a rua onde se encontra a campa. Mas encontrei-a de pronto. E lembrei que Natal feliz mesmo foi aquele de minha infância, embora à época não tivesse a menor ideia disto...
Renata Iacovino, poeta e cantora / facebook.com/oficialrenataiacovino/ reiacovino@uol.com.br
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