– Véi, sério, mano, tipo...
E diante da minha cara de indignação, deram-me o benefício da legenda:
– Isso foi uma sentença.
Sim, disse eu, de morte! Da língua!
– Tamu de férias, né.
Em vista das circunstâncias, a única opção foi buscar e trazer à mesa o peixe. Por sorte (dele, inclusive) já estava morto, o que não o impediu de apresentar-se boquiaberto.
Enfim, eu não era a única.
– Posso abrir um refrigerante?
Engulo em seco, mas, depois, mergulho e lavo a alma num destoante copo de suco natural.
– ... é pra comemorar a última semana de férias, porque depois tudo volta ao normal e a gente tem que ser saudável de novo.
Quando quase tudo parece perdido, arriscamos. Puxei da memória o vocabulário e gastei no idioma corrente: “véi, sério, mano, tipo”...
Eles riram do meu desajeito.
– Saúde não tira férias, gente. Tem que cuidar – falei.
Algo como uma bomba veio explodir aqui, internamente, desafiando-me: “caramba, que chata você é, às vezes”.
– Às vezes, defendi-me.
Veio o flashback:
“Ele não quer ler, Valquíria. De jeito nenhum. Diz que está de férias, e que leitura não tem diversão”.
Ao ouvir a mãe que levara o filho a uma oficina de férias que tive o gosto de conduzir, provoquei o menino: e sabedoria lá tira férias, amigo? E quem foi que disse que ler não é divertido?
Ao abraço que ganhei em resposta de seu filho, satisfeita com meu poder de persuasão, aquela mulher sorriu menos desesperada e um tanto mais prazerosamente.
Ah... se ela me visse agora quando nossos papéis se assemelham... Como é desgastada a figura da mãe! No entanto, é inegável, que bênção é sê-lo.
Meus filhos me enlouquecem para que eu perca a cabeça, mas nunca a fé.
Fé em quê? Ou em quem? Perguntam-me vocês.
Uso o último fôlego para, em minha defesa, dizer que isso, no mínimo, é material para outro artigo.
Por ora, já me defendi demais da conta. É hora de baixar as armas, e, por que não, rezar: “Deus ilumine os meus filhos/ além da primeira idade!/ Há muito eu saí dos trilhos,/ e é um vau a maturidade./ Mas... quem diria que, nela,/ eu seria este alfarrábio?/ Envelhecida e amarela/ a tinta escorre do lábio.”.
VALQUÍRIA GESQUI MALAGOLI - escritora e poetisa, vmalagoli@uol.com.br / www.valquiriamalagoli.com.br
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